Biocombustíveis são solução errada para proteger o clima
Johannes Beck*
Nem tudo o que se denomina bio é correto do ponto de vista ambiental. Há, por exemplo, poucos biocombustíveis que realmente trazem vantagens ao meio ambiente. Entre eles estão sobretudo aqueles provenientes de dejetos, como o gás metano extraído da purina.
Mas dejetos são uma fonte muito limitada. E quando a meta é substituir em grande escala o petróleo como combustível, é preciso cultivar enormes extensões de terra para produzir biodiesel ou etanol.
Campeão mundial da produção de biocombustíveis ao lado do Brasil os Estados Unidos apostam em especial no milho. Uma opção que não beneficia, em absoluto, o clima global. Durante o cultivo do milho são liberadas enormes quantidades de óxido nitroso, nocivo ao clima. Além disso, a produção de etanol a partir do milho consome uma grande quantidade de energia.
Desse modo segundo cálculos do Departamento Ambiental da Suíça quem abastece seu veículo com etanol de milho contribui tanto para a emissão de gases estufa quanto os que utilizam gasolina convencional.
Balanço ecológico catastrófico
O pior exemplo é o óleo de palmeira do Sudeste Asiático, também utilizado como biodiesel. Na Malásia e na Indonésia foram queimados, nos últimos anos, milhares de hectares de mata tropical para o plantio de palmeiras. Um fato tanto mais catastrófico porque grande parte das florestas afetadas estava sobre solos de turfa, e os gases estufa neles contidos foram liberados num volume gigantesco.
Segundo dados da organização ambientalista WWF, somente em Sumatra o desmatamento das florestas de turfa entre 1990 e 2002 provocou a liberação de 1,1 gigatonelada de dióxido de carbono por ano. Isso é mais do que a emissão anual da Alemanha. Além disso, a substituição das selvas tropicais por plantações implica a destruição do habitat de plantas, animais e seres humanos.
Nesse meio tempo, a União Europeia (UE) reagiu, exigindo a apresentação de certificados para biocombustíveis, com o fim de evitar que as florestas sigam sendo dizimadas. A UE também passou a privilegiar outros tipos de biocombustível, com melhor desempenho ambiental. Entre elas, o etanol produzido a partir da cana-de-açúcar muito mais eficiente do que o de milho, centeio ou trigo , do qual o Brasil é o maior fornecedor.
Mas a cana-de-açúcar e a maioria das outras plantas ideais para a produção de biocombustível só crescem nos trópicos ou subtrópicos. Isto é: justamente onde se encontram as selvas e os ecossistemas de maior biodiversidade do planeta. E estes têm que ser transformados em monoculturas agrárias para que a produção seja suficiente para substituir os combustíveis fósseis.
Monoculturas no Brasil
Paralelamente a isso os preços dos gêneros alimentícios subirão drasticamente em todo o mundo, pois não há áreas agricultáveis suficientes para, ao mesmo tempo, matar as necessidades de combustível e de comida da população planetária.
Mesmo o pioneiro Brasil não consegue cobrir com o etanol nem um terço de seu consumo de combustível. E para isso já é necessária 5% de toda a área agrícola do país.
Enormes extensões de Mata Atlântica no Nordeste foram derrubadas para o cultivo da cana-de-açúcar nas últimas décadas. Em Pernambuco, por exemplo, restam apenas 2,7% das florestas originais. Há também pressão para transformar em plantações partes do Pantanal. Tais conflitos demonstram os limites práticos do biocombustível.
Nesse ínterim, o governo brasileiro reagiu, designando para o plantio sobretudo áreas do Cerrado no Planalto Central. Porém também estas são ricas em espécies vegetais e animais, as quais seria lamentável sacrificar em nome das monoculturas de soja ou cana-de-açúcar.
Indiretamente, a expansão do bioetanol também aumenta a pressão sobre a região amazônica, pois os canaviais expulsam bovinocultores e plantadores de soja, forçando-os a adentrar a mata tropical.
UE precisa redefinir metas
Somente para satisfazer a meta da UE de, até 2020, substituir 10% de todo o combustível consumido por substâncias de origem orgânica será necessário criar novas áreas agrícolas do tamanho da Irlanda. O cálculo é do Instituto de Política Ambiental Europeia (IEEP), sediado em Londres.
Por isso, a União Europeia deveria abrir mão de suas metas. Biocombustíveis originários de monoculturas agrícolas são um caminho equivocado, já que, desse modo, a natureza e o clima não são protegidos, mas ainda mais prejudicados.
O caminho para um sistema de transporte mais ecológico tem de ser outro: os automóveis precisam tornar-se mais eficientes e consumir menos combustível. É preciso ampliar os transportes públicos e, no futuro, reduzir drasticamente o tráfego, através de um planejamento urbano inteligente.
* Johannes Beck é chefe da redação portuguesa da Deutsche Welle Rádio
(EcoDebate)
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