Reunião Magna da ABC discute ciência para o desenvolvimento sustentável

Data: 09/05/2012
O tema da Reunião Magna 2012 da Academia Brasileira de Ciências (ABC) é "Ciência para o Desenvolvimento Sustentável", mas o debate instaurado nas sessões do primeiro dia ultrapassou os aspectos científicos e alcançou níveis de discussão política.



O evento, que começou nesta segunda (7) e vai até amanhã, contou com a presença de autoridades de diferentes instituições científicas e hoje à tarde terá a participação do ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp. Boa parte das discussões se centrou na pesquisa e preservação da área de maior diversidade do planeta: a Amazônia.



"Estamos em um momento crítico do desenvolvimento, em que é necessária a contribuição da Ciência e Tecnologia para minorar seus impactos. A Amazônia é um enorme depósito de biodiversidade e a preservação desse conjunto é fundamental", afirma José Galizia Tundisi, presidente do Instituto Internacional de Ecologia.



Água e energia - Tundisi foi o coordenador da sessão 'Água, Energia e Desenvolvimento: Desafios para um Brasil Sustentável', na qual foram discutidos assuntos como a escassez (natural e social) dos recursos hídricos e hidroeletricidade. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, foi um dos responsáveis por uma das palestras mais discutidas da sessão, na qual relatou os benefícios econômicos e ecológicos da hidroeletricidade.



O impacto ambiental e social da construção de hidrelétricas e reservatórios (uma opção cada vez mais rara) foi o motivador das discussões. Tolmasquim argumentou que, aparte dos benefícios financeiros e ecológicos desse tipo de energia renovável limpa ("representa apenas 0,3% das emissões de gases de efeito estufa", pontua), as hidrelétricas podem representar um avanço na qualidade de vida das populações afetadas, com a construção de escolas, reforma de hospitais e melhoria das moradias.



Luiz Pinguelli Rosa, diretor da Coppe/UFRJ, lembrou o caso da hidrelétrica de Belo Monte, que "reduziu bastante sua área de inundação, o que diminuiu seu impacto". E sublinhou que a queixa em relação ao fator de capacidade de "apenas" 42% "é um equívoco", pois "em geral as hidrelétricas brasileiras têm um fator de 50% ou 55%". Tolmasquim pontuou que o projeto de Belo Monte foi refeito para não atingir áreas indígenas e que 60% da área que será ocupada são constituídas de vegetação secundária antropizada.



Áreas úmidas - A pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) Maria Tereza Fernandes Piedade detalhou a importância do ciclo hidrológico da região Norte, com foco nas áreas úmidas, aquelas nas quais a água predomina por um tempo suficiente para selecionar comunidades de plantas e animais. Elas representam de 25% a 30% da Bacia Amazônica.



Ela marcou as diferenças entre os rios de água branca (de regiões férteis), preta (originados nos sedimentos arenosos da Amazônia Central) e clara (de regiões com pouca fertilidade e com vegetação mais aberta) e ambientes alagáveis, como os igapós (com cerca de 100 mil quilômetros quadrados), inundados pelas águas claras ou pretas; e as várzeas (de extensão maior, como 300 mil quilômetros quadrados), inundadas pelas águas brancas, em cujas áreas vivem dois milhões de pessoas. E chamou a atenção para o fato da atual versão do Código Florestal estabelecer o nível intermediário dos rios como marco para as Áreas de Preservação Permanente. "Para a Amazônia, isso significa deixar todas as florestas alagáveis fora de preservação", ressalta.



Por sua parte, a geógrafa Bertha Becker propôs a criação de um "Instituto do Coração Florestal" para planejamento estratégico e conservação da região e atentou para a importância de garantir a eficiência energética do País. "Os cientistas podem ter uma atuação maior quanto a políticas públicas e empresas", sugere.



Florestas - O Código Florestal foi lembrado durante a sessão "Florestas", coordenada pelo biólogo Carlos Joly, pesquisador da Unicamp-Biota. A aprovação de seu texto pela Câmara dos Deputados no dia 25 de abril foi apontada por Jean Paul Metzger, professor do Instituto de Biociências da USP, como uma "derrota" para a ciência.



A afirmação fez com que a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Helena Nader, se manifestasse para apontar que houve, sim, avanços e que existem "senadores e deputados que estão do nosso lado". Ela questionou a mobilização da comunidade a respeito não apenas do Código, mas também para reivindicar que recursos dos royalties do pré-sal sejam aplicados em C&T. "Acho que nós nos mobilizamos muito tarde [em relação ao Código"> e a forma como atuamos foi linear e não transdisciplinar. Mas conseguimos abrir um canal de comunicação", reconsiderou Metzger após a intervenção da presidente da SBPC.



Por outra parte, o pesquisador do Inpa Adalberto Val e o pesquisador do Museu Paraense Emílio Goeldi Alexandre Aleixo descreveram o cenário amazônico a partir de sua diversidade e suas oportunidades. "A Amazônia é um arquipélago do ponto de vista geográfico", ressalta Aleixo, demonstrando as variações entre uma mesma espécie, de acordo com o local onde ela habita (como o lado esquerdo ou direito de um rio). "A ocupação não é homogênea", destaca.



Val conta que um dos principais "conflitos" da região implica em aumentar o monitoramento das leis e investir na inclusão social e geração de renda para a população. E lembra que o principal gargalo, mais do que formar pesquisadores qualificados na região (existem dez universidades federais na Amazônia brasileira), é fixar essas pessoas. "É uma questão de segurança nacional. Mais de 50% das publicações sobre a região não têm autores brasileiros", alerta.



(Jornal da Ciência)





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