Conferência sobre aquecimento começa sem clima na África do Sul

Data: 29/11/2011
Já virou clichê dizer que as conferências do clima nunca alcançam o objetivo desejado. A COP-17 (17ª Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas), que começou nesta segunda-feira sob o signo da crise econômica, deve romper esse padrão: nela, o próprio objetivo foi diluído.

Os diplomatas de 190 países que se reúnem até 10 de dezembro em Durban, na África do Sul, não perseguem mais um acordo global contra emissões de gases-estufa. O que está em jogo é a continuidade ou não do acordo que existe hoje, o pífio Protocolo de Kyoto.


Para a diplomacia brasileira, a reunião terá sido um sucesso se as nações desenvolvidas concordarem em prolongar a vida do protocolo até 2020. E um fracasso em Durban traria um ônus extra para o Brasil, que sediará a próxima conferência ambiental da ONU, a Rio +20.

Kyoto, assinado em 1997, previa que os países industrializados cortassem suas emissões em 5,2% em relação a 1990 até 2012. Como se sabe, os EUA ficaram de fora, e o acordo teve impacto virtualmente nulo sobre a concentração global de gases-estufa na atmosfera, que cresceu 7% de 1997 a 2011.

Não há acordo sobre o tipo de regime que possa ampliar o combate às emissões de carbono depois que ele expirar.

"Se deixarmos morrer Kyoto, o consenso é que não se vai mais conseguir um acordo desse tipo", disse o embaixador André Corrêa do Lago, negociador-chefe do Brasil na área de clima.

AINDA MAIS INÚTIL

O problema é que também há consenso de que um eventual segundo período de compromisso de Kyoto será ainda mais inútil do que o primeiro para o objetivo-mor da convenção: evitar que o planeta aqueça mais de 2°C.

Os EUA, principal emissor histórico, não ratificarão Kyoto nunca. Os países emergentes, hoje os maiores emissores do planeta, não têm metas obrigatórias pelo acordo.

E outros países industrializados com obrigações no acordo, como Japão e Rússia, já anunciaram que não participarão de um segundo período: apenas dizem que vão implementar as metas voluntárias de corte de emissões com que se comprometeram na conferência de Copenhague, em 2009.

Corrêa do Lago admite que esse cenário deixa dentro de Kyoto apenas a União Europeia e outros países menores, que somam somente 15% das emissões mundiais.

Sem Kyoto, porém, os países em desenvolvimento temem que se perca a diferenciação que obriga os países ricos (que poluíram mais no passado) a fazer mais.

Os países desenvolvidos, por sua vez, apelam para um acordo único. Na semana passada, o ministro do Ambiente britânico, Chris Huhne, defendeu que um tratado legalmente vinculante que envolvesse também os emergentes fosse fechado em 2015.

O Brasil --que se obrigou, por lei, a cortar emissões até 2020-- não fecha a porta a um acordo desses. Mas antes os ricos terão de entregar Kyoto.

Outro impasse deve girar em torno do dinheiro que os países ricos prometeram desembolsar para o combate à mudança climática nos pobres: US$ 30 bilhões entre 2010 e 2012 e um Fundo Verde de US$ 100 bilhões por ano a partir de 2020.

Com a crise da dívida dos EUA e o colapso financeiro da Europa, os principais doadores, falar em dinheiro para o clima é a proverbial corda em casa de enforcado.

A crise tem feito os países ricos levantarem dúvidas sobre que tipo de verba constitui o Fundo Verde. O discurso dos ricos agora, dizem diplomatas brasileiros, é que o dinheiro do fundo verde deve ser sobretudo privado.

"Não foram setores privados que se comprometeram com o dinheiro, portanto, eles não poderão ser cobrados", afirmou o diplomata brasileiro André Odembreit.

Folha de S. Paulo


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