Desequilíbrio entre apoio à pesquisa e à inovação

Data: 28/01/2014

O período 2000-2010 foi extremamente rico para o desenvolvimento científico e tecnológico brasileiro, bem como para iniciar um processo de conscientização da necessidade de que o processo de inovação tecnológica ocorra no Brasil. Para melhor avaliar o que ocorreu neste período alguns números e fatos precisam ser apresentados.

Inicialmente vamos aos dados. Em 2000 contávamos com cerca de 28 mil doutores e 12 mil grupos de pesquisa. Já em 2010, estes números chegaram a 82 mil e 22 mil, respectivamente. Em 2000, os pesquisadores brasileiros publicaram 10.462 artigos em revistas internacionais, ocupando a 17ª posição mundial. Já em 2009 tivemos 32.100 publicações e alcançamos a 13ª posição.

Que fatos explicam estes números? Não há nenhum segredo. Após anos de recursos decrescentes para C&T no Governo FHC, este mesmo governo foi criativo em iniciar um conjunto de fundos setoriais para apoio à atividade científica, embora os recursos destes só tenham sido efetivamente utilizados, e com grande sucesso, pelo Governo Lula.

Como conseqüência, criou-se uma massa crítica de atividades científicas que poderiam disparar a tão necessária utilização de conhecimento científico e tecnológico em novos processos e produtos geradores de riqueza.

Entramos então em uma nova fase na qual ênfase especial vem sendo dada à atividade de inovação tecnológica. Esta, no entanto, só terá êxito se for criado o ambiente propício a que o mundo científico e tecnológico interaja naturalmente com o setor industrial. Esta interação não pode ser forçada, como alguns desejam, mas induzida.

Tentativas de forçar as instituições científicas a atuar na área da inovação não vão levar a nada, exceto ao mau uso dos recursos públicos. No entanto, poderá levar ao declínio da atividade científica, diminuindo assim as chances de melhor entrosamento entre o setor científico e o setor empresarial.

Desde já é importante ficar claro que a atividade de inovação deve ocorrer na empresa, seguindo a exitosa experiência internacional. Por este motivo me parece um equívoco, que poderá levar a um atraso no desenvolvimento industrial brasileiro, que a área da inovação esteja exclusivamente sob a coordenação do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT, que recentemente incorporou também a palavra inovação, passando a ser MCTI).

Me parece fundamental que o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, que lida diariamente com o setor produtivo nacional, tenha uma participação mais ativa no apoio à inovação tecnológica, inclusive com recursos para apoiar o setor.

A comunidade científica brasileira já percebe um claro desequilíbrio, que se acentua a cada ano, entre os orçamentos para pesquisa básica e para inovação no MCTI. Em 2005, as áreas de C&T e de Inovação investiram R$ 2,8 bilhões e R$ 800 milhões, respectivamente, o que correspondia a cerca de 77% e 23%, respectivamente. Em 2010, as áreas de C&T e a de inovação investiram R$ 5,2 bilhões e R$ 2,3 bilhões, respectivamente, o que correspondia a cerca de 70% e 30% do orçamento global do MCTI. Já em 2013, as expectativas apontam para valores da ordem de R$ 7,2 bilhões e R$ 5,5 bilhões, sendo os percentuais de 56% para C&T e de 43% para inovação nas empresas.

Nada contra o aumento significativo nos recursos para inovação, que inclusive surgem da capacidade da equipe que lida com esta área de conseguir mais recursos oriundos de outras fontes. O que é lamentável, e grave, é que os recursos para a pesquisa básica, que deveriam vir do Tesouro Nacional, estão crescendo menos e diminuindo per capta, já que tem aumentado o número de pesquisadores e de grupos de pesquisa. Há um claro descompasso entre o C&T e o I do MCTI, e a correção deveria ocorrer por um aumento significativo do orçamento do CNPq, com recursos do Tesouro.

Wanderley de Souza é professor titular da UFRJ, ex-secretário executivo do MCT, membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Nacional de Medicina.


Monitor Mercantil


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