Admirável e complexo mundo novo

Data: 28/09/2011
Os diversos mundos, formados por subsistemas regionais com dinâmicas específicas, provenientes da interação entre os países que os integram, além das distintas simetrias e assimetrias de uma sociedade internacional heterogênea e planetariamente interligada, tornam difícil compreender a complexidade e fazer projeções sobre os cenários futuros do mundo atual.

Entretanto, buscar entender essa complexidade é fundamental para esclarecer o espaço dentro do qual se move a política externa dos países e o horizonte de convivência coletiva em um mundo globalizado.

A avaliação foi feita por Celso Lafer, presidente da FAPESP, na conferência que proferiu em 26 de setembro no salão nobre da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). O evento abriu o ciclo de quatro conferências promovidas pela Pró-Reitoria de Pesquisa da USP sobre os “Desafios da Globalidade”, para discutir o tema que é de grande relevância e comum às áreas de ciência política, direito, relações internacionais e economia.

Na primeira conferência, sobre “As assimetrias da sociedade internacional”, Lafer fez uma exposição geral sobre o tema geral do ciclo, que também será discutido em mais três encontros.

Em sua conferência, Lafer abordou os elementos determinantes do quadro de assimetria econômica, política e social que caracteriza a sociedade internacional e avaliou de que modo esse quadro afeta as dinâmicas inerentes aos processos de globalização e é por eles afetado.

Segundo ele, entender como funciona a “máquina do mundo”, que é, por excelência, o campo de estudo das relações internacionais, é um indispensável ingrediente de conhecimento para a condução da política externa de um país.

Porém, para isso, não é possível contar com o apoio de leituras de autores clássicos ou de outras que desembocam em dicotomias como idealismo versus realismo, além de metáforas como a da balança do equilíbrio do poder.

“Hoje, não existem mais espaços passíveis de viver em efetivo isolamento. A ‘máquina do mundo’ está se internalizando na vida dos países, com distintas modalidades e impactos, dependendo das características das sociedades, dos estados e das regiões em que estão inseridos, e alterando, com renovada profundidade, a maneira como o espaço e o tempo penetram no cotidiano das pessoas”, disse.

Para avaliar a complexidade atual do processo de globalização, Lafer fez uma análise dos cincos grandes blocos de temas da atual agenda internacional propostos por Andrew Hurrell, professor de relações internacionais da Universidade de Oxford, em seu recente livro On global order.

O primeiro bloco trata dos impactos das políticas de identidade e reconhecimento que surgiram durante a Guerra Fria e colocaram em discussão a estabilidade da ordem do sistema internacional e a própria integridade territorial dos Estados, levando a processos de separação entre eles.

Alguns exemplos são a desagregação da União Soviética e da Iugoslávia, o problema dos curdos no Oriente Médio, as aspirações dos bascos na Espanha, de Quebec, no Canadá, ou do Tibete em relação à China.

Já o segundo bloco envolve os desafios que surgiram em 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. O documento propôs a construção de uma sociedade internacional constituída não só de Estados soberanos, mas de indivíduos livres e iguais.

“O direito violado em uma parte do mundo passou a ser sentido em todo o mundo, o que é um sinal positivo do progresso da convivência coletiva humana e uma das facetas positivas da internalização do mundo na vida dos países, trazida pelo processo de globalização e do direito internacional que foi sendo elaborado a partir dele”, avaliou Lafer.

O terceiro bloco envolve os problemas da guerra e da violência, intensificado pelo permanente temor das armas de destruição em massa. Por sua vez, o quarto bloco trata do desafio da gestão de uma economia globalizada em um mundo caracterizado pela desigualdade social.

Por fim, o quinto bloco aborda o desafio do desenvolvimento sustentável em um mundo globalizado, que tornou temas ambientais, como as mudanças climáticas, globais.

“Nenhum dos grandes temas ambientais, como a biodiversidade e as mudanças climáticas, são passíveis de encaminhamento sem a solução e a presença do Brasil”, destacou Lafer.

Homenagem

O evento contou com a presença do pró-reitor de pesquisa da USP, Marco Antônio Zago, do professor Antônio Magalhães Gomes Filho, diretor da Faculdade de Direito da USP, do professor Nicolau Reinhard, vice-diretor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP e coordenador do ciclo de conferências, além de alunos e professores da universidade.

De acordo com os organizadores do evento, o convite a Lafer para abrir a série de conferências também foi uma forma de homenageá-lo. Professor titular da Faculdade de Direito da USP desde 1988, onde estudou e leciona desde 1971 as disciplinas de Direito Internacional e Filosofia do Direito, Lafer está se aposentando na USP.

“Não foi por acaso que escolhemos o professor Celso Lafer para abrir esse ciclo de conferências. No momento em que ele se aposenta da universidade, pensamos que a melhor homenagem que se pode prestar a um professor é convidá-lo para que ele continue dando aulas. Não há nada mais importante, mais indicativo de quão querido é um mestre do que um convite para que ele não deixe de ser mestre”, disse Pedro Dallari, professor da USP.

A próxima conferência do ciclo, sobre “A economia política da redistribuição”, será no dia 7 de outubro, às 17 horas. No evento, Adam Przeworski, professor da New York University, abordará “A economia política da redistribuição”.

No terceiro evento da conferência, no dia 19 de outubro, às 17 horas, Jacques Marcovitch, professor da FEA da USP e reitor da universidade de 1997 a 2001 fará uma exposição sobre “Assimetrias e Cooperação Internacional”. Marcovitch é especialista em empreendedorismo, mudanças climáticas e relações internacionais.

Otaviano Canuto dos Santos Filho, vice-presidente e chefe da Rede de Redução de Pobreza e Gestão Econômica do Banco Mundial, abordará o tema “As Economias em Desenvolvimento como Locomotivas da Economia Global” na última conferência do ciclo “Desafios da Globalidade”, dia 26 de outubro, às 17 horas.

As conferências serão realizadas no auditório FEA-5, no campus da Cidade Universitária, em São Paulo. Nos dois próximos anos o ciclo terá continuidade com as conferências dedicadas ao exame dos regimes internacionais e dos múltiplos aspectos associados à noção de governança internacional.

Iniciativa conjunta da Pró-Reitoria de Pesquisa, do Departamento de Ciência Política da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (DCP-FFLCH), da Faculdade de Direito, do Instituto de Relações Internacionais (IRI) e da FEA, o ciclo de conferências visa reforçar a cooperação interdisciplinar na USP e ampliar as possibilidades de interpretação da globalidade e de estudo das suas diversas implicações.

Mais informações e inscrições: www.inovacao.usp.br/uspconferencias/globalidade

Agência Fapesp


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