Desafios biodiversos

Data: 26/10/2011
O programa BIOTA-FAPESP, com destaque para algumas de suas conquistas científicas e principais desafios para os próximos anos, foi apresentado por seu coordenador, Carlos Alfredo Joly, na sessão "Biodiversidade e a Amazônia" durante a FAPESP Week, realizada em Washington, Estados Unidos.

Professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e titular da Secretaria de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento (Seped) do Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação (MCTI), Joly abriu a sessão que contou com apresentações de Humberto Rocha e Paulo Artaxo, da Universidade de São Paulo (USP), Ana Carnaval, do City College of New York, e John Wenzel, do Carnegie Museum of Natural History.

"O programa BIOTA-FAPESP é um exemplo importante de como traduzir o conhecimento adquirido em políticas públicas e tem ajudado a aproximar cientistas de formadores de políticas públicas no Estado de São Paulo", disse Joly.

O cientista ressaltou que São Paulo, conhecido pelo desenvolvimento econômico e elevada população, é também um estado muito rico em biodiversidade. "Por exemplo, São Paulo tem pelo menos 7,4 mil espécies de plantas fanerógamas", disse.

De 2006 a 2008, pesquisadores de diversas instituições ligados ao BIOTA-FAPESP realizaram um extenso trabalho de sintetizar dados científicos para que pudessem ser utilizados na formação de políticas públicas. O resultado foi a identificação de áreas no Estado de São Paulo consideradas como prioritárias para a conservação e restauração.

Baseados em mais de 150 mil registros de um número superior a 9 mil espécies animais e vegetais, esses mapas e um livro que reuniu os dados foram adotados pelo Governo do Estado de São Paulo na criação de normas e leis para a proteção da biodiversidade. "Há 19 instrumentos legais produzidos a partir do que os pesquisadores do BIOTA-FAPESP conseguiram produzir", disse Joly.

O coordenador também destacou a elevada produtividade do programa, que resultou na publicação de mais de 900 artigos científicos e na formação de recursos humanos fundamentais para a área, incluindo 108 doutores e 79 pós-doutores. "Em 2009, a FAPESP renovou o financiamento do programa para mais dez anos, com a ideia de prolongar e ampliar os resultados e o alcance do BIOTA-FAPESP", disse.

Rocha, professor do Departamento de Ciências Atmosféricas e coordenador do Laboratório de Clima e Biosfera da USP, apresentou aos participantes da FAPESP Week resultados de pesquisas na Mata Atlântica brasileira, que incluem a montagem de torres de observação e redes wi-fi para estudos ambientais na região.

"Os padrões dos ciclos de água e de carbono ajudam a descrever a funcionalidade dos ecossistemas, que depende da estrutura biológica de comunidades e organismos e de suas relações com o clima. Tais padrões formam um número de serviços ecossistêmicos e são afetados por interrupções causados por mudanças no uso da terra e por oscilações climáticas", disse o também membro da Coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais.

Entre esses sistemas ecossistêmicos, segundo Rocha, estão a disponibilidade de água para a agricultura, a qualidade da água em áreas urbanas e o sequestro de carbono.

A rede de geossensores instalada pelo grupo de Rocha na Mata Atlântica realiza medidas como temperatura e humidade do ar utilizando 156 termômetros e 52 higrômetros. As torres que compõem a rede trocam dados entre elas por um sistema de transmissão sem fio. O projeto é conduzido em cooperação com a Universidade Johns Hopkins e a Microsoft Research, dos Estados Unidos, e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

A palestra de Artaxo, professor do Instituto de Física da USP e membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais, foi sobre mudanças na composição da atmosfera na Amazônia.

Segundo o cientista, o ambiente amazônico é um sistema dinâmico e muito complexo e, para compreendê-lo, é preciso entender os principais processos que regulam seu funcionamento, como o balanço de carbono e mudanças nos sistemas aquáticos. "Em especial, precisamos estudar os aerossóis, que são um ingrediente crítico para o funcionamento do ecossistema amazônico", disse.

Aerossóis são minúsculas partículas líquidas ou sólidas suspensas na atmosfera que têm papel crítico no clima do planeta. Os aerossóis medem de um centésimo de micrômetro, ou o tamanho das menores bactérias, a dezenas de micrômetros, ou o diâmetro de um fio de cabelo. "Os aerossóis regulam propriedades das nuvens, o balanço na radiação, o ciclo de nutrientes e outras funções ecossistêmicas importantes", disse Artaxo.

"Nós observamos um aumento de 25% a 60% na cobertura de nuvens quando ocorre o aumento na emissão de aerossóis devido à emissão de biomassa resultante de queimadas. Essas mudanças nas nuvens, tanto em sua cobertura como na microfísica, tem relações importantes com o ciclo hidrológico", disse.

Artaxo e colegas também estudam como uma cidade como Manaus, com cerca de 2 milhões de habitantes, afeta a produção de aerossois e como isso impacta no ecossistema da Floresta Amazônica.

Produção brasileira

Ana Carnaval falou sobre como a colaboração entre cientistas do Brasil e dos Estados Unidos tem ajudado no aumento do conhecimento a respeito da biodiversidade na América do Sul.

O grupo coordenado pela cientista atua em conjunto com equipes da Universidade da Califórnia em Berkeleyu, da USP, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da Universidade Federal da Bahia em pesquisas sobre a evolução biogeográfica na Mata Atlântica brasileira.

Os pesquisadores avaliaram 28 localidades, tendo percorrido quase 3 mil quilômetros, em estudos de campo na Mata Atlântica para testar as previsões para o bioma conforme um modelo desenvolvido por Carnaval e Craig Moritz, da Universidade da Califórnia em Berkeley. Essa hipótese postula que a estabilidade no fim do período Quaternário.

A sessão foi encerrada por John Wenzel, diretor do Centro de Biodiversidade e Ecossistemas do Carnegie Museum of Natural History, especialista na evolução de comportamentos complexos em insetos como abelhas e formigas.

"Não podemos falar no estudo de comportamentos em formigas sem destacar a importância das pesquisas de um brasileiro, Carlos Roberto Ferreira Brandão (da USP), com quem tenho o prazer de colaborar há mais de 30 anos", disse. Segundo Wenzel, o número de espécies de formigas descritas no Brasil, 1266, é muito maior do que o de qualquer outro país.

Essa grande produção científica, de acordo com Wenzel, é confirmada pela grande publicação na área. "A Zootaxa é a revista científica mais importante em zoologia sistemática, pelo menos em termos de número de páginas publicadas, de cerca de 30 mil por ano. Pois a Zootaxa publica mais artigos de pesquisadores do Brasil do que os de qualquer outro país", disse.

Segundo Wenzel, por causa da riqueza de sua biodiversidade, o Brasil tem desafiado a biologia há mais de 200 anos. "À medida que a sofisticação da comunidade de sistematistas ocorreu no Brasil, o mesmo se deu com os conceitos de biodiversidade. A boa taxonomia deve vir antes de qualquer medida da biodiversidade, mas essa relação é muito mais profunda do que a necessidade de dar nome às espécies", disse.



Fonte: http://agencia.fapesp.br





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