Ciência: Jovens ainda não conseguem ocupar seu espaço

Data: 29/01/2010

Ciência: Jovens ainda não conseguem ocupar seu espaço


“Lhes faltam cabelos brancos”, argumentou o dirigente de uma sociedade latino-americana ao obstruir o acesso à direção da instituição de um jovem colega premiado pelos avanços que proporcionou à ciência médica. É um exemplo da disputa de poder entre gerações no mundo cientifico, disse Israel Veja, pesquisador argentino que participou do encontro de jovens cientistas promovido pela Academia de Ciências do Mundo em Desenvolvimento (TWAS), durante sua conferência geral realizada em Angra dos Reis (RJ).

Pela primeira vez, esta organização incorporou a reunião juvenil em suas conferências que têm lugar a cada três anos. São encontros entre cientistas com menos de 40 anos da região onde ocorre o encontro e de uma área do conhecimento diferente em cada oportunidade. Vinte e nove pesquisadores de sete países latino-americanos, selecionados entre mais de 130 inscritos, inauguraram essa atividade apresentando seus estudos de forma oral ou por meio de cartazes, todos no campo das ciências biológicas. O encontro se repetirá com jovens cientistas da Ásia central e meridional no Paquistão, onde acontecerá a próxima conferência geral da TWAS.

Os latino-americanos reconheceram a importância desta iniciativa, mas alguns criticaram a “falta de comunicação” e a rígida separação entre os membros da TWAS, em grande parte de cabelos brancos, e os jovens, com se fosse diferente a ciência que produzem. “Somente dois ou três” veteranos da Academia estiveram presentes nas palestras do grupo juvenil, queixou-se uma das jovens. Os conflitos entre gerações sobre poder no mundo acadêmico e nas associações cientificas tendem a se acentuar com a rapidez dos avanços nesse setor e do surgimento de “novas fronteiras” do conhecimento nas quais os jovens costumam ter protagonismo, disse Veja à IPS. O sistema acadêmico é “muito hierárquico”, disse uma de suas colegas.

Veja apresentou em um pôster seu estudo sobre o uso de uma cianobactéria (um tipo de bactéria gramnegativa) que evoluiu durante milhões de anos como bioindicadora da contaminação metálica da água, uma descoberta que exigiu análises genéticas. Sua compatriota Victoria Mendizábal se preocupa com a declinante atenção dada pelos “países centrais” à atividade cientifica na América Latina e no Caribe, diante da prioridade concedida à África em termos de ajuda e cooperação, em resposta ao menor desenvolvimento desse continente.

Na Academia Mundial de Jovens Cientistas (Ways), por exemplo, há uma sub-representação proporcional dos latino-americanos, disse Mendizábal, que é dirigente regional dessa instituição criada formalmente em 2003 na Hungria. Isso se repete em outras organizações internacionais. Entre os efeitos negativos da “promoção” da América Latina e do Caribe a região que já não necessita tanto apoio das nações centrais estão reduzindo as bolsas e a ajuda a determinados projetos e a exclusão de seus estudantes e pesquisadores do sistema de “subsídios para reinserção ao voltar ao país de origem”, explicou à IPS.

Para superar essas desvantagens, Mendizábal e alguns colegas seus começaram a discutir formas de exercer pressão sobre as instâncias internacionais em defesa de uma maior presença latino-americana nos fóruns científicos e da manutenção da cooperação dos países ricos. A América Latina não é homogênea, há países muito pobres, como Paraguai e Suriname, e pobreza endêmica inclusive nos países de maior desenvolvimento relativo, com Brasil e Argentina, lembrou-se no encontro.

Além disso, se trata de uma região de imensos recursos naturais e grande biodiversidade, que exigem intensa pesquisa cientifica, acrescentou Mendizábel, que levou a Angra dos Reis um estudo sobre “os dois lados” dos cannabinóides, substâncias psicoativas conhecidas por serem extraídas da planta da maconha (Cannabis sativa). Se essas substâncias geram o vicio, por um lado, por outro bloqueiam receptores no cérebro, o que lhes dá a possibilidade de servir no tratamento de viciados em outras drogas, com a cocaína, explicou a cientista argentina. Outra relcamação dos jovens é sobre a necessidade de facilitar a importação de equipamentos e materiais de pesquisa, como os reagentes. São produtos indispensáveis, sem produção nacional e cuja compra no exterior é muito cara e complicada por causa da burocracia, queixou-se o brasileiro Stevens Rehen.



(Envolverde/ IPS)


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