Perfil técnico de Raupp agrada cientistas: esperamos mais verbas

Data: 27/01/2012
A posse do novo ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Marco Antonio Raupp, que substitui o petista Aloizio Mercadante, agradou a comunidade científica brasileira. Formado em física e com PhD em matemática, o até então presidente da Agência Espacial conhece bem a área e, segundo especialistas ouvidos pelo portal Terra, deve impulsionar os investimentos em pesquisa no Brasil.



Para o astronauta Marcos Pontes, único brasileiro a participar de uma missão no espaço, a posse de Raupp representa a valorização da capacidade técnica, frente a pressões políticas. "Ajuda o fato de não ser de nenhum partido. Raupp é uma pessoa de muito conhecimento, sabe todas as necessidades da área porque vive a ciência e tecnologia desde o começo da carreira", afirma. O astronauta ainda lembra a necessidade de se investir mais na área, que teve verbas cortadas pela presidente Dilma no ajuste das finanças em 2011.



"Quando falamos sobre um programa de ciência e tecnologia, estamos nos referindo a um planejamento que ultrapassa um mandato, isso leva 15, 20 anos. Precisa de investimento e trabalho constantes, com estruturação das instituições e empenho político para que as propostas não sejam abandonadas. Raupp é um profundo conhecedor dessa área e de suas necessidades, espero que com um técnico com visão sistemática, possamos conquistar o avanço necessário, sem interrupções e corte dos recursos". Pontes acredita que a posse do então presidente da Agência Espacial seja um novo marco para as pesquisas brasileiras na gravidade zero.



Além das pesquisas no espaço, a posse de Raupp também é vista com bons olhos para estimular outros grandes projetos brasileiros. Em nota, a Sociedade Brasileira de Física (SBF) disse que espera que a chegada do novo ministro possibilite a retomada dos programas de pesquisa e de cooperação internacional, alinhavados durante o governo Lula. Entre eles, a entidade cita a entrada do Brasil no consórcio de países participantes do CERN, o centro europeu de física nuclear que abriga o maior acelerador de partículas do mundo, o LHC.



"Tenho certeza de que ele [Raupp"> estará empenhado em alinhar a posição científica do Brasil com a posição econômica, a única forma de mantermos sustentavelmente nossa atual condição de uma das maiores economias do planeta e, ao mesmo tempo, gerar maior bem estar para nossa população", diz Celso de Melo, presidente da Sociedade Brasileira de Física.



Já a professora Helena Nader, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), disse nesta terça-feira que quer parabenizar a presidente Dilma Rousseff pela escolha do novo ministro. "Raupp é excelente gestor, que tem uma visão global do Brasil e que apresenta um perfil científico e tecnológico fundamental para este cargo", afirma.



Desafios - Para a presidente da SBPC, o maior desafio do novo ministro será recuperar os investimentos perdidos com o contingenciamento dos gastos no primeiro ano do governo de Dilma Rousseff. "Todo mundo se sentiu orgulhoso ao ver que o Brasil ultrapassou a Inglaterra no ranking das maiores economias mundiais, mas é preciso tomar consciência de que o verdadeiro desenvolvimento não se conquista sem educação e ciência. Raupp terá o desafio de mostrar isso", diz Helena Nader ao destacar que sem dinheiro não é possível conquistar o nível de crescimento científico que o País necessita.



Ela ainda lembra que a proposta encampada por Mercadante, quando assumiu o ministério, de destinar um percentual das riquezas do Pré-Sal para a ciência e a inovação é uma ideia proposta por Raupp desde 2009, quando comandava a SBPC. "Temos certeza que ele vai levar isso adiante e vai pressionar os parlamentares sobre a importância de se destinar os recursos para a ciência e também para a educação".



Entrevista - Em entrevista exclusiva ao jornal Folha de São Paulo, Raupp afirmou que quer reformular o programa espacial brasileiro. A ideia é que Agência Espacial Brasileira (AEB) e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), duas instituições que Raupp já comandou, parem de concorrer entre si.



Folha - Qual será o maior desafio da sua gestão?

Marco Antonio Raupp - É estabelecer uma parceria com o setor produtivo para dar consistência à pesquisa tecnológica no País.



Mas poucas empresas fazem ciência no Brasil.

Temos exemplos de empresas que fazem pesquisa de ponta. O sistema de pesquisa e inovação da Petrobras levou à superação de questões importantes na produção de petróleo. Importávamos petróleo e, hoje, somos exportadores. Também temos o bom exemplo da Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária">. Hoje, produzimos no Centro-Oeste, que até há pouco tempo não tinha nada. Isso sem falar na Embraer [Empresa Brasileira de Aeronáutica">. Temos de seguir esses exemplos. Há propostas que quero implementar para isso.



Quais propostas?

A Embrapii [Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial">, que o [Aloizio"> Mercadante deixa para eu implementar. O que a Embrapa fez para a agricultura a Embrapii tem de fazer para a indústria. Nesse momento em que as exportações estão caindo, isso é vital. As empresas têm de investir também. Precisamos criar condições para que elas vejam que poderão ter benefício econômico a partir de pesquisa. Esse é um grande desafio para o plano plurianual que vou desenhar para os anos de 2012 a 2015.



Falta pesquisador no Brasil?

Sim. Nossa pós-graduação se concentrou em formar pessoas para as próprias universidades. Agora, precisamos de gente para trabalhar nas empresas e nas instituições governamentais. Temos uma brutal necessidade de engenheiros. É preciso formá-los e trazer gente de fora. O programa Ciência sem Fronteiras possibilita justamente isso.



Embrapii e Ciência sem Fronteiras são projetos da gestão de Mercadante. Seu governo será de continuidade?

É o mesmo governo. Não vou reinventar a roda. Minha missão é acelerar a roda.



Há grandes projetos aprovados ainda sem recursos, como o reator multipropósito do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), o novo anel de luz síncrotron e a parceria com o ESO (Observatório Europeu do Sul). Qual será a sua prioridade?

Esses projetos são importantes para a ciência brasileira. É preciso viabilizá-los mesmo que tenhamos de distribuir o orçamento em vários anos. E há outros, como o programa espacial.



O programa espacial será o foco da sua gestão?

Sempre foi prioridade, mas existem muitos problemas. Sempre fui crítico à maneira como o sistema espacial está articulado, com duas instituições concorrendo entre si: a AEB e o Inpe. No ministério, olharei para essa questão.



Inpe e AEB serão unificados?

Não, a ideia é manter as instituições de maneira que AEB e Inpe não concorram entre si. Não podemos misturar política espacial com fazer satélite. Mas Inpe e AEB têm de atuar juntas. O governo não quer as duas trabalhando separadamente porque isso é perder dinheiro.



O Inpe tem sofrido para contratar pessoas após a aposentadoria de funcionários. Como resolver essa questão?

Temos de ter um aparato legal para conseguir contratar de maneira mais flexível. Mas me pergunto se é o Estado que deve contratar todas as pessoas para fazer pesquisa no País. É evidente que não. Por isso insisto nas parcerias com o setor privado.



As parcerias com o setor produtivo são a sua estratégia para aumentar os recursos para ciência? Hoje temos 1,1% do PIB em ciência. A meta para 2010 era 1,5%...

Não adianta a gente ficar falando que precisa de mais recursos para fazer um projeto se não justificamos a proposta. E precisamos buscar o dinheiro. Não podemos ficar parados esperando alguma coisa acontecer.

(portais Terra e Folha.com)





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