Tribunais de Conta querem fiscalizar a sustentabilidade dos órgãos públicos

Data: 19/11/2010

Tribunais de Conta querem fiscalizar a sustentabilidade dos órgãos públicos



Afinal, o que os Tribunais de Conta tem a ver com gestão ambiental? Teoricamente nada, mas, na prática, essa visão começa a mudar. Numa iniciativa inédita, o Tribunal de Conta do Amazonas (TCE-AM), colocou o tema em debate nesta quarta-feira (17/11), em Manaus, no I Simpósio Internacional sobre Gestão Ambiental e Controle de Contas Públicas. O objetivo, de acordo com o presidente do Tribunal amazonense, Júlio Pinheiro, é buscar novos paradigmas e estabelecer uma mudança de rumo na atuação desse órgão, assumindo posturas modernas e mais atuantes em relação à preservação do meio ambiente, agindo de forma preventiva, ao mesmo tempo em que fiscaliza a aplicação correta dos recursos públicos.

O encontro, que se encerra na sexta-feira (19), reúne representantes de Tribunais Estaduais e Municipais de todo o País e conta com a participação de especialistas em gestão e direito ambiental de todo o mundo. Durante os três dias, eles debaterão temas como florestas e biodiversidade; mudanças climáticas; o controle da gestão pública na visão européia; tribunais de contas e o controle ambiental; a improbidade administrativa ambiental; o poder judiciário e a crise ambiental. Além disso, os conselheiros e técnicos dos TCs pretendem lançar no último dia do encontro a Carta da Amazônia, que tentará expressar pontos consensuais sobre a forma como devem atuar para ajudar na preservação do meio ambiente. O documento receberá ampla divulgação em todo o país e será apresentado na COP 16, em Cancun.

O primeiro painel apresentado nesta quarta-feira, contou com a participação do professor do Departamento de História da Universidade de Georgetown (EUA), John Mcneill, que fez um panorama histórico dos impactos ambientais da evolução industrial, agrícola e bélica no século XX. Ele chamou a atenção para a questão energética, lembrando que “o volume de energia utilizado pela indústria moderna cresceu exponencialmente a partir da metade do século 20, com base na queima de combustíveis fósseis, diferente do que acontece no Brasil, que tem sua matriz energética baseada nas usinas hidroelétricas. “O Brasil pode fazer uma nova história neste século”, disse ele.

Para outro palestrante, o professor Nicholas Robinson, da Pace University (EUA), “a natureza também tem sua economia e ela é mais importante que a do homem. Nós tiramos dela sem pagar nem dar nada em troca. Isso nós poderíamos chamar de roubo. É como roubar dinheiro do Estado. Deixamos mais pobre as gerações futuras”, disse ele, observando que os Tribunais de Contas tem um papel importante na mediação desses problemas junto aos governos. Ele comparou a iniciativa do TCs brasileiros com os Tribunais Ambientais, que já funcionam em muitos países.

Na opinião do ministro Herman Benjamim, do Supremo Tribunal de Justiça, o terceiro conferencista do período da manhã, “começa hoje uma nova página da proteção jurídica do meio ambiente no País”. Falando sobre direito ambiental, ele ressaltou o papel de prevenção atribuído aos Tribunais de Contas. “Eu sou juiz, mas nós do Judiciário chegamos muito tarde. Quando chegamos, o dano ambiental já ocorreu. Estou certo que os Tribunais de Contas vão incorporar o componente da sustentabilidade porque aí estarão cuidando não só das contas da geração de hoje, mas também das gerações futuras”.

Para o ministro, “o direito ambiental deve ser feito com e para os pobres. É um equívoco imputar o desmatamento na Amazônia aos pequenos proprietários, às populações tradicionais. O código florestal deve estimular essas populações tradicionais a continuar fazendo o que elas fazem a milhares de anos e da mesma forma. Hoje estou convencido que as áreas não devem ser protegidas sem o homem, mas com o homem”.

As grandes questões ambientais do momento estão sendo apresentadas aos conselheiros e técnicos dos TCs por especialistas internacionais, como o diretor executivo da Conservation International, Fábio Rubio Scarano, que fez um painel sobre a biodiversidade brasileira, a pesquisadora e secretária executiva do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente das Nações Unidas (Pnuma), Elizabeth Mrema, que mostrou, através de estudos realizados em diversas regiões do Planeta, os impactos preocupantes causados pelo aquecimento global sobre a diversidade biológica, afetando a vida de organismos das mais diversas espécies, especialmente os pássaros migratórios, os peixes e diversos mamíferos.

No final da tarde, ilustrando de forma chocante os efeitos das mudanças climáticas, o paquistanês Parvez Hassan, ex-presidente da Comissão Mundial de Direito Ambiental e atual presidente da Associação Ambiental do Paquistão, falou sobre o desastre ambiental que deixou imersa uma área de 160 mil quilômetros quadrados em seu país. A inundação provocou a morte de cerca de duas mil pessoas e deixou mais de um milhão de pessoas desabrigadas. “Os seres humanos de hoje precisam cuidar do seu futuro, para que não sejam cometidos de novo os mesmos erros que nós cometemos”, disse ele.

Para encerrar os debates do dia, o embaixador Paulino Franco de Carvalho Neto, chefe da Divisão de Meio Ambiente do Itamaraty, fez um breve histórico das posições do Brasil nas negociações internacionais iniciadas pela ONU em 1972, em Estocolmo, destacando que nesse período o país saiu de uma visão desenvolvimentista, segundo a qual “era importante crescer a qualquer preço”, para uma posição de destaque no cenário internacional, pelas suas propostas preservacionistas e de defesa do meio ambiente.

Envolverde


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