México: Áreas verdes pela melhor oferta

Data: 23/02/2010

México: Áreas verdes pela melhor oferta


Enquanto o desmatamento ameaça a saúde ambiental do México, a cessão de áreas públicas para empresas se converteu em uma prática que acentua o dano ecológico, afirmam ativistas. O caso mais recente da temporada de dádivas é a intenção do governo do Estado de Nuevo León de entregar 26 hectares vizinhos à floresta urbana La Pastora à produtora de refrigerantes e cerveja Fomento Econômico Mexicano-Heineken (Femsa), para construção de um estádio de futebol com capacidade para 50 mil espectadores.

O plano do governo desse Estado, que fica 900 quilômetros a nordeste da capital mexicana, gerou rejeição por parte de grupos ecológicos, que se preparam para uma batalha política e legal de longa duração. “Há uma política de entrega de espaços públicos às empresas. O estádio vai contaminar a floresta. Não nos opomos ao projeto, mas podem buscar um local onde o meio ambiente não seja prejudicado”, disse à IPS Denise Alamillo, integrante do Coletivo Cidadão em Defesa de La Pastora, uma rede de organizações não governamentais.

Em setembro, o consórcio Femsa e o então governador José Natividad González, do Partido Revolucionário Institucional (PRI) anunciaram a construção do estádio dentro de um projeto chamado Grande Parque Ecológico La Pastora, no município de Guadalupe, com investimento de US$ 200 milhões. A Femsa receberia o terreno em comodato por 60 anos e, ao fim desse prazo, a obra passaria ao poder do Estado. O sucessor e correligionário de González, Rodrigo Medina, não mudou a postura quando assumiu o cargo em outubro.

Em La Pastora vivem cerca de 70 espécies animais e dezenas de variedades vegetais. A floresta fica próxima ao Rio La Silla, considerado o único vivo dessa zona. O Coletivo critica o tamanho da área necessária para a obra, que será utilizada pela equipe Rayados de Monterrey, atual campeão do futebol mexicano, se comparada com o Estádio Azteca da capital mexicana, erguido em uma área de seis hectares e com capacidade para 105 mil espectadores.

Os ambientalistas parecem ter anotado um gol a favor, com a decisão, no dia 11, da Procuradoria Federal de Proteção Ambiental (Profepa) de fechar a área para trabalhos de inspeção. Mas essa medida não os deixou tranquilos. “O governo estatal deu muita ênfase em seu apoio à construção. Não acreditamos na suspensão da Profepa, porque não passa de uma multa”, disse Allamillo.

O estudo de impacto ambiental, elaborado por uma consultoria a pedido da Femsa-Heineken e entregue às autoridades ambientais do Estado, reconhece 46 impactos adversos e apenas oito benéficos sobre o meio ambiente derivados da construção. “Será alterada a vegetação, a mesma que será removida do local, bem como o solo que será coberto pela construção do projeto”, diz o extenso documento, que também menciona o plantio de 1.068 árvores e 19.250 metros quadrados de jardins.

De acordo com as leis gerais do Equilíbrio Ecológico e a Proteção do Meio Ambiente e de Desenvolvimento Florestal Sustentável, as empresas devem apresentar estudos técnicos e de impacto ambiental junto ao Ministério do Meio Ambiente e de Recursos Naturais (Semarnat). “As cidades continuam crescendo e as áreas naturais diminuindo”, disse à IPS o porta-voz do não governamental Conselho Civil Mexicano para a Silvicultura Sustentável, Ivan Zúñiga.

Por sua vez, a empresa estima que o fechamento da área “se soma a uma série de fatos alheios ao nosso controle, que colocam em xeque a continuidade de nossa participação no projeto até que as condições, que não estão em nosso âmbito gerar, o permitam”, diz um comunicado. Em seu recente informe “Objetivos de Desenvolvimento do Milênio: avanços na sustentabilidade ambiental do desenvolvimento na América Latina e no Caribe”, a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) alerta para o avanço do desmatamento na região.

América Latina e Caribe perderam cerca de 69 milhões de hectares – quase 7%, o dobro da média mundial – de superfície florestal entre 1990 e 2005, segundo esta agência vinculada à Organização das Nações Unidas. No México, onde são desmatados anualmente aproximadamente 500 mil hectares, existem 173 áreas naturais equivalentes a mais de 25 milhões de hectares, entre as quais 67 parques nacionais, 40 reservas da biosfera e 35 zonas de proteção de flora e fauna, segundo dados da Comissão Nacional de Áreas Naturais Protegidas.

“Os estudos que vi por parte da empresa, e a própria explicação que me foi dada pela Secretaria de Desenvolvimento Sustentável, é que há muito cuidado com o entorno, que é um projeto sustentável e benéfico para o município”, justificou aos jornalistas o governador Medina. A Comissão de Desenvolvimento Urbano do Poder Legislativo de Nuevo León decidiu realizar um estudo independente para conhecer a magnitude dos efeitos ambientais da obra.

“O local foi escolhido com base na disponibilidade da área, acessibilidade, dimensões e oferta de serviços, levando em conta que a área está em uma região urbanizada e não afetará nenhum ecossistema”, diz o estudo da Femsa, que em janeiro passado vendeu seu negócio cervejeiro para a holandesa Heineken por US$ 7,347 bilhões. “Não é bem entendida a importância de manter áreas de resguardo para zonas ambientais. E não são avaliadas as consequências quando ocorrem desastres naturais e outros problemas”, disse Zúñiga.

Em outro caso, o governo do Estado de Sinaloa planeja um complexo que inclui hoteis, dois campos de golfe e duas marinas em uma área próxima de mangues e que, segundo organizações ecologistas, não atende aos padrões ambientais. “Temos de vigiar para que Estados e municípios cuidem dos espaços naturais”, disse à imprensa o titular da Semarnat, Juan Elvira, a propósito da situação ambiental do país. IPS/Envolverde



(IPS/Envolverde)


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