O significado da pegada de carbono

Data: 07/06/2010

O significado da pegada de carbono



Ivar A. Baste, para a Revista ECO 21

Exatamente 1.7 milhões de toneladas de dióxido de carbono. Este é o volume acumulado dos gases de Efeito Estufa (GEE) emitidos pela ONU em 2008, segundo uma pesquisa feita em resposta à determinação do Secretário Geral da ONU, Ban Ki-moon, para promover a neutralidade climática do maior órgão internacional do mundo. Esse ambicioso exercício, coordenado pelo Environment Management Group (Grupo de Administração Ambiental - EMG), foi apresentado pelo Diretor Executivo do PNUMA e Presidente da EMG, Achim Steiner, durante a COP-15 da Convenção sobre Mudanças Climáticas, no ano passado, em Copenhague. Mas por que uma pegada de carbono de 1.7 milhões de toneladas importa tanto quando esse número representa apenas 1,5% do total da pegada de carbono da cidade de Nova York, local sede da ONU?

A redução dessa pegada é importante, em primeiro lugar, porque representa que a ONU está determinada em liderar o movimento dando o exemplo e sendo parte da solução climática. Ainda por cima, todo e qualquer esforço ajuda a desacelerar o aquecimento global que, junto às outras forças de mudanças climáticas, aparece como uma ameaça sem precedentes ao bem-estar e à saúde do ser humano, especialmente aos pobres e grupos mais vulneráveis da sociedade. No cerne do desafio encontramos uma única e complexa escala de interação entre homo sapiens e seu meio ambiente - uma interação que é movida pela crescente globalização, industrialização e interconexão de sociedades abastecidas pela expansão do mercado, serviços, capital, pessoas, tecnologias, informação, ideias e trabalho. A solução da sociedade é, primeiramente, internalizar os riscos - como os das mudanças climáticas - e as oportunidades - como os serviços derivados do ecossistema - e torná-los em processos sociais e econômicos. Os prognósticos têm sido o Calcanhar de Aquiles dos esforços até agora, impedindo o progresso. O sistema da ONU, como fórum primário de cooperação em diferentes esferas, é, também, com todos seus órgãos especializados, fundos e programas, um amplo fórum de cooperação setorial. Portanto a redução da pegada de carbono tem sim importância, pois demonstra o que pode se atingir através da cooperação de quase 50 instituições da ONU e entidades de Bretton Woods, cada qual com suas especializações e perspectivas, com a percepção mútua de que é possível, sim, alcançar a neutralidade climática.

A constatação da pegada de carbono foi resultado de um árduo inventário feito no sistema da ONU, caminho na direção de uma ONU neutra com os esforços para reduzi-la. Em sua própria proporção, o processo ilustra os obstáculos que podemos nos deparar quando enfrentamos a tarefa de frear as mudanças climáticas. Foi necessário desenvolver e entrar num acordo quanto a uma metodologia comum de cálculo das emissões de GEE para poder agregar e comparar dados, assim como também foi necessário desenvolver uma meta para redução das emissões. Para identificar as emissões das viagens aéreas, que representam 50% do total da pegada de carbono da ONU, foi necessário coletar milhares de dados. Para ajudar a solucionar a questão, a Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO), órgão da ONU responsável pela aviação civil internacional, desenvolveu uma calculadora de carbono personalizada para a ONU. Coincidentemente, o Departamento de Apoio no Campo (Department for Field Support) da ONU - cujas operações de preservação da paz geram cerca de 60% da pegada de carbono da mesma - ajudou a desenvolver uma calculadora para outras fontes de emissão.

A redução da pegada é, em certo sentido, o marco de um espírito renovado de cooperação ambiental no nível da interatividade e um exemplo prático da reforma da ONU. As lições e reduções dos custos gerados pelo trabalho conjunto na Organização incentivaram a evolução no sentido da sustentabilidade das formas de administração mais amplas. Trabalhos conjuntos também estão sendo elaborados sobre temas como a degradação de terras, o Ano da Biodiversidade e a Economia Verde - um desafio que está na agenda da ONU para Conferência do Rio de Janeiro, em 2012. O espírito revigorado da cooperação chamou a atenção dos governos que na 11ª Sessão Especial do Conselho Governamental do PNUMA pediram contribuições da EMG no que diz respeito à consulta ministerial de uma ampla reforma da governança do sistema ambiental internacional.

Na agenda da reforma se encontra a necessidade de avançar na cooperação inter-agências da ONU. O esforço mútuo da “pegada climática” da ONU fornece importantes conselhos sobre como isto pode ser atingido. Respeito, confiança, atuação, informação, tecnologia e uma economia de escala, são os ingredientes centrais da receita da cooperação. Nas quantidades certas, eles podem ajudar a gerar eficiência institucional, recuperação, inovação e a adaptabilidade necessária para se enfrentar as mudanças climáticas.

Concluindo, instituições internacionais públicas como a ONU precisam ajudar a criar as condições necessárias em diversos setores para permitir que o setor privado, os lares e os indivíduos possam reduzir as suas próprias pegadas de carbono. A experiência da ONU no assunto poderia servir como um plano de ação para que os governos e as multinacionais o adotem, possibilitando a transição para um mundo eficiente com menores índices de emissão de carbono, e para uma economia verde digna do Século 21.

*Ivar A. Baste é diretor do Secretariado do Environment Management Group (EMG) PNUMA


(Revista Eco 21)





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