Inovação: o problema não é falta de dinheiro

Data: 16/03/2012
Renato Dagnino


Desde 2000, quando o governo resolveu subsidiar diretamente a inovação e a P&D (pesquisa e desenvolvimento tecnológico) nas empresas, os recursos não param de crescer.



Do aumento do orçamento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, de R$ 1,6 bilhão para os R$ 12,2 bilhões previstos inicialmente para 2012, a maior parte foi destinada a cumpri-lo. Há também vultosos recursos para inovação que vêm do BNDES e via renúncia fiscal. A estratégia nacional de ciência, tecnologia e inovação para os anos de 2012 a 2015 coloca esse objetivo como central. Ela contará com recursos públicos de R$ 74,6 bilhões.



Mas, passados dez anos, a julgar pelas enquetes feitas pelo IBGE sobre o período entre 1998 e 2008 junto às "empresas inovadoras" (as que introduziram produto ou processo novo no mercado), não há resposta a esse fluxo de dinheiro.



A parcela da receita líquida alocada pelas empresas "inovadoras" em "atividades inovativas" (as que possibilitaram a inovação, como a compra de máquinas e equipamentos, P&D e treinamento) diminuiu no período. Foi de 3,8% para 2,5%. E a parcela orientada à P&D, que tem sido o foco da política de ciência, tecnologia e inovação, permaneceu estável em 0,6%.



As "inovadoras" que apontaram a P&D como importante para sua capacidade de inovar diminuíram de 34% para 12% - as que apontaram a aquisição de máquinas e equipamentos como sendo importante se mantiveram em cerca de 80%.



No que respeita à relação com as universidades e institutos de pesquisa, o quadro não é melhor. Somente 7% das "inovadoras" estabelecem algum vínculo - vínculo que 70% consideram de baixa importância. Outra relação que poderia levar ao aumento da inovação, a absorção de mestres e doutores na P&D nas empresas, tampouco é utilizada. Dos 90 mil que saíram da universidade entre 2006 e 2008, apenas 68 foram contratados para isso!



Em um outro sentido, mas comprovando a inoperância da política implementada e a irrepreensível racionalidade do comportamento das empresas, está o fato de que, entre as que não inovaram, a parcela que apontou como obstáculo importante a "escassez de fontes de financiamento" foi de 12% - 70% apontaram as "condições de mercado", ou seja, a escassa expectativa de lucro. Frente a isso, não surpreende que pouquíssimas das "inovadoras" introduziram produtos (0,7%) ou processos (0,2%) considerados novidades em todo o mercado mundial.



Em qualquer lugar e tempo, as empresas e os países farão três bons negócios com tecnologia: roubar, copiar e comprar. Nenhum deles irá desenvolver tecnologia se puder realizar um dos outros negócios.



Mais do que em outros países periféricos em que a cultura ancestral não foi "patrolada" pela eurocêntrica, nossa dependência cultural, o baixo preço da força de trabalho e o elevado grau de oligopólio tornam ainda mais intensa a baixa propensão da empresa a realizar P&D.



Aqui, como regra, a inovação na empresa privada se dá via aquisição de tecnologia já desenvolvida, em especial a incorporada em máquinas, equipamentos e insumos. Isso é uma resposta racional aos sinais de um mercado periférico. Não tem nada a ver com a falta de "ambiente inovativo", com o "atraso" ou com a "ignorância" dos empresários (que estão entre os melhores do mundo, tendo em vista os resultados que alcançam).



Em vez "malhar em ferro frio", cabe ao novo comando da política científica nacional, consciente desses aspectos e da informação apresentada, reorientar os enormes recursos que a sociedade está disposta a gastar na área de inovação.


Renato Dagnino, mestre em economia do desenvolvimento e doutor em ciências humanas, é professor titular de política científica e tecnológica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Folha de São Paulo


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