O legado de Doha

Data: 10/12/2012

Mais uma Conferência das Partes sobre Mudanças do Clima se encerra sem os resultados necessários para que o aumento da temperatura média do planeta fique abaixo dos dois graus centígrados. Doha faz parte de um legado de incertezas e incompetências.
Cada vez mais impotente diante dos interesses econômicos da ordem atual, as Nações Unidas se desdobram em ações de marketing e de cunho simbólico. Assumiu-se despudoradamente que simplesmente manter as conversas é o resultado a ser atingido. Desde 2009, todo o trabalho dos negociadores tem gerado apenas o alargamento do cronograma para um acordo final. Estamos perigosamente nos aproximando do ponto a partir do qual não há volta: se as emissões dos gases causadores do efeito estufa não começarem a diminuir a partir de 2015, teremos fracassado: no futuro, seremos reconhecidos como a geração que condenou seus filhos e netos.
Nunca tão poucos jornalistas cobriram uma CoP. Nunca ela recebeu tão pouco espaço no noticiário. O emocionado discurso do representante das Filipinas, na véspera do que deveria ser o último dia das negociações, foi usado pela BBC em matéria sobre o tufão que castigou seu país – e para que, didaticamente, a repórter explicasse que tufões não podem ser relacionados com as mudanças do clima. Desde a CoP15, a opinião pública tem se afastado do processo, cada vez amplamente classificado como “inútil”, gerando um hiato extremamente útil a quem quer comprometer e esvaziar as negociações. Nunca foi tão fácil às nações desenvolvidas voltar atrás em compromissos assumidos, notadamente na ajuda financeira aos países em desenvolvimento. A constatação de que são estes últimos os mais prejudicados pelo aquecimento global e de que foram eles que assumiram as maiores metas de mitigação não causa qualquer constrangimento e as nações desenvolvidas seguem despudoradamente seu caminho de omissões.
Em 2013, teremos nova uma nova rodada de negociações. Até lá, a sociedade civil organizada tem o desafio de encontrar novas formas de participar e influenciar um processo que evidentemente foi dominado pelas atuais forças econômicas. Ate lá, precisamos rapidamente encontrar meios para trazer novamente a opinião pública para o debate para chegarmos em Varsória fortalecidos em nossa representação. Até lá, precisamos intensificar nossa ação com nosso governo. Porque, na hora da derradeira decisão, quem é consultado não está nas salas ou corredores da CoP. Precisamos destravar internamente os nós que travam as negociações, levando o governo a alinhar de fato suas políticas de desenvolvimento aos desafios das mudanças climáticas. Enquanto houver incoerência entre o que se anuncia nas Conferências e o que se faz dentro de casa, tanto no Brasil, como nos demais países que integram a Convenção, ela não entregará os resultados que precisamos para salvaguardar a Vida neste planeta.
(Vitae Civilis)


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