Nova lei do lixo pode elevar preços

Data: 30/11/2011


O custo da implantação da logística reversa, que é o retorno dos produtos à indústria depois do consumo, uma exigência da Lei de Resíduos Sólidos, pode acabar elevando os preços das mercadorias se não houver incentivos do governo.


Segundo as empresas que estão formulando os acordos setoriais para se adequar à lei, em muitos casos o retorno com o reaproveitamento dos resíduos não compensará o investimento em transporte dos resíduos e de reciclagem, como por exemplo para lâmpadas e eletrodomésticos. A Lei de Resíduos Sólidos foi regulamentada em dezembro de 2010. Entre suas metas estão a coleta seletiva em todo o país, fim dos lixões até agosto de 2014 e responsabilização dos fabricantes pelos produtos pós-consumo.



Segundo Silvano Costa, diretor de ambiente urbano do Ministério do Meio Ambiente, porém, a intenção é evitar aumentos de custo. "Precisamos discutir e formular propostas de incentivo", diz. Eventuais isenções tributárias estão sendo analisadas no comitê formado pelos ministérios da Fazenda, Agricultura, Saúde, Meio Ambiente e de Desenvolvimento.



As metas para adaptação à lei, regulamentada no fim de 2010, serão estabelecidas nos acordos setoriais, a serem apresentados pelas empresas no primeiro semestre de 2012. Os primeiros setores chamados pelo governo federal para apresentar propostas foram os de lâmpadas fluorescentes, eletroeletrônicos, embalagens, remédios e embalagens de lubrificantes. "Cada um vai discutir o seu modelo. Tem produtos com altíssima atratividade econômica na reciclagem, outros com menos", diz Costa.



André Vilhena, diretor do Compromisso Empresarial para Reciclagem (Cempre), diz que o segredo para a viabilidade econômica no reaproveitamento dos produtos é a escala. "É preciso ter grandes volumes de material e isso vai levar um tempo para acontecer."



Hoje poucas empresas reciclam o que poucos consumidores se dispõem a levar em postos de entrega e a coleta seletiva chega a apenas 8% das cidades do país. Como a lei torna a adoção da logística reversa obrigatória, só poderá ser descartado em aterro o que não puder ser reutilizado nem reciclado.



A maioria dos setores pretende centralizar a coleta dos materiais no varejo e organizar campanhas para incentivar o descarte correto. Outra frente será no desenvolvimento de tecnologias que permitam a reutilização dos materiais, repensando inclusive a forma com que os produtos são fabricados e os insumos utilizados.



Quem está com a proposta mais estruturada é o setor de lâmpadas. A ideia é que todas as fabricantes e importadoras contribuam para uma entidade privada que administrará o processo desde a coleta das lâmpadas até a venda do resíduo final. A contribuição seria feita na hora que as empresas colocam o produto no mercado, segundo o volume vendido. "A intenção é que a indústria cubra o custo e ele seja repassado uniformemente aos produtos", diz Alexandre Cricci, presidente da Abilumi, associação que reúne os importadores de produtos de iluminação.



O custo da destinação final correta das lâmpadas, com a trituração do vidro, chega próximo ao da sua fabricação, segundo as empresas. Ou seja, há chances de a logística reversa trazer aumento de preço para o consumidor em até R$ 1 por produto, segundo a Abilumi. "Existe um estudo apresentado ao governo que mostra que o custo da logística reversa chegaria ao consumidor valendo mais que o dobro investido por conta dos impostos", diz o presidente da Abilumi.



A variedade no setor de eletroeletrônicos exige mais de uma solução para a logística reversa. Se pode funcionar para celulares e notebooks, o descarte dos produtos velhos no varejo não vai dar certo para produtos maiores como eletrodomésticos. Além da dificuldade de transporte, poucas lojas possuem espaço disponível para receber produtos de grande volume.



Segundo André Saraiva, diretor de responsabilidade socioambiental da Abinee, entidade que representa a indústria de eletroeletrônicos, é preciso buscar alternativas para que a logística não encareça o processo de reciclagem. "Pensamos em trabalhar a entrega de produtos novos com o recolhimento do velho, por exemplo."



A bitributação dos reciclados também será questionada nos acordos setoriais. "A indústria paga imposto na fabricação e depois na reciclagem", diz Luis Carlos Machado, coordenador de sustentabilidade da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros).



Segundo Luciana Pellegrino, diretora-executiva da Associação Brasileira de Embalagens (Abre), é essencial estimular o consumo dos materiais reciclados com redução de tributos. "Hoje o impacto tributário faz com que o produto reciclado não seja mais barato que os demais", diz ela.



Outra questão é o que fazer com os produtos piratas, já que a cadeia da logística reversa será bancada pelas empresas formais. "Dar a destinação adequada aos produtos piratas vai onerar a indústria", diz Machado, da Eletros.



A capacidade industrial para reciclar os eletroeletrônicos no país também está sendo avaliada no acordo setorial. De acordo com entidades representantes do setor, há poucas empresas nesse ramo no Brasil, concentradas no Sudeste. Isso exigiria um investimento em ampliação do parque industrial de desmontagem e reciclagem dos eletroeletrônicos. Por falta de empresas, os celulares recolhidos hoje são reciclados fora do país.



Para vidro, PET, alumínio e papelão ondulado há uma cultura de reciclagem mais avançada em relação a outros produtos. Reunidos pelo setor de embalagem, o grupo deve entregar no mínimo três propostas de logística reversa, diz a diretora-executiva da Abre.



O grande foco, segundo Luciana, é a responsabilidade compartilhada entre as prefeituras, catadores, varejo e indústria. "A reciclagem de embalagens no Brasil já acontece há décadas e faz parte da produção da indústria, economiza energia. Mas é preciso melhorar a conscientização da sociedade sobre o descarte e implantar a coleta seletiva", diz ela. O desafio, assim como nos outros setores, é conseguir recolher todo o material.



Costa, do Ministério do Meio Ambiente, diz que o descarte irregular dos resíduos será enquadrado na Lei de Crimes Ambientais. Há uma grande dificuldade, no entanto, em saber quem é o responsável pelo lixo doméstico.



O setor de embalagens defende a participação das cooperativas de catadores na triagem dos materiais. As prefeituras, por sua vez, terão o desafio de passar dos atuais 8% das cidades com coleta seletiva para 100%. O aumento do volume arrecadado permitirá a reciclagem de uma variedade maior de produtos que hoje não são considerados interessantes para o mercado.



O setor de medicamentos ainda não está convencido de que é preciso implantar a logística reversa. Segundo Nelson Mussolini, vice-presidente executivo do Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (Sindusfarma), não é possível comparar os medicamentos com os demais produtos. "Temos que verificar que risco eles causam ao ambiente. E o volume de medicamento descartado tem que ser mínimo, pois quando a medicação é comprada com receita médica, não há sobra", diz.



O setor está discutindo o tema com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas algumas redes de farmácia e laboratório já possuem postos de recolhimento de remédios, que são encaminhados para incineração.

(Valor Econômico)






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