Futuro tecnológico da geração elétrica nuclear

Data: 07/12/2012
Leonam dos Santos Guimarães

O estado da arte da tecnologia de geração elétrica nuclear é o resultado de mais de 50 anos de pesquisa, desenvolvimento e engenharia e de efetiva experiência operacional, que monta a mais de 15.000 reatores-ano. Os mais modernos projetos de usinas nucleares, hoje em construção, incorporam lições aprendidas dessa experiência assim como os mais recentes avanços tecnológicos para melhoria da segurança e da produtividade. A geração nuclear é uma tecnologia madura, com muito baixa emissão de carbono, que se encontra disponível hoje para ampla utilização.

Existem atualmente 64 usinas nucleares em construção no mundo (Argentina - 1, Brasil -1, China - 26, Taiwan - 2, Finlândia - 1, França - 1, Índia - 7, Japão - 2, Coréia do Sul - 3, Paquistão - 2, Rússia - 11, Eslováquia - 2, Ucrânia - 2 e EUA - 3). Novas construções na Grã-Bretanha, Canadá, Lituânia, Belarus e Emirados Árabes Unidos deverão se iniciar em breve.

Tem-se convencionado classificar os projetos de usinas nucleares em "gerações". Assim, as primeiras usinas comerciais, basicamente protótipos de demonstração industrial são chamadas de "Geração I". As usinas que compõem o parque nuclear atual em operação são chamadas de "Geração II". Os projetos modernos e em construção são chamados de "Geração III". Eles incluem diversas evoluções tecnológicas em relação à geração anterior, como, por exemplo, Instrumentação e Controle (I&C) digital, dispositivos para enfrentar acidentes severos (como recuperador de "corium"). Alguns deles são chamados de "Geração III+", quando incluem também dispositivos inovadores de segurança intrínseca, como resfriamento passivo por circulação natural. Os projetos de Geração III são considerados para utilização até 2020.

Encontram-se também em pesquisa e desenvolvimento futuras usinas nucleares para emprego bem após 2020, chamadas de "Geração IV". São conceitos bastante diversos dos atuais, que são basicamente fundamentados em reatores resfriados a água com combustível óxido de urânio, empregando novos tipos de combustíveis e fluidos de resfriamento.

Existe ainda uma classe de potenciais futuras usinas nucleares em pesquisa e desenvolvimento baseada em pequenos reatores modulares (SMR - Small Modular Reactors). Envolvem diversos conceitos, alguns a água e urânio, mas outros próximos dos conceitos da Geração IV.

Finalmente, existem os continuados esforços em viabilizar o emprego da fusão nuclear na geração comercial de eletricidade, promessa tecnológica antiga e ainda não concretizada. Os desenvolvimentos atuais, porém, se mostram promissores.

Para atingir um corte de 50% nas emissões de dióxido de carbono (CO2) no setor de geração elétrica mundial, um cenário viável seria chegar a 1.200 GW nucleares de potência instalada até 2050, fornecendo em torno de 24% da demanda global por eletricidade (hoje se tem mais de 370 GW fornecendo 14% da demanda). Isso faria com que geração nuclear desse uma contribuição ainda mais importante, compatível com suas potencialidades, para a "descarbonização" da economia global.

Chegar a esse nível de contribuição não exigirá grandes saltos tecnológicos. Os obstáculos para um crescimento nuclear mais rápido a curto e médio prazo estão ligados primeiramente às políticas industriais e econômicas. Entretanto, o desenvolvimento contínuo das tecnologias de reatores e do ciclo do combustível será importante para atingir seu pleno potencial em termos de competitividade com outras fontes de baixa emissão de carbono.

Um comprometimento claro e estável em relação à energia nuclear, como parte de uma estratégia nacional para cumprimento de uma política energética e de objetivos ambientais, é um pré-requisito para um programa nuclear de sucesso. Estruturas legislativas e regulatórias eficazes e efetivas também precisam ser instituídas. Particularmente, em países que estão iniciando ou reativando programas nucleares, os governos terão que assumir um papel ativo, trabalhando em conjunto com todos os interessados a fim de ultrapassar os obstáculos.

O financiamento dos elevados investimentos necessários para a construção de usinas nucleares será o maior desafio na maioria dos países. Os investidores do setor privado podem perceber os investimentos nucleares como demasiadamente arriscados, pelo menos até que haja uma trajetória de novos projetos nucleares de sucesso. Em alguns casos pode ser necessário o suporte do governo na forma de garantia de empréstimos. A estabilidade de preços nos mercados de carbono e eletricidade também poderá incentivar os investimentos em usinas nucleares.

A capacidade industrial global para a construção de usinas nucleares precisará dobrar até 2020 para que a potência instalada venha efetivamente a daí em diante. As capacidades de produção relativas ao ciclo do combustível, inclusive a produção de urânio, também precisarão crescer na mesma proporção. Isso exigirá grandes investimentos nos próximos anos que somente serão realizados se ficar claro que há demanda suficiente no horizonte.

Uma indústria nuclear em expansão necessitará recursos humanos consideráveis, incluindo cientistas e engenheiros altamente qualificados além de pessoal técnico especializado. Instalações, reguladores, governos e outros interessados também precisarão de mais especialistas nucleares. Os programas de treinamento e recrutamento industriais deverão ser intensificados. Os governos e universidades também têm um papel vital no desenvolvimento de recursos humanos.

A gestão e eliminação de resíduos radioativos são um componente essencial de todos os programas nucleares. Especificamente, devem ser feitos progressos na construção de instalações operacionais destinadas ao gerenciamento de combustível usado e dos resíduos de alto nível de atividade. Apesar das soluções técnicas estarem num estágio avançado de desenvolvimento tecnológico, com frequência existem dificuldades para conquistar a aceitação política e pública para sua efetiva implantação.

O regime internacional de salvaguardas em termos de tecnologia e materiais nucleares deve ser mantido e reforçado sempre que necessário. A proteção física dos sítios nucleares e dos materiais também deve ser garantida. Evitar a propagação de tecnologias sensíveis, ao mesmo tempo em que se garanta acesso confiável ao fornecimento de combustível será um desafio crescente. Esses problemas precisam ser resolvidos através de acordos e cooperação internacional.

Muitas tecnologias em desenvolvimento voltadas para sistemas nucleares de última geração proporcionam possibilidades de avanços. Os sistemas de energia nuclear da Geração IV, para utilização após 2020 terão:

Sustentabilidade: oferecer geração de energia sustentável, capaz de atender objetivos de ar limpo e descarbonização da economia; de promover garantias em longo prazo do fornecimento de combustível nuclear e utilização efetiva de combustível para a produção de energia global; minimizar e gerenciar de forma segura os resíduos nucleares; e assim melhorar a proteção aos trabalhadores, ao público e ao meio ambiente.

Economia: produzir uma clara vantagem em termos de custo de ciclo de vida em relação a outras fontes de energia; ter um grau de risco financeiro comparável a outros projetos de geração elétrica.

Segurança e confiabilidade: manter operações em alto nível de segurança e confiabilidade; manter a probabilidade e gravidade de danos no núcleo do reator ainda mais baixos; eliminar a necessidade de resposta a emergências externa ao sítio da usina; resistência à proliferação e proteção física; inviabilizar o desvio ou roubo de materiais utilizáveis na produção de armas; aumentar a proteção física contra atos de terrorismo.

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Leonam dos Santos Guimarães é assistente da Presidência da Eletronuclear e membro do Grupo Permanente de Assessoria em Energia Nuclear do Diretor-Geral da AIEA.

Jornal da CIência


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