Regras restringem biotecnologia no País

Data: 30/06/2011


A Extracta foi, em 2004, a primeira empresa brasileira a conseguir uma licença do Ministério do Meio Ambiente para buscar na natureza substâncias de interesse comercial. Instalar a estrutura para prospecção custou US$ 5 milhões e, a cada ano, são investidos outros US$ 500 mil. A companhia já identificou entre as substâncias seis fortes candidatas a se transformar em medicamentos, mas mantém as descobertas trancafiadas. O motivo é a impossibilidade de patentear os resultados de suas pesquisas no Brasil.



A legislação brasileira não permite a patente de substâncias naturais, mesmo quando isoladas. A lei brasileira está em conformidade com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), que deixa a cargo dos países a definição sobre organismos vivos.



"No Brasil, houve uma opção pela proteção mínima obrigatória", afirma o presidente do Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (Inpi), Jorge Ávila. Ele cita EUA, Japão e China como países que fizeram uma opção diferente da brasileira, por patentear substâncias naturais.



Pela falta de possibilidade de registrar a propriedade intelectual no Brasil, a Extracta já encolheu a equipe inicial, de 60 cientistas, para 17. Por conta disso também, mantém distante do mercado substâncias que consistem em promessas de tratamento ou cura para infecções hospitalares, enfisema pulmonar, asma, tuberculose, hepatite C, diabetes tipo 2 e doença de Chagas.



Algumas pesquisas da Extracta estão atrasadas por falta de investimento. "O investidor até acredita que o produto será maravilhoso, mas não tem como garantir que não seja imediatamente copiado", afirma o diretor-presidente da empresa, Antônio Paes de Carvalho. Mesmo depois que a substância é isolada e tem suas propriedades confirmadas em testes, a Extracta tem dificuldade de chegar ao mercado. "Nenhuma indústria vai pagar as licenças sabendo que qualquer concorrente, sem nenhum investimento, poderá imitá-la", diz.



Carvalho diz que já pensa em patentear as substâncias no exterior. O executivo calcula em US$ 10 mil o gasto anual para manter a propriedade nos 20 principais mercados do mundo. Dessa maneira, ele diz esperar, entretanto, que a compra das licenças torne-se atraente às empresas estrangeiras. Caso alguma delas se interesse pelo mercado brasileiro, os produtos fabricados a partir da biodiversidade brasileira poderão ser vendidos no país.



Registrar as patentes de substâncias naturais no exterior é uma prática incentivada pelo Inpi, que pode atuar como intermediário nesse processo. Ávila, presidente do órgão, diz que esse é um entrave ao avanço da biotecnologia no país, já que grande parte das pesquisas brasileiras na área envolve esse tipo de substância. "Minha impressão é que o Brasil tem um potencial imenso, mas precisamos ajustar o ambiente regulatório para a indústria deslanchar", diz.



A Natura também defende mudanças na legislação brasileira para biotecnologia. O presidente da empresa, Pedro Passos, aponta como uma das maiores dificuldades a demora de dois a quatro anos que leva para uma companhia receber autorização para fazer pesquisas com plantas localizadas em áreas de reserva. "Essa regra foi feita por conta da preocupação com pirataria, mas criou uma restrição tão grande que

impede pesquisas sobre a biodiversidade brasileira", diz.



O avanço da legislação envolve questões mais complexas, como o respeito às comunidades indígenas que vivem no local da prospecção. Eduardo Giacomazzi, diretor-executivo da BrBiotec - que reúne entidades e empresas de biotecnologia - diz que esse não precisa ser um entrave à pesquisa. Ele defende soluções para beneficiar essas comunidades, como a criação de um fundo por empresas que se beneficiam

economicamente da exploração das substâncias naturais.



A BrBiotec apresentou nesta semana um mapeamento do setor de biotecnologia brasileiro na maior convenção internacional da área, realizada em Washington.



O levantamento mostra que o país tem 237 companhias de biotecnologia, concentradas na região Sudeste. A maior parte dessas empresas (39,7%), dedica-se às pesquisas voltadas à saúde humana. A maioria (56%) tem receita anual de até R$ 2,4 milhões e 85% empregam mais de 50 pessoas. O financiamento público é utilizado por 78% delas, enquanto apenas 14% das companhias usam recurso provenientes das empresas de capital de risco.

(Valor Econômico)





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