Energia mimética

Data: 17/11/2009

Energia mimética


A eficiência energética em seres vivos geralmente combina a reciclagem de materiais e combustíveis e uma boa carona. Pássaros altaneiros, larvas de rios e até mesmo cães selvagens fazem uso de forças físicas seguras no intuito de sobreviver com o menor gasto de energia.

Muitos destes passeios tiram proveito de gradientes ou diferenças entre a distância. Gradientes de concentração são onipresentes nos sistemas vivos, desde gradientes de sódio e potássio em células, aos fatores de formatação-padrão em ecossistemas. Seja qual for a escala em que este fenômeno se manifeste, sua base começa no diminuto.

Existem alguns princípios importantes funcionando, aqui:


1. A natureza precisa de um “dentro” e um “fora”, um "isso" ou um "aquilo". Em outras palavras: a diferença faz as coisas acontecerem, seja em seu código de informação (muito parecido com o nosso 1 e 0 nos códigos de computação), ou na estrutura celular, ou na produção energética.



2. Fazer as coisas se movimentarem (mudança de velocidade) é a definição de trabalho. A vida biológica faz muito deste trabalho, estabelecendo essas diferenças; em densidade, ou, digamos, pressão, para então deixar que as forças físicas assumam o comando. Por exemplo, não há realmente nenhuma necessidade de mexer o creme em seu café a não ser pela impaciência. Uma vez que você colocou um no outro, a Segunda Lei da Termodinâmica ditará que o creme se dispersará no café de forma regular. De tal modo que a difusão das moléculas levará ao equilíbrio.



3. A vida, no entanto, não pode sustentar o equilíbrio, sob o risco das coisas entrarem em completa inércia. Os motores não girariam, muito menos os fluídos se movimentariam. As células morreriam. Por isso, os organismos estão constantemente trabalhando em hemi- equilíbrio, a fim de manter estes gradientes.



4. Quando dizemos que a natureza gosta de pegar carona, estamos, na verdade, falando acerca deste fenômeno especificamente: estar em condições de tirar proveito das leis constantes, seja por meio de seleção natural ou de esforço individual. Em outras palavras, reações termodinamicas são constantemente utilizadas por organismos transformadores de energia. Isto acontece em muitas escalas, incluindo o nível celular.


Este tipo de transporte-passivo pode aumentar de forma mais impressionante. Dê uma olhada em qualquer árvore de grande porte. Ela consegue drenar água muito acima dos 15 metros que a pressão atmosférica permite à simples sucção atingir. Por vezes este número pode chegar a mais de 200 metros, tudo sem nenhum gasto a mais de energia. Em vez disso, ela usa uma estrutura desenvolvida há milhões de anos, tirando proveito do gradiente de concentração.

As propriedades moleculares da água são o ponto central deste mecanismo de transporte. A água é uma molécula também conhecida como polar, tendo em uma ponta um átomo de oxigênio com carga negativa e em outra ponta um átomo de hidrogênio com carga positiva. Esta polaridade vale para todas as características que associamos à água, até mesmo sua fluidez. As perguntas: "Por que a água dissolve o sal?; Por que a água cai em forma de gotas?; Por que a água fica na borda do seu copo?" Tudo isso pode ser respondido com uma palavra: polaridade.

As ligações iônicas relativamente fracas que ligam os átomos de hidrogênio de carga oposta em uma molécula de água, aos átomos de oxigênio de outra, explicam o fato da água ligar-se a si mesma (coesão) e a outros materiais (aderência). Embora as ligações individuais sejam fracas, existe um monte delas, e juntas elas formam uma força poderosa chamada atração eletrostática. É esta propriedade de coesão que permite à água permanecer em uma coluna de mais de 200 metros sem sucumbir à gravidade. A tensão na coluna de água, em si, é suficiente para resistir à tração para baixo de seu próprio peso. A adesão permite à água subir pelos tubos estreitos do xilema, a fim de repor a quantidade utilizada nas folhas acima.

A transpiração, ou a perda de vapor de água através das aberturas dos poros ou estômatos das folhas da árvore, cria o gradiente que inicia esta ação capilar. A água é puxada do xilema para dentro das células do mesofilo e seus interstícios e, em seguida, através dos estômatos pelos efeitos da evaporação do sol. O efeito de puxar se estende por toda a coluna d'água, na árvore até às raízes.

Michael Maharbiz, do Electrical Engineering and Computer Sciences (EECS – departamento de Engenharia Elétrica e Ciências da Computação) da UC Berkeley, Ruba Borno, na Universidade de Michigan e Steinmeyer Joe no MIT, estão trabalhando em uma forma de mimetizar este gradiente de transpiração, com o intuito de produzir pequenas quantidades de eletricidade. Eles construíram folhas artificiais, a partir de pedaços de vidro, que contêm redes de canais padronizados após as nervuras. Eles foram capazes de criar uma bomba passiva de água, semelhante ao de uma árvore utilizando o sistema de evaporação nas bordas de suas "folhas" artificiais.

O sistema de bomba passiva é, então, utilizado para colher a eletricidade da água corrente. Como eles fazem isso? Novamente, ele volta ao princípio fundamental da diferença. Ao incorporar bolhas de ar no fluxo de água, são capazes de apresentar um material com propriedades elétricas diferentes de água e isso é suficiente para criar uma pequena carga. Para capturar esta carga, eles pressionam a coluna de água entre duas placas de metal e essas duas placas estão conectadas a um circuito externo.

Quando você agrupa um material isolante ou, mais precisamente, um dielétrico (água), com dois materiais condutores (duas placas de metal) você obtém um capacitor. Lembre-se, a água em si é uma péssima condutora de eletricidade, são as impurezas dentro da água que causam a condução elétrica e fazem com que o eletricista a evite. A capacitância alternada do dispositivo da bolha de ar fornece energia ao circuito multiplicador de tensão que utiliza cada transição para aumentar a energia em um capacitador de armazenagem.

Ainda assim, a quantidade de energia produzida desta forma é muito pequena, em torno de 2 a 5 microvolts cada vez que uma bolha passa, com uma densidade energética de 2 microwatts/cm3, mas a maior parte dos trabalhos mais impressionantes da natureza é feito desta forma, agregando pequeníssimos esforços dentro de um sistema otimizado.

O dimensionamento de tal dispositivo para o tamanho da árvore seria dificultado pelo uso de bolhas de ar. Em nosso exemplo da árvore, é a cadeia ininterrupta de coesão da molécula de água que permite que a coluna de 200 metros permaneça intacta. Quando o ar é introduzido, ele quebra esta cadeia, deixando a água sujeita à força da gravidade, agora dominante: a água corre abaixo. Maharbiz acredita que a substituição das bolhas de ar por partículas sólidas que giram resolverá esse problema e que então o dispositivo estará imediatamente pronto à maior escala.

Este aparelho tem sido descrito como um dispositivo de limpeza energética, para ser usado como uma tecnologia complementar agregada a produtores de energia mais robustos, como os painéis solares. Parece-me que o seu potencial é grande, por mais que, por ter pegado carona em um princípio fundamental, seja uma das muitas técnicas biomiméticas que nos permitirão caronas gratuitas.

Tom McKeag ensina Design inspirado pela natureza na Universidade de Artes da Califórnia e na Universidade da Califórnia, Berkeley. Ele é o fundador e presidente da “BioDreamMachine”, uma instituição educacional sem fins lucrativos que reúne Design inspirado pela natureza e ensino científico nas escolas K12.


Fonte: agenda sustentável


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