Declaração ministerial no Fórum da Água decepciona
Estamos comprometidos a acelerar a implementação do acesso à água limpa e segura e ao saneamento como um direito humano, um objetivo que vai nos ajudar a superar a crise dos recursos hídricos, afirma a declaração ministerial apresentada nesta terça-feira (13) no Fórum Mundial da Água, que está sendo realizado em Marselha, na França.
Essa decisão, de deixar para depois, foi questionada por diversos presentes e especialistas.
É uma surpresa do pior tipo ver que os ministros não conseguiram ainda definir o acesso à agua como um direito humano, o que já é reconhecido pela ONU. Os governos estão sendo inconsistentes com suas declarações passadas, afirmou Catarina de Albuquerque, do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
É um retrocesso na questão da justiça da distribuição da água e no processo das Nações Unidas para garantir a água como um direito humano, reforçou Wenonah Hauter, diretora da ONG Observatório de Alimentos e Água para o jornal The Guardian.
O Fórum nem ao menos coletou assinaturas das nações para endossar a declaração. Este documento não pode ser confundido como uma proposta política séria, completou Hauter.
A declaração pede que os países aumentem os investimentos em água e saneamento como uma estratégia para reduzir a pobreza, acelerar o crescimento e criar novos trabalhos. Para isso, recomenda parcerias entre os governos e a iniciativa privada, assim como o intercâmbio de melhores práticas.
O ministro boliviano para Água e Meio Ambiente, Felipe Quispe Quenta, criticou a declaração por não levar em conta as dimensões sociais das políticas sobre a água e por não criticar a privatização dos recursos hídricos.
A água não pode ser transformada em um negócio. A Bolívia não apoia essa declaração adotada pelos ministros porque acreditamos que ela estimula a privatização dos serviços da água. É obrigação do estado garantir e administrar o direito à água, disse Quenta.
Sobre a RIO+20, os ministros afirmam que o foco deve ser trabalhar o entendimento da ligação entre água, energia e segurança alimentar; explorar sinergias para o desenvolvimento sustentável; incorporar a gestão dos recursos hídricos em todas as decisões governamentais; e acelerar a classificação do acesso à água como um direito humano.
Apenas palavras não vão resolver a crise que vivemos. A falta de água limpa e de saneamento é a maior causa de mortes na África subsariana. O que precisamos é de vontade política para melhorar o acesso das pessoas, principalmente das mais pobres, ao que deveria ser seu por direito, declarou Barbara Frost, presidente da ONG WaterAid.
Cenário desolador
O retrato atual da gestão dos recursos hídricos não é nada bonito. Desperdício, má utilização e falta de planejamento são o que há de mais comum em diversos países. Já é ruim constatar isso enquanto ainda temos água disponível para todos, porém o cenário futuro é muito pior.
Esse é o alerta que o programa de água das Nações Unidas e a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) fazem através do quarto relatório de desenvolvimento dos recursos hídricos, que é dividido em três volumes: Gerência de Recursos Hídricos em Instabilidade e Risco, Base de Conhecimentos e Encarando Desafios.
Lançado agora no Fórum Mundial da Água, o relatório afirma que cerca de um bilhão de pessoas não possuem acesso regular à agua potável. Além disso, as obras de infraestrutura não estão conseguindo acompanhar o ritmo de urbanização do planeta. Atualmente, mais de 80% dos resíduos líquidos não são coletados nem tratados.
Utilizando os dados da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), o relatório considera que a produção de alimentos precisa aumentar em 70% para atender a população mundial em 2050. Esse enorme crescimento será responsável por um crescimento de 19% na utilização de água na agricultura, setor que já é responsável por 70% do consumo global.
Outro fator preocupante é o registro de que triplicou a extração de água de lençóis freáticos nos últimos 50 anos. Muitos desses reservatórios podem desaparecer em breve. O relatório aponta que o sumiço dos lençóis freáticos é resultado também da falta de chuvas regulares, uma consequência das mudanças climáticas.
Os autores acreditam que os efeitos do aquecimento global no sul da Ásia e África afetarão drasticamente a produção de alimentos e o acesso à água. Em 2070, a falta de água também será sentida no centro e sul da Europa, afetando até 44 milhões de pessoas.
O relatório estima que todas essas pressões aumentarão as disparidades econômicas entre os países, podendo incentivar conflitos. Além disso, destaca que, como sempre, os piores efeitos serão sentidos pelos mais pobres.
A água não está sendo usada de forma sustentável. Informações sobre os recursos hídricos ainda são fragmentadas e não inteiramente confiáveis. O futuro é incerto e os riscos tendem a se aprofundar, declarou Irina Bokova, diretora geral da UNESCO.
(Instituto CarbonoBrasil)
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