China, EUA e União Europeia são decisivos

Data: 07/12/2009

China, EUA e União Europeia são decisivos


A partir de segunda feira, 07 de dezembro, todo o planeta estará de olho na capital dinamarquesa, Copenhagen, onde mais de 90 líderes mundiais e representantes de 192 países se reúnem para definir um novo acordo global sobre clima. A ANDI conversou com Eduardo Viola, professor titular do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília e um dos maiores especialistas em negociações climáticas do país, a respeito do cenário do jogo político às vésperas do encontro e das perspectivas sobre o resultado final da COP-15

ANDI - China e Estados Unidos anunciaram recentemente metas de redução de emissões. O que isso representa para as negociações da COP-15?

Eduardo Viola - Os anúncios criaram uma perspectiva mais positiva em relação à construção de um novo acordo global do que as que tínhamos há um ou dois meses , mas isso não significa que as propostas sejam expressivas. apesar da iniciativa norte-americana ser politicamente importante, está muito longe do que a ciência exige dos países desenvolvidos.
Os Estados unidos diminuiriam apenas 3% das emissões em relação ao ano base de 1990, enquanto isso a união européia propõe 20% - e o painel intergovernamental sobre mudanças climáticas (IPCC) afirma que essas reduções devem estar entre 25 a 40%.
Já as metas chinesas permitem um crescimento das emissões, ou seja, diminuir a intensidade de carbono em 45% até 2020 em relação a 2005, como proposto pelo governo da china, significa que na prática o país só vai alcançar seu pico de emissões em 2025 ou 2030.

ANDI - Dos países que oficializaram propostas de redução de emissões, quais os mais significativos?

EV – A União Europeia (UE) e o Japão, que se dispuseram a oferecer metas mais próximas das ideais, com redução de 20% a 25% das emissões em 2020 para o ano base de 1990.
Já as nações com renda média apresentaram números mais ousados, mesmo não sendo obrigadas pelo Protocolo de Quioto. Mas veja bem, quando estou falando de renda média, estou falando de México, África do Sul, Brasil, China, Coreia do Sul, e não a Índia ou a Indonésia que são países pobres.
A Coreia inclusive tem um plano de redução com objetivos claros e consistentes. Já o programa brasileiro tem ainda algumas falhas, principalmente na questão do cálculo de metas para 2020.

ANDI - Então apesar do questionamento internacional, a Índia não tem a mesma responsabilidade de redução de suas emissões em comparação com o Brasil, por exemplo?

EV – O problema da Índia é diferente, pois o país tem uma contribuição bem menor para o aquecimento do planeta se comparado a outras nações de renda média. Isso porque suas emissões de carbono per capita são muito baixas. Entretanto, mesmo tendo espaço ainda para crescer economicamente, deveria pelo menos apresentar um planejamento de emissões para alcançar seu desenvolvimento sem se tornar mais intensiva em carbono, mas seus governantes já afirmaram inúmeras vezes que isso não os interessa.
É importante deixar claro que para as nações emergentes o ponto fundamental não é a redução de emissões. São os países ricos que devem fazer isso. O que se pede daqueles com renda média é que a curva de crescimento das emissões seja bem menor que no passado, e que eles cheguem ao topo dessa curva antes de 2018 ou 2020, para depois começar a reduzir a liberação de carbono na atmosfera.

ANDI - Apesar da União Europeia liderar os acordos para implementação das metas, os países do leste europeu se consideram de renda média e não querem aceitar essa imposição. Qual a real responsabilidade dessas nações?

EV – Na UE, o Reino Unido é o único país cujas reduções de emissão de gases de efeito estufa estarão próxomas ao patamar exigido pelo IPCC. Já os países como Hungria, Polônia e Romênia não podem reclamar, pois passaram por um intenso período de industrialização até 1990 e possuíam uma economia hiper intensiva em carbono, principalmente porque eram ineficientes energeticamente. A União Europeia já se posicionou sobre essa questão, exigindo que essas nações assumam metas de redução.
Esses países tinham rendas per capitas altíssimas naquela época devido a essa grande industrialização, e devem fazer algo.

ANDI - E as metas de redução de emissões apresentadas pelo Brasil, são significativas?

EV – São significativas, mas não sabemos ainda se são extraordinárias. Precisamos conhecer um pouco mais da metodologia que baseou a meta de redução entre 36,1% a 38,9% apresentados pelo governo brasileiro. Esses números foram calculados de última hora, porque houve uma lógica eleitoral por trás do anúncio.
Posso dizer que o presidente Lula se sentiu acuado. O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, aproveitou a candidatura da senadora Marina Silva à presidência da república para pressionar o governo a anunciar metas.
Mas mesmo que esse planejamento tenha sido apresentado com atraso, o país tem hoje a segunda meta mais expressiva fora do Anexo I, depois da Coreia do Sul.

ANDI - Vamos falar um pouco mais sobre a China. Apesar das metas tímidas anunciadas, ela já vem implementando um Plano Nacional de Mudanças Climáticas, principalmente na área de eficiência energética. Isso é um avanço?

EV – A China está instituindo uma política energética e climática extremamente renovada e isso é muito importante, pois significa que o país está assumindo a intenção de transitar para uma economia de baixo carbono.
Então temos uma nação que há três anos era um império da poluição e hoje está investindo maciçamente em eficiência energética e no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – o que é uma virada radical se levarmos em consideração que nos últimos oito anos, dois terços de toda a emissão de carbono do planeta veio do território chinês. Mas mesmo com essas mudanças ainda há muita coisa a ser feita, principalmente na estabilização das emissões chinesas até 2020, no máximo.

ANDI - Com todos esses anúncios, principalmente os da China e dos Estados Unidos, é possível se chegar ao tão esperado acordo global sobre clima?

EV – O pacto global depende de três países: China, Estados Unidos e União Européia (que atua como bloco nas negociações), por serem os maiores emissores. São eles que definirão os rumos das definições em Copenhagen. Mesmo que o objetivo das Nações Unidas seja alcançar um consenso entre os mais de 190 países que assinaram a Convenção do Clima - e com um número tão grande de interesses, acabar decidindo pelo mínimo denominador comum - é necessário que essas três nações concordem entre si. Se não, não há espaço para acordo. Inclusive, o Protocolo de Quioto foi ineficiente porque apenas uma delas participou (União Europeia).

ANDI - Alguns especialistas afirmam que um novo acordo global sobre clima deveria ser discutido dentro do G20, grupo que concentra os maiores emissores de carbono do planeta e também que possui mais recursos para financiar as ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Diante do que você explicou, essa seria a melhor solução?

EV – Concordo com essa visão, pois como disse, um plano multilateral não é eficiente, porque em uma negociação com 192 países, não se atinge um consenso ambicioso. E a grande maioria dessas nações é irrelevante do ponto de vista das emissões e não podem apresentar soluções. Portanto, é lógico que o âmbito mais claro e consistente para se alcançar um acordo forte é o Fórum do G20.
Podemos destacar dentro do grupo três níveis de países, o primeiro são aqueles decisivos, cruciais: EUA, China e Estados da União Europeia. A China tem 23% das emissões, os EUA 20% e a UE 15%. Para um acordo funcionar é necessário um acordo entre esses três.
Em seguida, nós temos um segundo estrato de emissores relevantes, que inclui Rússia, Índia, Brasil, Japão, Indonésia e México.
Depois temos um terceiro estrato, que engloba mais uns dez países, como a Coreia do Sul, África do Sul, Nigéria, Irã, Arábia Saudita, Tailândia, Egito, Turquia e Ucrânia.

ANDI - O que você espera das negociações da COP-15?

EV – Não sei bem o que vai acontecer, mas posso dizer que espero uma longa e difícil negociação por pelo menos mais um ano, infelizmente. Será muito difícil termos um acordo fechado na COP-15. O eixo principal, que diz respeito às metas de redução de emissões, está longe de ser resolvido e isso trava os acordos sobre outros temas.
Posso dizer que gostaria de ver um avanço em dois pontos. O primeiro é o do financiamento de ações de mitigação e adaptação dos países pobres, que sofrerão muito as conseqüências dos efeitos climáticos. Mas é importante ressaltar que falo de nações realmente pobres, como Bolívia, Bangladesh, Peru, não daquelas de renda média, como Brasil e China.
O outro tópico é a transferência de tecnologia, que só tem sido defendida pela Suécia. Para que os países em desenvolvimento atinjam uma economia de baixo carbono, é preciso que os ricos cedam de forma menos custosa os direitos de propriedade intelectual de tecnologias limpas.



(Envolverde/ANDI Mudanças Climáticas)




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