Mudança climática deve piorar desigualdade de renda no país
Até 2020, as transformações que a agricultura do Brasil deve sofre com as mudanças climáticas vão contribuir para diminuir o produto interno bruto (PIB) em 0,29% e piorar a desigualdade de renda. É o que mostra uma simulação feita pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, pelo economista Gustavo de Moraes.
O pesquisador estudou o assunto durante seu doutorado na Esalq, orientado pelo professor Joaquim Ferreira Filho. Moraes se baseou em previsões da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) sobre a perda de áreas de cultivo de produtos agrícolas com grande importância econômica: soja, cana de açúcar, milho, café, arroz, feijão, mandioca e algodão. A Embrapa baseou-se em seis cenários de mudanças climáticas, propostos pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), da Organização das Nações Unidas (ONU).
O economista escolheu dois cenários um deles previa mudanças brandas até 2020 e perda pequena em terras aráveis. Outro previa aumentos mais graves de temperatura até 2070 e perdas maiores de terras aptas para produção agrícola. Com os dados, ele alimentou um modelo econômico uma série de equações que mostra como a perdas na agricultura impactam os outros setores da economia.
A minha pesquisa avalia apenas os impactos na economia dos efeitos das mudanças climáticas na agricultura, diz Moraes. Mas as mudanças também terão efeitos sobre a saúde, o clima das cidades litorâneas e eventos climáticos extremos [como furacões e enchentes">. Por isso, a conta pode aumentar.
Segundo o estudo, as perdas econômicas acontecem de forma desigual: o PIB do Nordeste em 2020 será 4% menor do que seria caso não houvesse mudança climática. Já o Sudeste teria um aumento de 0,83%. No centro-oeste, a queda é de 2,9%, concentrada nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
Para 2070, a pesquisa mostra uma queda do PIB brasileiro em 1,1%. No nordeste, a queda seria 6,13%, o aumento seria de 0,36%.
O nordeste e as regiões produtoras de soja do centro-oeste devem perder dinheiro por que estão em regiões tropicais e, portanto, mais sujeitas às mudanças climáticas. O modelo prevê, por exemplo, que o preço de produção da soja aumente 36% no Mato Grosso e 60% no Mato Grosso do Sul.
Com isso, investimentos destinados à agricultura e trabalhadores da lavoura tendem a migrar para o Distrito Federal e estados do sul e sudeste, onde os setores de indústria e serviços são mais consolidados. Com crédito e salários baixos, os bens produzidos por esses setores devem ficar mais baratos.
O modelo também prevê aumento dos custos de produção de alimentos que acontece de forma desigual no país. Um exemplo: o cenário de 2020 prevê aumento no custo de produção do arroz em 36% no Maranhão, quarto maior produtor do país. Mas o custo não se altera no maior produtor, o Rio Grande do Sul.
O pesquisador também explica que simulações como esta são boas para prever tendências, mas não para apontar dados exatos. Além disso, é impossível prever com exatidão o comportamento dos agentes da economia apenas apontar o mais provável.
Concentração de renda
As transformações da agricultura vão contribuir para aumentar o custo de vida dos mais pobres e diminuir o dos mais ricos. O motivo: o preço dos alimentos, que vai sofrer alta, corresponde a uma proporção maior do orçamento dos mais pobres. Já para os mais ricos, a maior parte do dinheiro é direcionada a serviços e bens industriais, cujos preços devem diminuir.
A previsão do modelo é que no nordeste em 2020 , por exemplo, o custo de vida das famílias que ganham entre 3 e 5 salários mínimos aumente 1,19%. O das famílias que ganham de 20 a 30 salários mínimos deve diminuir 0,35%. Já no sudeste, por exemplo, o aumento é de 0,08% para as famílias de menor renda e a queda, de 0,18% para famílias mais ricas.
Já o cenário de 2070 prevê para o nordeste aumento do custo de vida de 1,85% para os mais pobres e queda de 0,18% do custo dos mais ricos.
O pesquisador explica que para se antecipar às mudanças a economia do nordeste deve passar a depender menos da agricultura e mais dos serviços e indústria. Como são cenários climáticos de longo prazo, os planejadores de políticas públicas podem prepara-se para eles, acrescenta Moraes.
As previsões do modelo para o Brasil repetem as transformações em escala global, diz o economista. Alguns países industrializados e temperados devem se beneficiar, enquanto países mais pobres de clima quente vão perder.
Mercado Ético
< voltar