Participação de energias renováveis cresce no país, mas não indica preocupação ambiental

Data: 14/06/2010

Participação de energias renováveis cresce no país, mas não indica preocupação ambiental


As fontes renováveis representaram 47,3% de toda a energia produzida no Brasil em 2009, divulgou o Ministério de Minas e Energia (MME) no Balanço Energético Nacional (BEN). Segundo o relatório, este foi o maior índice registrado desde 1992, quando a lenha e o carvão vegetal foram as principais fontes utilizadas para a produção de energia no país. No entanto, o crescimento apontado pelo estudo produzido pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) do MME não tem relação com o aumento da conscientização ambiental.

De acordo com o BEN, a crise econômica, que reduziu a procura por carvão por parte do setor siderúrgico, e o aumento das chuvas, que facilitou a geração de energia em hidrelétricas, contribuíram significativamente para o crescimento do uso de fontes renováveis de energia. Diante desse cenário, o presidente da Associação Brasileira de Energias Renováveis e Meio Ambiente (Abeama), Ruberval Baldini, não considera positivo o resultado apresentado pelo BEN.
“O relatório aponta o aumento do uso da cana-de-açúcar e da água na produção de energia – responsáveis, respectivamente, por 18,1% e 15,3% da matriz energética do país. Não vejo motivos para comemorar esse resultado. O Brasil precisa investir em fontes alternativas, como as energias eólica e solar, que agridem muito menos o meio ambiente”, disse.

Ainda segundo Baldini, o BEN não prevê o aumento da produção de energia solar no país nos próximos 20 anos, enquanto o resto do mundo já investe nesse tipo de energia alternativa a largos passos. “Isso acontece por falta de desejo político, porque temos potencial mais do que suficiente para investir nas energias solar e eólica. O Brasil possui fortes ventos em sua costa e é o segundo país com maior índice de insolação do mundo, perdendo, apenas, para o Saara, na África”, afirmou.

MONOPÓLIO - O BEN apontou, ainda, que o petróleo representa 38% da matriz energética brasileira. O dado apenas reforça uma tendência mundial, já que o recurso não-renovável é responsável por cerca de 87% da produção de energia do planeta.

Diante dessa grande demanda, recentemente, empresas petrolíferas começaram a investir em pesquisas que possibilitam a extração do petróleo a partir de uma nova fonte, a camada do pré-sal.

No entanto, a iniciativa inibirá ainda mais o investimento em fontes alternativas de energia, na opinião de Rubens Born, presidente da ONG Vitae Civilis, que atua em prol do desenvolvimento sustentável. “Ao investir em novas formas de extração de petróleo, daremos continuidade ao monopólio desse recurso não-renovável. Isso porque, se o ofereço em abundância, os agentes econômicos não vão estar interessados em procurar fontes alternativas de energia”, disse Born.

A Petrobras – principal petrolífera do Brasil –, no entanto, informou por e-mail que as empresas desse setor não pretendem desestimular a produção energética a partir de fontes alternativas. A intenção das companhias é buscar no pré-sal uma maneira de suprir a demanda mundial que já existe.

Durante a Conferência Internacional Ethos, que aconteceu na cidade de São Paulo no mês de maio, o presidente da Petrobras, José Gabrielli, chegou a afirmar que pesquisas realizadas pela empresa mostram que, sem o pré-sal, haverá uma queda significativa na produção de petróleo até o ano de 2030, enquanto a demanda pelo recurso não-renovável aumentará consideravelmente. Sendo assim, o pré-sal seria uma alternativa necessária para que, no futuro, não falte energia no mundo.

Para o consultor técnico em meio ambiente, Ivan Marcelo Neves, que atua como secretário executivo do Instituto Socioambiental da Baía da Ilha Grande (Isabi), a sociedade não deve condenar a busca por novas alternativas de extração do petróleo.

“Num espaço curto de tempo, não há como desconsiderar a utilização desse recurso natural, pois foi criada uma dependência econômica e tecnológica desta atividade para promover os benefícios necessários à humanidade. Teremos que arcar com os bônus e, certamente, com os ônus desta atividade recém descoberta na camada do pré-sal”, disse.

SUSTENTABILIDADE - Com a intenção de agregar valor sustentável à extração de petróleo, o Governo Federal propôs mudanças no marco regulatório para o pré-sal, entre as quais destaca-se a criação do Fundo Social. A intenção da nova medida, que ainda está tramitando no Congresso, é garantir que parte dos lucros obtidos com a extração desse tipo de petróleo seja destinada para o investimento, a longo prazo, na educação, cultura, meio ambiente e ciência e tecnologia.

Marcelo Neves julga a iniciativa positiva, mas acredita que a pressão da sociedade é fundamental para que o Fundo Social seja implantado com sucesso. “O texto do novo marco regulatório promete contribuir para o desenvolvimento das energias alternativas, mas sabemos que, na prática, tudo funciona lentamente e, por isso, o acompanhamento da sociedade será de extrema importância nessa conquista”, afirmou o secretário executivo do Isabi.

Já para Rubens Born, o Fundo Social não merece elogios, por mais que traga benefícios a longo prazo para o país. Na opinião do presidente do Vitae Civilis, a medida faz com que questões muito mais importantes, como as emissões brasileiras de CO2, sejam deixadas de lado. “O governo planeja ações que agregam sustentabilidade a um modelo de economia baseado no petróleo – e, portanto, insustentável e altamente poluente –, como se em 30 anos não precisássemos reduzir drasticamente nossas emissões, por conta de um acordo climático global. As prioridades estão erradas. Discutir o pré-sal, agora, é de uma irresponsabilidade política muito grande”, afirmou.

Born admite que vivemos em um modelo social que, realmente, incentiva o uso do petróleo para os mais variados fins, mas acredita que, exatamente por isso, é tão importante que o governo crie, desde já, políticas públicas que apontem para a transição para uma economia de baixo carbono. O presidente da Abeama, Ruberval Baldini, concorda. “Hoje o petróleo domina a matriz energética mundial, mas no século XIX o monopólio era do carvão. Ninguém imaginava que esse cenário mudaria, até apostarem no petróleo. Acredito que, se o governo criar políticas públicas de incentivo e, em resposta, a sociedade começar a mudar seus hábitos, a energia solar poderá deter o monopólio energético do século XXI”, disse.

Para saber mais sobre o Fundo Social, que promete investir no desenvolvimento sustentável do país a partir dos lucros da extração de pré-sal, ouça podcast abaixo com o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Marcelo Piancastelli.

Portal do Meio Ambiente


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