Produto sustentável: se não vender, não é sustentável

Data: 06/10/2010

Produto sustentável: se não vender, não é sustentável



Carlos Nomoto é Colunista de Plurale (*)

Recentemente encontrei com um empresário que estava trazendo para o Brasil um produto a base de água para limpeza de superfícies. O principal diferencial apresentado era o fato de ser um “produto verde”.

Perguntei se ele tinha um plano de negócios. Não tinha. Perguntei sobre o preço final do produto ao consumidor. Cerca de quatro vezes mais caro do que os produtos mais usados no mercado.


Ou seja, o produto não tinha uma estratégia comercial definida e custava bem mais caro do que os concorrentes. Quando perguntei por que alguém compraria o seu produto recebi a seguinte resposta: porque as pessoas estão cada vez mais preocupadas com o meio ambiente.


Alguns ainda cultivam um certo misticismo em torno da sustentabilidade. É só embalar de verde que vende.


E não vende. Se não garantir o essencial de qualquer produto – preço, qualidade e disponibilidade – não haverá foto de criancinha com uma plantinha na mão que fará vender.


Pesquisas realizadas pelo Instituto Akatu revelam que vem aumentando a quantidade de consumidores que associam a sustentabilidade às marcas das empresas e seus produtos, mas poucos estão dispostos a pagar a mais por isso.


E deveriam? Ou ainda, quanto a mais estariam dispostos a pagar?


Uma coisa é pagar R$ 2,00 a mais por um pacote de folhas de papel A4 reciclado ou certificado. Outra é pagar R$ 20.000,00 a mais por um automóvel com motor híbrido. O questionamento é imediato: vale a pena? Talvez, se ficar claro para o comprador que os custos com combustível e manutenção serão menores e o preço de revenda será melhor.


Uma grande construtora implementa sistemas de reuso de água em seus condomínios e projeta os apartamentos de forma que aproveitem mais a luz natural. Como transformar estas facilidades em argumentos para os corretores nos estandes de vendas? Criando uma planilha que mostre a redução dos custos de condomínio ao longo dos anos. Isso não garante uma venda, mas é um argumento a mais se o preço de outro apartamento for o mesmo.


Se queremos ( e queremos ! ) que a sustentabilidade permeie os processos e produtos das empresas precisamos ir para os pontos de venda.


Vi um dos melhores exemplos de aplicação da sustentabilidade em pontos de vendas em um pequeno mercado na zona central de Chicago.


Eis que deparo com uns pães frescos acompanhados da seguinte informação: produzido por panificadoras locais. Encontro algumas variedades de iogurte comuns ao lado muitas de iogurte produzido com leite orgânico, fat free, enriquecidos com vitaminas. Encontro a mesma distribuição na prateleira de batatas fritas: as marcas convencionais lado a lado de muitas opções a partir de batatas orgânicas, fritas ao óleo de amendoim, de girassol. E uma bela seleção das deliciosas cervejas locais, bem perto dos sucos sem conservantes.


Para encerrar as compras, os atendentes do caixa ficam em pé, bem próximos fisicamente de você, até com uma certa informalidade, o que torna a toda a experiência bastante agradável.
Saí de lá encantando e voltei outras vezes. Por quê?


Porque todos são acolhidos. Se você come “tranqueiras” e não se importa muito com a condição de fabricação e matéria prima do que vai comer ou beber, encontrará algumas opções. Se você prefere alimentos mais naturais encontrará muitas opções. Se você bebe ou é abstêmio encontrará o seu líquido preferido.


Porque dá ao consumidor a opção de decidir colocando tudo lado a lado, na mesma prateleira. Você compara o preço e o benefício: por que não experimentar algo diferente hoje, como um pacote de biscoitos carbon free? Dar opções, permitir as comparações é uma forma de educar e estimular o consumidor.


Porque o cuidado não está somente nos produtos mas se estende ao atendimento. Adiantaria pouco uma boa seleção de produtos fair trade e carbon free sem funcionários simpáticos e eficientes. Seria até contraditório.


Pergunta final: os produtos sustentáveis eram mais caros neste mercado? Sim, alguns eram, outros não. Mas eles eram oferecidos de tal forma que dava vontade de comprar. E de vender.

(*) Carlos Nomoto (carlos.nomoto@santander.com.br), colunista de Plurale, é Superintendente Executivo do Banco Santander e professor da Fundação Getúlio Vargas.

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