Humanização de problemas ambientais para influenciar mudanças de comportamento

Data: 29/06/2010

Humanização de problemas ambientais para influenciar mudanças de comportamento


Felipe Pritsch Goettems.

O problema ambiental das mudanças climáticas é freqüentemente visto como um desafio tecnológico ou de conscientização ecológica. Prova disto são os crescentes dispêndios de P&D em tecnologias limpas e o aumento dos movimentos ambientais centrados na premissa de que mudanças comportamentais se iniciam com mudanças de atitude e conhecimento - ou seja, educação.

Há duas premissas falhas (ou pelo menos incertas) nestas duas soluções propostas: a primeira é que o avanço tecnológico permitirá o aumento crescente e infinito do consumo de bens e serviços enquanto que os recursos naturais são sabidamente finitos; a segunda é que defende que a consciência das pessoas se traduz em ações, mesmo que psicólogos e economistas sociais mostrem, há mais de meio século, que a função de previsibilidade de comportamento baseada em atitude e conhecimento é, na melhor das hipóteses, limitada.

Não se questiona aqui a importância do desenvolvimento tecnológico, porém, como mostrou Annie Jia em artigo do The New York Times, "o entendimento da mente humana pode salvar o mundo do CO2".

O mais grave problema das políticas ambientais é assumir a premissa de que sempre nos comportamos de forma a maximizar nossos benefícios no longo prazo, como sugere o modelo do Homo Economicus, sugerido pela Teoria dos Jogos.

A economia clássica falha em explicar como muitas vezes não nos comportamos de forma a maximizar nosso interesse mesmo nas presenças de informação qualificada, estrutura e incentivos (motivação) para o uso dessa informação. Caso assim o fosse, não teríamos profissionais das áreas médicas sofrendo de doenças crônicas e controláveis como a obesidade, pois poucos são os grupos sociais com maior presença destas três condições descritas.

Diante deste cenário o administrador público tem duas possibilidades: ou bem ele admite que as pessoas tomam atitudes não-racionais (alguns diriam estúpidas) e resigna-se com isso, ou bem ele desenha soluções que prevêem momentos em que nossos comportamentos não são otimizados de acordo com nosso melhor interesse. Para que isso ocorra, ele deve primeiro ter claro que seu papel é de influenciar as pessoas: diminuir "maus comportamentos" (ex: direção alcoolizada) e aumentar "bons comportamentos" (ex: reciclagem).

Todo nosso sistema legal, tributário e regulador é fonte de influência do administrador público, porém, como sabemos, esses sistemas estão bem aquém de serem perfeitos na alteração de nosso comportamento. Sem entrar nas problemáticas locais destes sistemas (ex: corrupção), economistas e psicólogos sociais diriam que muitos deles são inadequados em si mesmos; haveria formas mais eficientes (e de menor "dor") para moldar os comportamentos ambientalmente corretos, principalmente nos nossos momentos de não-racionalidade.

Essas formas derivam do entendimento sobre os dois sistemas de distintos de raciocínio que operam no cérebro humano: o sistema reflexivo tem capacidade analítica profunda e consciente, porém exige muito esforço e energia; o sistema automático é inconsciente e superficial, porém é ágil e de pouco esforço (ele se utiliza de atalhos mentais evolutivos). Estes comportamentos automáticos são prevalentes na maioria das ações humanas porque não temos tempo, energia ou capacidade para reconhecer e analisar todos os aspectos em cada pessoa, evento, e situação que encontramos em um único dia.

Na prática, um mix de processos reflexivos e automáticos governa nosso agir. Administradores públicos que queiram influenciar comportamentos devem entender como as pessoas usam estes diferentes sistemas e como eles afetam suas decisões, já que valores, crenças, reconhecimento de conseqüências, aceitação de responsabilidade, e normas pessoais representam meros 35% da variação de comportamentos pró-ambientais.
Políticas públicas relacionadas com nossas respostas automáticas oferecem o potencial de melhorar o bem estar individual e social. São inúmeros os exemplos de ações que utilizam este entendimento para desenhar soluções eficazes. Mostro aqui uma delas.

O princípio das Normas Sociais que "opera" em nosso sistema automático faz com que determinemos a correta forma de agir através do modo com que outras pessoas se comportam. Isso ocorre mais fortemente quando estamos observando o comportamento de pessoas similares a nós, e quando estamos incertos sobre qual comportamento adequado a se seguir.

Este "dispositivo evolutivo" das Normas Sociais (tendência de ver uma ação como mais apropriada quando outros a fazem) normalmente funciona muito bem. Como regra, faremos menos equívocos por agir em conformidade com evidências sociais do que contrariamente a elas.

O estudo das relações humanas e o conhecimento dos caminhos evolutivos da mente podem nos inspirar e ensinar sobre o design de soluções ambientais.

Temos que encontrar uma maneira de atender nossas necessidades como espécie e, ao mesmo tempo, manter este lugar habitável e prazeroso não somente para nossos filhos e netos, mas para as próximas 10 mil (1) gerações a partir deles.

Qualquer número abaixo deste nos colocaria como "seres inferiores" na escala evolutiva, ainda mais se considerarmos a possibilidade da auto-extinção.

O quão não-racional (eu diria estúpido) é isso?

Temos que encontrar uma maneira de fazer as coisas fantásticas que fazemos e ao mesmo tempo cuidar do lugar que cuidará dos nossos descendentes.

Já é muito tarde para sermos pessimistas.


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