Proteger o Danúbio é construir estradas
A estratégia que a União Europeia (UE) prepara este ano para desenvolver a bacia do Rio Danúbio é uma prova de fogo para a viabilidade de um crescimento verde no leste da Europa, carente de infraestrutra. A Comissão Europeia, órgão executivo da UE, redige a iniciativa com os governos dos países cujas populações estão relacionadas com o Rio, para promover um desenvolvimento sustentável da bacia. O Danúbio é o segundo maior rio da Europa. Nasce na Alemanha e morre no Mar Negro, em um delta compartilhado por Romênia e Ucrânia.
Os países envolvidos na estratégia da UE são Alemanha, Áustria, Bósnia-Herzegovina, Bulgária, Croácia, Eslováquia, Eslovênia, Hungria, Montenegro, Moldávia, República Checa, Romênia, Sérvia e Ucrânia. O primeiro-ministro búlgaro, Boïco Borisov, em uma conferência sobre a estratégia da UE, realizada no dia 10 deste mês em Ruse, deixou claro que para ele a iniciativa significa construir estradas. A estratégia se baseia em três objetivos interligados: desenvolvimento socioeconômico; melhoria do transporte; apoio às possibilidades energéticas e proteção ao meio ambiente.
Estima-se que é uma das primeiras provas reais do conceito de crescimento verde, promovido pela UE como elemento central de sua estratégia de desenvolvimento, Europa 2020. O bloco não criará novos instrumentos financeiros para os países da região do Danúbio, e vai ajudar os novos membros no uso dos fundos de desenvolvimento disponíveis. Está previsto que o dinheiro seja utilizado para melhorar a navegação do rio, coordenar redes elétricas regionais, prevenir inundações e criar áreas protegidas. Também ajudará a criar novas fontes de trabalho bem como preservar o emprego no setor pesqueiro e na agricultura de pequena escala, em perigo devido à crescente contaminação do Danúbio e suas áreas ribeirinhas.
Há 100 bilhões de euros (US$ 122 bilhões) disponíveis para melhorar a bacia do Danúbio e é preciso começar a trabalhar, disse na mesma ocasião, o comissário europeu para Políticas Regionais, Johannes Hahn. Apenas 6% dos fundos que a UE destina à assistência técnica dos novos membros foram outorgados aos beneficiários, disse Hahn. A iniciativa do bloco pode ser uma ajuda necessária para as comunidades locais e para as organizações não governamentais interessadas em preservar a biosfera, a agricultura orgânica e de pequena escala e o turismo ecológico e cultural.
Falta meio ano para que a Comissão Europeia acabe a redação da estratégia e os governos da Europa oriental parecem dar um apoio superficial aos objetivos ambientais e à participação das organizações não governamentais. Contudo, o primeiro-ministro búlgaro deixou bem claras as prioridades de seu governo. A Bulgária tem apenas entre oito e nove milhões de habitantes, e muitas pessoas morrem em acidentes de trânsito porque as estradas têm entre 10 e 15 anos, disse Borisov, anfitrião da conferência de Ruse.
Temos de aproveitar a solidariedade europeia para o que não podemos fazer por nossa conta, prosseguiu o primeiro-ministro. A Grécia recebeu 110 bilhões de euros (US$ 135 bilhões), nós pedimos apenas um bilhão de euros (US$ 1,2 bilhão) para salvar vidas. A Bulgária já sofreu muito. Creio que merecemos poder usar esses fundos de forma adequada, acrescentou. As declarações de Borisov coincidem perfeitamente com as prioridades apresentadas pela Bulgária à Comissão Europeia. Sua proposta contém três vezes mais projetos de infraestrutura para o transporte do que para a área ambiental.
Entre as necessidades identificadas por esse país, está a construção de uma perimetral ao redor da capital Sofia e de cinco estradas. Por outro lado, as propostas ambientais são vagas, como formar uma associação para tomar medidas conjuntas com a Romênia contra a mudança climática ou implementar soluções para proteger as espécies vegetais e animais em perigo. A ênfase em melhorar a infraestrutura de transportes não é exclusiva da Bulgária, sendo típica dos novos membros da União Europeia, disse Irene Lucius, do programa Cárpatos-Danúbio, do Fundo Mundial para a Natureza (WWF).
Os três objetivos da estratégia não estão integrados, insistiu Lucius. Os principais assuntos são o transporte e a navegação do Danúbio, por pressão de interesses comerciais e do governo. Corre-se o risco de perder a oportunidade que a UE oferece para incentivar o desenvolvimento sustentável, acrescentou. A navegação do Danúbio é importante, mas temos de ter cuidado sobre como se promove e o papel que terá na comparação com as vias férreas, insistiu Lucius.
A navegação fluvial pode ser considerada uma alternativa viável ao transporte rodoviário apenas se forem consideradas as emissões de dióxido de carbono e as consequências locais, sobre o ecossistema do rio, alertou uma coalizão de organizações não governamentais, entre as quais a WWF. Os projetos de navegação, que exigem a regulamentação do uso do leito e da margem do rio, afetam os múltiplos serviços que os rios oferecem à sociedade, como água potável, controle das inundações, filtro natural contra a contaminação e apoio à pesca sustentável, argumenta a coalizão, em uma carta publicada no final de 2009.
O Danúbio dá de beber a dez milhões de pessoas. Estima-se que a contaminação e a má gestão dos rios destruíram cerca de 80% dos pântanos e das terras alagáveis da região do Danúbio no último século, com graves consequências negativas sobre a pesca, o controle de inundações e a purificação da água. As organizações não governamentais poderiam contribuir para solucionar esses problemas, mas não podem fazê-lo porque em países como Bulgária e Romênia têm pouquíssimo peso político, ao contrário do que ocorre na Europa ocidental e até nas nações do Báltico, afirmou Lucius. IPS/Envolverde
(IPS/Envolverde)
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