USP vai criar Núcleo de Apoio à Pequena Mineração Responsável

Data: 06/07/2012

A reitoria da Universidade de São Paulo (USP) deve criar o Núcleo de Apoio à Pequena Mineração Responsável (NAP-Mineração Responsável) com intuito de estimular o uso de tecnologias limpas em substituição ao mercúrio nos garimpos - adiantou ao Jornal da Ciência Giorgio de Tomi, professor-associado do Laboratório de Planejamento e Gestão de Sistemas Georreferenciados (Lapol), do Departamento de Engenharia de Minas e de Petróleo, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Politécnica-USP) e que deve dirigir o projeto. A medida é revelada dias após o governo do Amazonas liberar o uso do mercúrio na separação do ouro nos garimpos situados na Amazônia.


A ideia do NAP-Mineração Responsável, previsto para entrar em operação ainda neste semestre, é oferecer capacitação técnica e fornecer um modelo de gestão e governança aos pequenos negócios de mineração, incentivando a prática de tecnologias limpas na pequena mineração. O novo núcleo estima fornecer soluções para o uso legal da mineração, para os danos ambientais, na saúde e na segurança ocupacional. Ou seja, a ideia é levar "o pacote completo" aos garimpos.



A reitoria de pesquisa da USP confirmou a informação, por intermédio da assessoria de imprensa que informou que a medida está em estudo e só será oficial quando seu edital for publicado no Diário Oficial, previsto para ocorrer nos próximos 30 dias. A proposta faz parte da nova fase de implementação de novos núcleos de pesquisas da USP. Até a publicação do edital, as propostas podem ser alteradas, adiantou a assessoria.



O NAP-Mineração Responsável será ligado à reitoria de pesquisa da USP e ao Departamento de Engenharia de Minas e de Petróleo da Escola Politécnica, onde situa o Lapol e já existem projetos de mineração conveniados em andamento, tanto de empresas de grande porte quanto negócios de pequeno porte. A ideia inicial é de que os projetos de pequenos negócios de mineração sejam mantidos no Lapol e depois, sejam migrados gradualmente para o novo núcleo - que concentrará todos os projetos da mineração de pequeno porte.



Investimentos - Como estímulo, a USP deve destinar uma verba financeira para fomentar as pesquisas e a formação do NAP-Mineração. A intenção é buscar também outras fontes de recursos nacionais e internacionais para o fomento de pesquisa e desenvolvimento do modelo de gestão na pequena mineração, via agências de fomento; e acordos com mineradoras, entidades de classes e ONGs. A proposta desenhada busca alavancar os recursos para cerca de R$ 20 milhões nos próximos três anos.



O NAP-Mineração Responsável prevê reunir 12 subprojetos, que devem ser executados no decorrer de três anos, sendo quatro deles por ano, em média. Estima-se que cada um deve demandar investimentos de R$ 3 milhões a R$ 5 milhões anuais. Tais projetos devem ter atuação nas regiões brasileiras mineradoras, como Amazônia, Amapá, Rondônia e Pará.



Acordos com cooperativas - A proposta prevê acordos, inicialmente, com três cooperativas de garimpeiros com as quais já existem projetos em andamento. Na lista constam a Cooperativa dos Mineradores de Serra Pelada, a Cooperativa dos Garimpeiros do Amapá, da região de Lourenço, e a Cooperativa dos Garimpeiros do Rio Madeira. Calcula-se que essas três cooperativas possuem mais de mil garimpeiros associados.



Corpo profissional - O NAP-Mineração Responsável deve nascer com a colaboração de 12 profissionais do Lapol, entre pesquisadores, mestrandos e doutorandos. No total, serão 20 pessoas. A intenção é ampliar o quadro de funcionários com pesquisadores de outros institutos da USP, como o Instituto Geociência e Instituto de Geofísica. Além disso, o projeto prevê fechar parceria com a University of British Columbia (UBC), situada em Vancouver, no Canadá, que deve cuidar da gestão de resíduos minerais.



Práticas limpas - O projeto prevê a criação de um centro de processamento de minérios, com uso de tecnologia limpa, e o centro de capacitação no qual os garimpeiros serão treinados. Isto é, será fixada uma planta piloto, uma espécie de centro comunitário de processamento de minério, que utilizará o material de vários garimpeiros em uma tentativa de "recuperar mais ouro, sem o uso de mercúrio, com menos contaminação e menos custos na extração de minérios". No caso da exploração do ouro, deve ser orientado o uso da tecnologia mercury-free, utilizada pelas empresas mineradoras, a qual proporciona custos-benefícios superiores ao uso do mercúrio. A expectativa é de que o NAP-Mineração Responsável represente um marco no setor mineral brasileiro.



Liberação do mercúrio na Amazônia - A liberação do uso do mercúrio nos garimpos pelo governo do Amazonas despertou preocupação na comunidade científica, diante dos impactos do produto na natureza, na contaminação de peixes e de seres humanos. Cientistas recomendam o uso de tecnologias limpas, como a tecnologia mercury-free, utilizadas pelas empresas mineradoras, alinhadas à implementação de medidas educacionais e de capacitação dos garimpeiros no uso de novas tecnologias no lugar do mercúrio.



Caminho certo - O diretor do Centro de Tecnologia Mineral (Cetem), no Rio de Janeiro, Ronaldo Santos, considera fundamental a ideia de criação do NAP-Mineração Responsável. "Esse é um dos caminhos. Os pequenos mineradores precisam de um acompanhamento técnico constante", admite o diretor do Cetem, reconhecendo que "o problema do mercúrio está associado aos pequenos mineradores".



Santos concorda que o processo mercury-free é aplicado na mineração pelas grandes empresas e pela chamada mineração responsável e que o custo-benefício dessa tecnologia é mais significativo do que o do mercúrio. O diretor do Cetem, porém, vê dificuldade da aplicação dessa técnica nos garimpeiros e nos pequenos negócios de mineração. Isso porque, acredita Santos, falta interesse do minerador artesanal de ouro que obtém o mercúrio por "um custo baratíssimo", comparado ao décimo do preço da grama de ouro, e falta condições para investir na aquisição dessa tecnologia. "Como convencer um cidadão desse a investir em tecnologia quando ele mal tem dinheiro para o próprio sustento?, pergunta Santos.



"Todas as alternativas já foram testadas, mas elas têm custo maiores, sua implementação é mais difícil e exige certa qualificação técnica", reconhece.



Santos desconversou quando questionado sobre a possibilidade de o governo implementar políticas educacionais e acompanhamento técnico nos garimpos, diante do impacto do mercúrio no meio ambiente, na contaminação de peixes e seres humanos. Consultado, o Ministério de Minas e Energia informou, por intermédio da assessoria de imprensa, desconhecer a liberação do uso do mercúrio na Amazônia.



(Jornal da Ciência)





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