Seguros ambientais contra a mudança climática

Data: 30/11/2009

Seguros ambientais contra a mudança climática


Um seguro de risco compartilhado para catástrofes no Caribe poderia constituir-se em modelo de estratégia coletiva para enfrentar desastres naturais causados pela mudança climática, disse John Nash, principal economista do Banco Mundial para a América Latina e o Caribe. Nash foi um dos especialistas ouvidos pelo Terramérica para a elaboração do “Primeiro informe regional sobre mudança climática - América Latina diante dos efeitos irreversíveis de um planeta mais quente”, apresentado este mês em Montevidéu. A seguir um resumo dessa entrevista.

TERRAMÉRICA: Há planos regionais de contingência ou sistemas de alerta para abordar os eventos climáticos extremos na região?
JOHN NASH: Sob os auspícios do Banco Mundial, foi implementado o Seguro de Risco Compartilhado para Catástrofes no Caribe (CCRIF), que permitirá, aos países participantes da região, acesso imediato a dinheiro vivo se forem afetados por um furacão ou um terremoto. Compartilhar o risco permitirá aos 18 países participantes a economia de cerca de 40% do pagamento de seus prêmios individuais. Há trabalhos exploratórios para criar uma entidade semelhante para os países da América Central. Também trabalhamos com nações da região para criar ou melhorar seus sistemas de seguros agrícolas meteorológicos, e para desenvolver capacidades a fim de aliviar parte do risco nos mercados internacionais de resseguros, o que será útil para mitigar os impactos da variação nos padrões meteorológicos sobre a produção agrícola. Infelizmente, em vários países, a infraestrutura para controlar o estado do tempo se deteriorou com os anos. Isto terá de ser corrigido, o que exigirá investimentos e aprofundamento nos mercados locais de seguros.

TERRAMÉRICA: Há troca de informação, bases de dados compartilhadas ou ações conjuntas entre nações para uma adaptação precoce às manifestações mais sérias da mudança climática?
JN: Os exemplos mais claros são o CCRIF e o trabalho em curso para avaliar os riscos de catástrofes na América Central.

TERRAMÉRICA: Qual o impacto atual da mudança climática no setor agrícola e quais as medidas mais factíveis de adaptação e mitigação?
JN: Devido à variabilidade inerente à meteorologia é difícil atribuir à mudança climática os eventos específicos que hoje afetam a agricultura. Porém, está claro que, como a produtividade agrícola depende muito do estado do tempo, este será um dos setores mais afetados pela mudança climática. É provável que os impactos variem muito de uma região para outra, e algumas zonas temperadas, como o Cone Sul, podem experimentar um aumento em seus rendimentos com altas moderadas de temperatura. Porém, se estas continuarem subindo, a produtividade cairá inclusive nessas regiões. No longo prazo, as perdas de renda projetadas para 2100 na América Latina vão de 12%, em um cenário de mudança climática leve, a mais de 50%, em um contexto mais severo e apesar de os agricultores terem adotado medidas para minimizar o dano. As respostas necessárias para a adaptação serão específicas de cada lugar. Mas um estudo recente concluiu que os que integram contextos produtivos muito diferentes geralmente priorizam medidas similares: inovações tecnológicas, melhor manejo hídrico, melhores sistemas de informação climática e um sistema integrado dos recursos naturais e da produção. Para reduzir as emissões, a prioridade para a América Latina e o Caribe é diminuir o desmatamento e a degradação florestal, boa parte delas causada pela expansão das áreas agrícolas, que representam 46% das emissões da região. As oportunidades de mitigação incluem três categorias amplas. Primeiro, reduzir as emissões dos fluxos de dióxido de carbono, metano, dióxido de nitrogênio e outros gases estufa na agronomia, e um melhor manejo do gado. Em segundo lugar, apoiar o armazenamento de carbono nos solos ou nas coberturas vegetais, com medidas como cultivo de conservação e restauração de terras degradadas. Terceiro, deslocar emissões através de reservas de bioenergia e evitando cultivar novas terras hoje ocupadas por florestas ou outras coberturas vegetais.

TERRAMÉRICA: Alguma dessas medidas está sendo adotada?
JN: A maioria dos países está avaliando suas políticas. Alguns, como o México, estão em uma fase bastante avançada do desenvolvimento de uma estratégia operacional. Muitas organizações internacionais – entre elas Banco Mundial, Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, Banco Interamericano de Desenvolvimento – apoiam ativamente estes esforços. Quanto à adaptação agrícola, empresas privadas realizam muitas pesquisas para desenvolver tecnologias de produção e variedades de sementes resistentes ao calor e às secas. A rede internacional de pesquisa – os centros do Grupo Consultivo para a Pesquisa Agrícola Internacional – também está focando seu trabalho nesta área. Para reduzir as emissões derivadas do desmatamento, países como Brasil, Costa Rica e México assumem seus próprios esforços. Outros participam da Associação para o Carbono Florestal do Banco Mundial. Quanto a usar a agricultura para reduzir emissões, o Brasil é famoso por seu pioneirismo na produção sustentável de etanol a partir da cana-de-açúcar.

TERRAMÉRICA: Quais medidas a região deveria adotar para modificar o modelo energético a fim de mitigar a mudança climática?
JN: Reavaliar a expansão da energia hidrelétrica e tornar mais eficiente a geração e o uso da energia em geral. Incentivar a troca para técnicas mais econômicas, por exemplo, mediante normas como etiquetas de eficiência, padronização e promoção no setor industrial. Também é preciso melhorar os dois extremos da cadeia de oferta e demanda de energia.

* A autora é correspondente da IPS.

Crédito da imagem: Patricia da Cámara, gentileza Banco Mundial

Legenda: John Nash, economista do Banco Mundial para a América Latina e o Caribe.

LINKS

“Primeiro informe regional sobre mudança climática - América Latina diante dos efeitos irreversíveis de um planeta mais quente”, pdf em espanhol
http://www.tierramerica.info/docs/informe-cambio-climatico-2009.pdf

Uma febre que não cede
http://www.tierramerica.info/nota.php?lang=port&idnews=3325

Uruguai deve trabalhar em cooperação com países vizinhos
http://envolverde.ig.com.br/materia.php?cod=66194&edt=33

Entre a crise e a mudança climática
http://envolverde.ig.com.br/materia.php?cod=57512&edt=

Banco Mundial, em inglês, espanhol, francês
http://www.bancomundial.org/

Seguro de Risco para Catástrofes no Caribe, em inglês
http://ccrif.org/

Grupo Consultivo para a Pesquisa Agrícola Internacional, em inglês, espanhol, francês, alemão
http://www.cgiar.org/languages/lang-spanish.html

Associação para o Carbono Florestal, em inglês
http://www.forestcarbonpartnership.org/fcp/


Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.



(Envolverde/Terramérica)


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