Será que eliminaram a ciência do novo rascunho do documento oficial da Rio+20

Data: 22/06/2012
Carlos Joly

A delegação brasileira fez um trabalho brilhante, ao consolidar no novo rascunho do documento final da Rio+20 todos os pontos já acordados por todas as delegações. E foram formados quatro grupos de discussão para temas específicos: governança, financiamento da implementação, oceanos, e assuntos diversos (o famoso 'outros').



Na minha opinião o 'desaparecimento' da palavra ciência no título da Seção B do texto, que originalmente era Ciência e Tecnologia e agora ficou restrita a Tecnologia, é um absurdo. Se há algo que todos concordamos é que será preciso muita ciência para o desenvolvimento de novas tecnologias, aumento da eficiência das existentes e dar a humanidade uma chance de sobreviver a esta crise ambiental que se agrava diariamente.



A crítica e alarmante questão da perda de biodiversidade e serviços ecossistêmicos associados foi relegada a um segundo plano. A recente criação da Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Ecossistemas (IPBES, o IPCC da Biodiversidade) é apenas 'anotada' (take note of), o que em linguagem diplomática é o equivalente a ignorada, quando no texto original ela era bem vinda (welcome). Na questão da energia, o foco está mais no acesso para aqueles que não têm eletricidade do que nas questões críticas de fontes renováveis e eficiência.



A Delegação Brasileira está forçando para que o novo texto seja aprovado sem maiores negociações. Mas talvez, alguns parágrafos poderão ser acrescentados ao texto, até a chegada dos chefes de Estado. Dizer que este texto - sem visão, foco ou direção - é o futuro que almejamos, é deprimente. O que provavelmente significa que a grande maioria das delegações vai aprová-lo, porque ele capta acuradamente o estágio atual das negociações. E, sempre podemos recorrer a Agenda 21 para nos inspirar!



Essa é uma estratégia para evitar que se repita no Rio o fracasso de Copenhague, pois o documento será aprovado no dia 22 de junho. É um texto anódino, que não causa nenhum dano mais grave, mas certamente também não define uma rota a ser seguida para evitarmos a catástrofe ambiental do planeta. O objetivo de estabelecer metas de desenvolvimento sustentável, mesmo que genericamente, para serem detalhadas pelas convenções e outras reuniões até 2015, não me parece alcançável, se não houver visão e liderança para criar e administrar uma tensão criativa entre os diferentes países. Esta tensão criativa permitiu os avanços mais significativos em 1992, sob a liderança do canadense Maurice Strong, então secretário geral da Eco-92.



De positivo, vale destacar a atenção dada aos oceanos. É a seção mais longa do documento e, aparentemente, todos os países concordam com a necessidade de protegermos a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos tanto de águas costeiras com das águas oceânicas internacionais.


Carlos Alfredo Joly é professor da Unicamp e membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC).


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