Estudos americanos

Data: 27/10/2011
Transformações no Estado e na sociedade no contexto do regime militar brasileiro, ainda que sem essa intenção, permitiram que um grupo de médicos com o objetivo de implantar um sistema universal de assistência médica pública, nacional e descentralizada, viesse a alcançar sua meta por meio de graduais transformações, consolidadas formalmente pela Constituição de 1988.

Este é, em síntese, o conteúdo do trabalho apresentado no dia 25 de outubro na FAPESP Week, em Washington, por Tulia Faletti, professora da Universidade da Pensilvânia, intitulado “Assistência Médica Universal e Participação Comunitária no Brasil”.

Faletti afirma que a criação do SUS (Sistema Único de Saúde) no final da chamada “década perdida”, num período de grande dificuldade econômica para toda a América Latina, em que a maioria dos Estados no subcontinente ou retirava recursos da saúde ou a privatizava, contraria a tendência conjuntural e, ao mesmo tempo, a literatura acadêmica anteriormente estabelecida, segundo a qual mudanças drásticas em sistemas públicos de saúde costumam ocorrer em situações de extremada crise política.

Ela argumenta que algumas instituições solidamente estabelecidas no país, como o corporativismo e o federalismo, forneceram a base necessária a propostas do tipo do SUS. Igualmente, algumas mudanças impostas pelo regime militar (embora não com esse objetivo) ajudaram a paulatinamente criar as condições ideais para o surgimento do SUS.

Por exemplo, a decisão do governo Castello Branco em 1964 de unificar numa só entidade (o INPS) os sete institutos de previdência social de diversas categorias de trabalhadores (tomada para enfraquecer os sindicatos) teve entre seus efeitos o de criar uma previdência social estatal poderosa e rica, a qual, quando foi incorporada pelo SUS, lhe ofereceu recursos materiais de que o sistema público de saúde não dispunha antes.

A palestra de Faletti foi a primeira das três que compuseram a sessão de estudos brasileiros e americanos do simpósio FAPESP Week, coordenada por Fernanda Gandara, vice-presidente da Synthetic Genomics. Inc.

O professor da Unesp Tullo Vigevani fez aos participantes um sumário dos objetivos e produção do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU), que ele dirige.

Vigevani ressaltou que estudos sobre EUA são feitos há muito tempo e em largo escopo, mas até agora não haviam sido sistematizados, e que organizá-los é uma das missões do INEU.

A sessão foi encerrada pela professora Elizabeth Stein, da Universidade de Nova Orleans, que apresentou trabalho sobre o papel da imprensa brasileira durante o regime militar, no qual defende a tese de que em regimes autoritários o jornalismo pode funcionar como uma espécie de barômetro para medir a tolerância do governo em relação a manifestações públicas de dissenso.

De acordo com ela, quando as críticas nos meios de comunicação crescem em número e intensidade, é sinal de que a repressão será menos dura, e isso incentiva outros setores da sociedade a se organizar. Tal processo, segundo Stein, ocorreu no Brasil a partir de 1968 até o fim do regime militar.

Agência Fapesp


< voltar