Poder local reclama participação

Data: 23/04/2010

Poder local reclama participação


Os governos locais reivindicaram seu decisivo papel na luta contra os efeitos das alterações climáticas e pediram maior participação nas decisões e nos fundos para a mitigação e adaptação, ao término, ontem, na capital uruguaia, da 3ª Cúpula Mundial de Regiões sobre Mudança Climática. A declaração final e outras resoluções do encontro de três dias serão apresentadas na 16ª Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP-16), em novembro, no México.

“Se os 120 chefes de Estado não são capazes de chegar a um acordo, nós continuaremos trabalhando na luta contra a mudança climática, com vínhamos fazendo antes de Copenhague”, onde aconteceu a fracassada COP-15, disse à IPS Frederic Ximeno, diretor-geral de Políticas Ambientais e Sustentabilidade da Catalunha, na Espanha. “Se de cima para baixo não há acordo e soluções, então deverá haver de baixo para cima”, disse no encontro impulsionado pela Rede de Governos Regionais pelo Desenvolvimento Sustentável (nrg4SD).

O encontro foi organizado pelo Congresso de Intendentes (que reúne os governantes departamentais) do Uruguai, apoiado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), e contou com meio milhar de especialistas e autoridades de governos locais e regionais de 25 países, que debateram sobre seu papel na luta contra a mudança climática. Todos concordaram que a adaptação e mitigação com relação ao fenômeno ambiental devem nascer nos próprios territórios.

O copresidente da Rede, Alfredo Boné, disse que o papel dos municípios e das regiões é transcendental por um objetivo: “somos os que mais conhecem nosso território e porque podemos definir e implementar de forma mais eficaz as soluções mais adequadas a cada momento e a cada problema”. As “regiões também são um instrumento eficaz para organizar as bases de um novo modelo de desenvolvimento que necessariamente tem de ser sustentável”, acrescentou o também conselheiro de Meio Ambiente de outra região espanhola, Aragon.

Segundo Ximeno, para a redução de gases-estufa é preciso, entre outras coisas, mudanças na mobilidade, na forma de construir e de utilizar a energia e praticar a agricultura, ações concretas que muitas vezes são feitas em nível local. “Pedimos que esta responsabilidade seja reconhecida e que tenhamos nossa voz nos fóruns internacionais. Se somos responsáveis pelas soluções, queremos ter a capacidade de contribuir com nosso conhecimento e estar presentes nas discussões”, afirmou.

Para Paul Carrasco, presidente da Organização Latino-Americana de Governos Intermeios, “muito se discutiu sobre os processos globais que podem permitir melhor mitigação e adaptação, mas pouca atenção se dá ao que os países em desenvolvimento estão realizando”.

O desafio para a América Latina, disse à IPS, é que os governos reconheçam as autoridades subnacionais como atores fundamentais na luta contra a variabilidade climática, quando atualmente ocorre somente em alguns países como Brasil, Argentina e México, com um nível de descentralização e autonomia superior aos demais países da região. “É preciso implementar propostas e pressionar para que isto seja possível”, disse o também prefeito da província de Azuay, no Equador.

Fernando Rei, presidente da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo e copresidente da nrg4SD, disse à IPS que “não há tempo para esperar a mudança internacional, que está demorando muito. Copenhague não chegou aonde queríamos e não estamos seguros de poder avançar no México. Entretanto, estamos obtendo resultados mensuráveis, muito mais efetivos do que os governos nacionais”, afirmou.

Durante a cúpula de Montevidéu destacaram-se algumas experiências realizadas em diversas regiões do mundo. Na Espanha, por exemplo, suas 17 comunidades autônomas propuseram à União Europeia a promoção e o incentivo dos planos de mitigação e adaptação, que muitas delas já começaram a executar. O governo do Estado de São Paulo destinou US$ 400 milhões para financiar empresas que queiram reduzir suas emissões de gases-estufa.

Por sua vez, o governador da província argentina de Buenos Aires, Daniel Scioli, mencionou a criação de um organismo de desenvolvimento sustentável em sua região, que inclui entre outras medidas um programa provincial de reflorestamento, um plano de geração de biodiesel a partir de óleo vegetal usado e outro de geração de biogás a partir de resíduos. Do Uruguai destacou-se o projeto-piloto de adaptação e mitigação à mudança climática implementado em sua Região Metropolitana, que se estende por três departamentos e tem apoio do Pnud, como parte do Projeto Mudança Climática territorial.

O projeto, iniciado em meados de 2009, já conseguiu coletar dados sobre diferentes vulnerabilidades do território, entre elas as da área costeira e dos recursos hídricos. Também foi iniciado um estudo sobre a emissão de gases-estufa nesta região, onde é produzida a maior parte do dióxido de carbono emitido no país. Uma iniciativa semelhante começará a ser implementada em regiões da Argélia, Colômbia, Nicarágua e Peru, conforme foi informado durante o encontro.

A representante residente da Organização das Nações Unidas no Uruguai, Susan McDade, considerou que, embora este país não contribua significativamente com emissões de gases-estufa, os impactos da mudança climática são evidentes em seu território. Por seu lado, o presidente do Uruguai, José Mujica, disse, na abertura da cúpula, que “estamos diante de um tema de caráter dramático, um dilema histórico de profundidades que ainda não avistamos. O problema não é apenas a mudança climática, está sendo questionado nosso modelo de civilização”, afirmou. IPS/Envolverde



(IPS/Envolverde)


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