A importância da cooperação internacional em C&T

Data: 23/03/2012
Wanderley de Souza



A ciência brasileira atual é, em grande parte, fruto da intensa cooperação internacional, sobretudo com países europeus, na primeira metade do século XX, e com os Estados Unidos na segunda metade do mesmo século. Instituições das mais tradicionais, como é o caso do Instituto Oswaldo Cruz, que foi beneficiado com a chegada à instituição no início do século XX de protozoologistas eminentes, como Gustav Giemsa e Stanislav Von Prowazek.



Mesmo a nossa melhor universidade, a USP, sentiu a influência benéfica de nomes como Claude Lévi-Strauss, Fernand Brandel, Roger Bastide, Emilio Williems, Herbert Baldus, entre outros. Na área da genética, merece uma menção especial a importante figura de Theodosius Dobzhansky, que publicou cerca de 90 artigos em colaboração com jovens pesquisadores brasileiros.



Na criação da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, em 1952, foi importante a participação de Lucien Lison, Fritz Koberle e Miguel Covian, entre outros. O Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da UFRJ, criado por Carlos Chagas Filho em 1945, teve forte influência de pesquisadores provenientes da Europa como René Wurmser, Alfred Fessard, Raymond Latarjet, Hertha Meyer, entre outros.



Esta cooperação internacional trouxe para o Brasil não apenas novas metodologias (eletroforese, cromatografia, microscopia eletrônica, cultura de tecidos, eletrofisiologia, uso de radioisótopos, entre outras) como influenciaram na escolha dos temas de pesquisa, notadamente na área biomédica.



Esta cooperação foi, na maioria das vezes, fruto de ação de pessoas. Se levarmos em consideração o número de pesquisadores que visitaram o Brasil ao longo do século XX com o número de pesquisadores atuando no Brasil à época, a percepção que temos é a de que a cooperação era mais intensa do que a existente atualmente. O próprio CNPq já foi muito mais ativo na cooperação internacional do que até o ano passado. Por outro lado, a Capes e as fundações estaduais passaram a apoiá-la de forma crescente nos últimos anos.



No entanto, até recentemente, estávamos longe de contar com programas de cooperação com a intensidade do praticado recentemente pela Coreia do Sul e pela China. Praticamente todos os laboratórios de pesquisa dos Estados Unidos contavam há alguns anos com um ou mais pós-docs destes países, que passaram a constituir parcela significativa da força de trabalho da Ciência norte-americana.



Finalmente, no final de 2011, o Governo Federal despertou e passou à fase de implementação de um audacioso programa que prevê o envio de algumas dezenas de milhares de estudantes brasileiros para os melhores centros de pesquisa existentes em vários países, bem como criou mecanismos competitivos de atração de pesquisadores do exterior para o Brasil.



Este programa, designado de Ciência sem Fronteiras, já lançou vários editais via Capes e CNPq e visa a atingir, em um período de quatro anos, a marca de 100 mil bolsistas, sendo que 75 mil apoiados por fontes governamentais e 25 mil com o apoio de empresas.



As metas são ambiciosas e espera-se: (a) o envio para o exterior de cerca de 27 mil alunos de graduação, por períodos de seis a 12 meses, em instituições previamente selecionadas, (b) o envio de cerca de 10 mil estudantes para a realização do doutorado pleno, (c) de 25 mil doutorandos para programas de doutorado sanduíche e de 10 mil para o pós-doutorado tradicional; (d) o envio de cerca de 2,5 mil professores para programas sabáticos no exterior; (e) a atração de cerca de 900 jovens talentos atuando no exterior, preferencialmente brasileiros; e (f) a atração de cerca de 400 pesquisadores visitantes de grande prestígio internacional para permanecerem por períodos mais curtos no País.



Nos programas de atração de pesquisadores, com bolsas em valor altamente competitivo em nível internacional, há ainda apoio complementar para pesquisa, bolsas de iniciação científica, de doutorado sanduíche e de pós-doutorado.



Certamente novas iniciativas serão anunciadas brevemente para atender demandas que irão surgindo à medida que o programa evoluir. Caso o Ciências sem Fronteiras execute o que foi programado, não sofrendo dos famosos contingenciamentos, constituirá em um divisor de águas na internacionalização da ciência brasileira.



Wanderley de Souza é professor titular da UFRJ, diretor de Programas do Inmetro e membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Nacional de Medicina.


Monitor Mercantil.



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