Bons ventos da Espanha

Data: 19/07/2010

Bons ventos da Espanha




Por Clarinha Glock*




As energias eólica e solar na América Latina são um negócio atraente para empresas espanholas.

Barcelona, Espanha, 19 de julho (Terramérica).- Acossados pela recessão e por cortes de subsídios na Espanha, empresários deste país apostam em encontrar no Sol e nos ventos latino-americanos seus futuros lucros. Em 2009, as firmas da Associação Empresarial Eólica, com sede em Madri, atingiram 1.274 megawatts (MW) instalados na América Latina. Na cabeça, o México, com 650 MW, seguido de Brasil e Chile. Os planos preveem incursões na Argentina, com 700 MW, Peru, com 110 MW e Venezuela, com 100 MW, além de maiores investimentos no Brasil e no México.

“Um recente estudo indica que, até 2025, os investimentos poderiam chegar a 46 mil MW instalados” na América Latina, disse ao Terramérica o diretor de políticas energéticas da Associação, Heikki Willstedt Mesa. As empresas fazem aposta de longo prazo, esperando alta nas cotações dos certificados outorgados no contexto do Protocolo de Kyoto contra a mudança climática, vigente desde 2005, que deverão fazer parte de um novo acordo internacional para combater o aquecimento do clima. Trata-se de um mecanismo de mercado para promover o desenvolvimento de energias limpas, que não geram gases-estufa.

O custo da energia eólica é determinado pela quantidade anual de horas de vento nas quais a geração funciona com sua potência nominal, ou “fator de carga”, explicou Heikki. Se o fator de carga é superior a 30%, o custo da geração pode ficar entre US$ 60 e US$ 70 por MW/hora (MWh). “Com estes custos, quase todos os países poderiam competir com técnicas convencionais como o petróleo”, disse Heikki.

Para que os parques eólicos sejam mais rentáveis, na Espanha foram criados subsídios, chamados de “primas”, que pagam o MW gerado com uma fonte limpa acima do preço de mercado. Na Espanha, o setor de energias renováveis recebe estas primas, pois sua produção não gera dióxido de carbono, o principal gás-estufa, nem outros contaminantes. Este subsídio, em vigor desde 1994, tem sua fonte em um fundo que capta os recursos diretamente das tarifas pagas pelos usuários e os transfere às empresas geradoras.

“Mesmo com os ajustes decorrentes da crise econômica, estes investimentos serão mantidos, já que a Espanha é um dos líderes mundiais em energias renováveis, não apenas por potência instalada, mas pela indústria já estabelecida”, afirmou Heikki. A Espanha conta com um polo industrial eólico. Entre as 240 empresas filiadas à Associação, existem desde fornecedores de peças até fabricantes de geradores e construtores de parques, distribuídas por todo o território. A potência eólica instalada chega a 19 mil MW na Espanha, e no ano passado abastecia 13,5% da demanda nacional. Já o total na União Europeia chega a 74 mil MW, equivalente a um investimento entre US$ 113 bilhões e US$ 126 bilhões.

O objetivo da UE é que dentro de uma década as fontes renováveis gerem 230 mil MW. Contudo, as autoridades espanholas estudam um novo contexto regulatório para o setor energético, que incluiria cortes nas primas para as empresas de tecnologia limpa e nos subsídios para fontes contaminantes, como o carvão. Nesse contexto, a energia solar também olha para a América Latina. Este ano, as empresas espanholas T-Solar e Solarpack assumiram a produção e venda de 173 gigawatts/hora (GWh) anuais de energia fotovoltaica, licitados pelo governo do Peru.

O plano compreende quatro unidades com potência individual de 20 MW que deverão estar funcionando antes de 30 de junho de 2012, com investimento total de US$ 250 milhões. A T-Solar vai promover e explorar duas e as demais estarão a cargo de um consórcio formado com a Solarpack. O contrato, assinado em março com o Organismo Supervisor do Investimento em Energia e Mineração (Osinergim), estabelece que as centrais fotovoltaicas fiquem nas regiões de Tacna, Arequipa e Moquegua, no extremo sul do Peru.

A grande radiação solar nessa área, com média anual de 2.300 quilowatts/hora por metro quadrado, foi determinante para a escolha do Peru, explicou ao Terramérica o diretor de negócios internacionais da T-Solar, Enrique Barbudo. Outro elemento de atração são as condições do contrato de 20 anos: o sistema elétrico nacional comprará toda a eletricidade gerada a um preço de venda garantido, e com revisão anual. Além disso, o Peru é um dos países com maior crescimento econômico da região. A produção de energia duplicou nos últimos 14 anos, segundo a Sociedade Nacional de Mineração, Petróleo e Energia, e espera-se que neste ano a demanda elétrica cresça 6%.

As autoridades se propõem a fazer com que as fontes renováveis forneçam 1.314 GWh anuais de eletricidade até 2012. Desse total, a tecnologia solar participará com 181 GWh, a de biomassa com 813 GWh e a de vento com 320 GWh. A Solarpack está presente no Chile, Estados Unidos e França. A T-Solar se estendeu à França, Itália e Índia e explora novos projetos no Brasil, Chile e México.

Por outro lado, na Espanha as incertezas sobram. “Estamos desenvolvendo o que já tínhamos em andamento, e esperando que fique claro o contexto regulatório futuro para tomar decisões”, disse o diretor da T-Solar. As primas espanholas foram adotadas para se chegar a 2020 fornecendo 20% da eletricidade com fontes renováveis, um objetivo da União Europeia. Entretanto, isso dependerá de diferentes fatores, segundo Heikki. Por exemplo, o montante dos subsídios, o cumprimento do propósito do bloco de abater em 20% as emissões de dióxido de carbono até 2020, ou mesmo de aumentar para 30%, e o comportamento dos preços do petróleo, gás e carvão, afirmou.

* A autora é correspondente da IPS.




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