EUA: O verde impulso das algas

Data: 01/12/2009

EUA: O verde impulso das algas


Stephen Mayfield, novo diretor do Centro de San Diego para a Biotecnologia de Algas, da Universidade da Califórnia, lidera um enorme desafio: dar à luz uma indústria de energia alternativa. Alguns dizem que a magnitude histórica de extrair combustível das algas equipara-se à do Projeto Manhattan (tentativa dos aliados de fabricar uma bomba atômica antes da Alemanha nazista, durante a Segunda Guerra Mundial – 1939/45) por sua promessa de satisfazer de modo sustentável a demanda mundial de combustível para transporte. Após anos de inatividade no setor dos biocarbonetos, a corrida se centra em produzir “petróleo verde”.

Para conseguir este objetivo, um punhado de cientistas e investidores de risco está disposto a apostar nisto, na crença de que na sujeira dos tanques se esconde um brilhante futuro verde. Uma idéia que há uma década parecia absurda agora ganha créditos, enquanto fica mais claro do que nunca que as fontes alternativas de combustíveis serão necessárias para mitigar os efeitos do aquecimento global e para atender as futuras demandas energéticas. Em 2008 os Estados Unidos consumiram 140 bilhões de galões (530 bilhões de litros) de combustível para transporte. Em todo o mundo, esse número passou dos 320 bilhões de galões (1,2 trilhão de litros).

Mayfield vislumbra que um dia as algas produzirão em grande escala, tanto nos Estados Unidos como em outros países. Embora à capacidade das nações produtoras de petróleo de atender as futuras demandas de energia seja alvo de disputa, os especialistas em energia reconhecem que há vários fatores que guiam o renovado interesse nos combustíveis alternativos. Entre cientistas, corporações e políticos existe um amplo consenso quanto a conflito, mudança climática e política serem uma combinação volátil. “Não estamos no Iraque porque Al Qaeda (a rede islâmica extremista) esteve ali, mas porque o petróleo está ali”, disse Mayfield.

O especialista explicou que ele e seus colegas perceberam que tinham de trabalhar quando o preço da gasolina aumentou para US$ 4,00 o galão (quase quatro litros) nos Estados Unidos. Isto coincidiu com a advertência do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Mudança Climática sobre o quanto era imperativo reduzir as emissões de dióxido de carbono para impedir um colapso econômico e ambiental. Por não se querer desperdiçar uma boa crise energética, em 2008 foi criado o Centro de San Diego para a Biotecnologia de Algas. O laboratório foi projetado para aproveitar o potencial da indústria das algas sob os auspícios do Instituto Scripps de Oceanografia, Instituto Salk para os Estudos Biológicos e Universidade da Califórnia, em San Diego.

“O combustível extraído das algas é muito semelhante ao petróleo retirado do solo”, disse Mayfield. Os acadêmicos de San Diego não são distantes do setor empresarial. Junto com outros colegas da universidade, Mayfield entrou na indústria dos biocombustíveis há vários anos. É um dos membros fundadores da Sapphire Energy, uma empresa com capital de US$ 100 milhões procedentes da Fundação Bill e Melinda Gates, bem como de sócios investidores. Aglomeradas em torno da universidade há 15 incipientes empresas apostando em objetivos similares. “Precisamos estar todos dentro. O mundo consumirá tanta energia como jamais processamos”, afirmou Mayfield.

Exemplificando a correlação entre o produto interno bruto e o consumo de energia, ilustrou o aumento da demanda por combustível na medida em que as economias crescem. “A competição pela energia é insaciável”, afirmou o especialis5ta. A pesquisa sobre as algas atrai investidores por vários motivos. Onipresentes e de rápido crescimento, estes organismos unicelulares transformam a luz solar em lipídios, que, por sua vez, podem ser convertidos em combustíveis para transporte sem muita modificação. O biocombustível elaborado com algas desfere um forte golpe em seus rivais, já que rende 1.500 galões (cerca de 5,7 milhões de litros) de combustível por quase meio hectare, entre 50 e 70 vezes mais do que o etanol de milho.

Outro atrativo é que as algas se favorecem em águas turvas e inclusive salgadas, bem como em condições áridas. Isto tem o potencial de que os desertos e outras terras marginalizadas, consideradas inadequadas para a produção de alimentos, sejam usadas para instalar unidades de processamento de algas. Além disso, as algas absorvem carbono durante a fotossíntese, compensado o dióxido de carbono liberado durante a queima de combustível. Estudos preliminares sugerem que os combustíveis à base de algas produzem 60% menos dióxido de carbono do que o petróleo, tomando como referencia o ciclo vital dos dois produtos.

A desvantagem é o custo. A indústria do petróleo e do gás possui uma vantagem considerável em termos de economias de escala, no tocante à descoberta, produção e transporte de combustível aos mercados mundiais. Extrair petróleo do solo ainda é barato, se comparado com reinventar um modelo empresarial baseado nas algas. Os Estados Unidos já percorreram esse caminho. Entre 1978 e 1996, seu governo financiou pesquisas sobre as algas, com resultados variados. O Departamento de Energia acabou determinando que não se poderia produzir algas em quantidade suficiente, a um preço suficientemente baixo para competir com o petróleo.

Segundo Al Darzins, do Laboratório Nacional de Energia Renovável desse departamento, a redução do financiamento teve mais a ver com a queda do preço do petróleo do que com a viabilidade das algas. “Teria sido possível produzir um barril de combustível de algas durante esse período, custaria em torno de US$ 60 a US$ 80. Naturalmente, isso não podia competir com um barri de petróleo de US$ 20”, afirmou. Mas, devido às advertências sobre o aquecimento do planeta e às preocupações sobre segurança energética, agora as algas são objeto de um segundo olhar.

Os que defendem as energias limpas argumentam que no prazo de cinco a 10 anos existirá a tecnologia para produzir combustível à base de algas em grande quantidade. O Laboratório Nacional de Energia Renovável reinstaurou seu programa de pesquisas sobre algas em 2006. Atualmente, há no mundo cerca de 150 companhias dedicadas a esse tema. “Sou otimista quanto a isto poder mudar o jogo. Mas, também sou realista em dizer que em matéria de engenharia e biologia há muitos desafios que temos de resolver”, disse Darzins à IPS/IFEJ.

A estratégia do carbono da Califórnia talvez seja precursora da 15ª Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 15), que acontecerá de 7 a 18 de dezembro em Copenhague. Existe um mandato estadual de reduzir as emissões de dióxido de carbono, melhorar o rendimento do gás e incentivar projetos que utilizem tecnologias verdes. A lei desse Estado exige que, até 2010, as empresas privadas obtenham 20% de sua eletricidade a partir de fontes renováveis. Também se prevê que essa porcentagem aumente para 33% até 2020.

O cumprimento desses objetivos estimulou o desenvolvimento e os investimentos para obter tecnologias limpas. Em San Diego há 153 empresas dedicadas a cada aspecto do setor da energia renovável, desde a construção de automóveis elétricos à fabricação de paineis solares residenciais de baixo custo. Quando os políticos se reunirem na capital da Dinamarca no mês que vem buscarão maneiras de aliviar a dor que representa a transição para uma economia baixa em carbono. Pesquisar em tecnologias que possam cimentar o caminho para um futuro mais verde deveria ser uma delas. (IPS/Envolverde)

* Este artigo é parte integrante de uma série produzida pela IPS (Inter Press Service) e pela IFEJ (Federação Internacional de Jornalistas Ambientais) para a Aliança de Comunicadores para o Desenvolvimento Sustentável (www.complusalliance.org).



Foto:
Legenda: El biocombustible elaborado con algas asesta un fuerte golpe a sus rivales.
Crédito: Jonathan Eng/IPS



(Envolverde/IPS/IFEJ)


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