Política energética traz impactos desiguais por região

Data: 11/03/2010

Política energética traz impactos desiguais por região


Desde 2004, as tarifas da energia elétrica têm sido mais caras nas regiões menos desenvolvidas do País, em contraste com os preços baixos nas regiões mais desenvolvidas. Essas diferenças podem causar impactos negativos para a economia brasileira, como avalia Gervásio Ferreira dos Santos, pesquisador e professor do Departamento de Economia da Universidade Federal da Bahia (UFBA). “O regime tarifário em vigor pode gerar alguns desequilíbrios regionais. No caso dos grandes consumidores, pode haver, no longo prazo, deslocamento de atividade produtiva para as regiões com tarifas mais baixas.”


A desigualdade regional nos preços da energia elétrica afeta a economia brasileiraEm sua tese de doutorado apresentada na Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, sob a orientação do professor da FEA Eduardo Haddad, Ferreira analisou o histórico da política tarifária do setor elétrico brasileiro, do início da década de 1990 até 2008, e quais efeitos a atual política pode trazer para a economia a longo prazo, considerando as características espaciais da economia brasileira.

Atualmente, a governo faz um reajuste de preços com base no índice de preços, o IGP-M. Porém, a cada quatro anos, está havendo uma revisão tarifária com base na eficiência das empresas distribuidoras de energia elétrica. Nessa revisão, ocorre a transferência de ganhos de produtividade das empresas aos consumidores finais, que se concretiza no menor reajuste tarifário. O professor da UFBA aponta que essa política é boa porque promove a busca pela maior eficiência por parte das empresas.

Por outro lado, as características espaciais da economia brasileira podem implicar no aprofundamento da desigualdade tarifária entre as regiões. “A possibilidade de maiores ganhos de escala pelas distribuidoras das regiões mais desenvolvidas do País são muito maiores. A densidade de carga de uma empresa distribuidora que atende grandes regiões metropolitanas da região Sudeste ou Sul é muito maior do que a de uma empresa que atende nas regiões Norte ou Nordeste, por exemplo. Ou seja, com uma menor estrutura produtiva, uma empresa consegue vender a mesma quantidade de energia nas regiões mais desenvolvidas”, explica Ferreira.

Dos efeitos para economia brasileira num momento futuro, o professor diz que tanto as regiões mais pobres podem ser afetadas, com possíveis entraves na renda e no bem-estar da população local, como as regiões que hoje se beneficiam com essa política, pois prejudica a relação comercial entre elas: “Em um sistema interregional existe perdedores e ganhadores. No caso específico da elevação no preço da energia elétrica, predomina a existência de uma quantidade maior de perdedores”, conclui Ferreira.

Para realizar essa análise, o professor construiu um modelo Interregional de Equilíbrio Geral Computável de grande escala, com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) da USP e do Núcleo de Economia Regional e Urbana (NEREUS), também da USP.

Histórico
Apesar do desequilíbrio provocado pela política tarifária atual, o professor acredita que o modelo vigente é melhor que o antigo, no qual as tarifas entre os estados eram equalizadas pelo governo federal. Esta política perdurou até o início da década de 1990 e, segundo Ferreira, ela mantinha um preço equalizado de forma forçada e não estimulava a eficiência da distribuição da eletricidade.

Já no início da década de 1990, a partir das reformas iniciados no governo de Fernando Henrique Cardoso, houve um estágio de privatização das empresas que distribuem energia elétrica. Sob uma nova organização industrial para o setor elétrico, o modelo estimulou que as empresas privadas passassem a competir entre si. Além disso, para regular o serviço, o governo introduz uma nova política tarifária que seria coordenada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).

Em 1995, as regiões menos desenvolvidas apresentavam tarifas mais elevadas. No entanto, após o processo de privatização, as tarifas começam a convergir, o que fez com que entre 2003 e 2004 houvesse uma aproximação entre os estados brasileiros. A partir de 2004, volta a ter uma desigualdade tarifária, com os estados mais pobres pagando mais caro, e em 2008 se acentua esse desequilíbrio.

Ferreira acredita que é possível contornar esse problema. Ele dá créditos para a diversificação energética nas regiões mais pobres como uma maneira de reduzir a dependência de energia elétrica e diminuir os preços ao longo prazo. O professor lembra que estados como os do Norte e do Nordeste têm pouca variedade de energia quando comparados ao Sul e Sudeste.

Mas essa é somente uma sugestão. Ferreira frisa que a política continua boa, ainda que seja necessário ser revista.

do Plurale / Agência USP


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