Mudanças climáticas: muitas perguntas sem resposta

Data: 20/09/2010
Uma das maiores autoridades mundiais da chamada Ecologia Humana, que estuda a interação entre as populações humanas e o ambiente físico, o antropólogo Emilio Moran afirma que a interdisciplinaridade será a melhor ferramenta para responder todas as perguntas com relação às mudanças climáticas e sobre o futuro da humanidade.

Outro ponto fundamental será encontrar as perguntas que ainda não foram abordadas da forma ideal para que possamos nos adaptar para as alterações no nosso modo de vida que com certeza virão nas próximas décadas. Já que segundo o pesquisador, a busca pelas respostas é tão importante quanto as respostas em si.

Moran esteve em Florianópolis para participar do 1º Seminário de Sociologia da Saúde e Ecologia Humana na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Sua palestra foi centrada nas mudanças climáticas e em como ainda falta integração aos diversos campos de estudo para que entendamos melhor esse fenômeno.

“O aquecimento global é real e está acelerando”, deixa claro desde o começo o antropólogo e atual diretor do Centro Antropológico para Treinamento e Pesquisa em Mudanças Ambientais Globais da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos.

Segundo Moran, os efeitos das mudanças climáticas na biosfera vão bem além do clima e já podem ser presenciados no cotidiano.

“Os próprios modelos do INPE prevêem um aquecimento na temperatura média no Brasil de 2ºC a 5ºC nos próximos 30 anos. Já vemos com mais freqüência eventos extremos, como secas e tempestades, assim como já temos dados concretos e alarmantes sobre a concentração do dióxido de carbono, de acidez dos oceanos e de mudanças no ciclo do nitrogênio”, disse o pesquisador.

A própria questão dos milhares de focos de queimadas que estamos vendo seria um sinal de alterações no clima. Para Moran, apesar de obviamente possuirmos um melhor monitoramento hoje em dia das queimadas, o que justificaria a percepção de que seu número estaria aumentando, existem algumas mudanças que são inegáveis.

“Quando estive pela primeira vez na Amazônia nos anos 1970, os agricultores queimavam suas terras e sabiam que o fogo não iria se espalhar muito porque a própria mata úmida da floresta iria freá-lo. Hoje isso não é mais uma certeza, o fogo adentra pela floresta, que está cada vez mais seca pela mudança nos regimes de chuva, e foge do controle com muita facilidade”, explicou.

Perguntas e Respostas

“É preciso antes de tudo saber que perguntas devem ser respondidas e então perceber qual a melhor maneira de tratar essas perguntas. Na maioria das vezes a resposta não está nessa ou naquela disciplina e sim no conjunto de conhecimentos de uma equipe de pesquisadores diversificada”, afirmou.

O grupo de trabalho do Antropólogo costuma seguir a regra de manter a mente aberta a novas possibilidades. “Eu costumo dizer para minha equipe: Quando você entrar por aquela porta para uma reunião, deixe suas ferramentas e armas, seus métodos e suas teorias lá fora. Depois que definimos a pergunta científica, procuraremos a ferramenta mais adequada para respondê-la, sem nos preocupar com quem trouxe a ferramenta”, disse Moran.

Além da interdisciplinaridade, o antropólogo alerta que faltam incentivos e recursos para que mais áreas do conhecimento venham a trabalhar com as mudanças climáticas e que também são escassos os meios que promovam o intercâmbio dessas informações.

“Apesar de nos últimos anos o INPE ter melhorado sua capacidade de monitoramento climático, ela ainda não é a ideal. Também existem poucos fóruns regionais de discussões e ferramentas de apoio governamental para pesquisas”, resume.

Há tempo, mas não muito

No geral, o antropólogo é otimista e afirma que ainda temos algo como 50 anos para agir e assim reduzir os piores impactos das mudanças climáticas. Mas alerta que as conseqüências das alterações no clima não são lineares, isto é, não vão piorando aos poucos e sim podem entrar em processos irreversíveis de uma hora para a outra.

O pesquisador usou o exemplo do Pacífico Norte, que em 1977 passou por uma grande transformação nos padrões da temperatura da superfície do mar que foi denominado de “Great Pacific Climate Shift”. Subitamente águas mais quentes substituíram as águas mais frias que tinham predominado nas três décadas anteriores junto à costa oeste da América do Norte e o leste do Pacífico Equatorial, causando diversos impactos para as espécies e para a pesca.

“O mesmo pode acontecer com outros ecossistemas, inclusive com a Amazônia. Se o desmatamento continuar e se somar às mudanças do clima, vamos chegar em um momento, que não está distante, em que a floresta nunca mais se recuperará. Depois desse ponto, mesmo se ampliarmos as áreas de preservação, a floresta não se regenerará, apenas voltará como uma vegetação de cerrado ou savana”, finalizou.

(Instituto Carbono Brasil)



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