Da Liga das Nações à COP de Copenhague

Data: 23/10/2009

Da Liga das Nações à COP de Copenhague


No início dos anos 30 a Alemanha e o Japão iniciaram uma corrida armamentista que acabou envolvendo todas as principais potências do mundo. Nas reuniões da Liga das Nações, o organismo diplomático que antecedeu à Organização das Nações Unidas, debateu durante anos mecanismos para evitar uma nova guerra mundial, sem sucesso. O mundo caminhava a passos decididos em direção a um confronto. Os principais jornais da época alertaram sobre a possibilidade cada vez mais presente de um confronto armado de grande magnitude, fruto principalmente de erros cometidos ao final da primeira guerra. Ou seja, a II Guerra Mundial não foi uma surpresa para ninguém, pelo contrário, foi prevista e anunciada de diversas formas. De 1939, quando a guerra começou, a 1945, quando o Japão se rendeu, mais de 50 milhões de pessoas morreram e cerca de 30 milhões ficaram mutiladas. Estes números eram previsíveis, porque na primeira Guerra Mundial foram mais de 19 milhões de mortos e outros tantos milhões de feridos e mutilados, e as tecnologias para a guerra haviam se aperfeiçoado muito.

Hoje, em relação ao aquecimento global, fala-se em 360 milhões de mortos nas regiões mais pobres do mundo caso a temperatura global fique em média 2 C° mais quente. Haverá problemas relacionados a quebra de safras agrícolas, enchentes e eventos climáticos extremos, que, aliás, já começaram. Não há dúvida sobre o caos planetário que virá com o progressivo esquentamento do planeta. Como não há dúvida de que este aquecimento está sendo causado pelo lançamento desvairado na atmosfera da Terra de gases que causam o efeito estufa, seja pelo desmatamento, como é o caso especialmente do Brasil, seja pela queima de combustíveis fósseis para transporte e geração de energia nos países “desenvolvidos”.

A tragédia que se avizinha desponta como uma inexorabilidade. Como um bando de lêmures correndo em direção ao penhasco, a humanidade está buscando a tragédia através da incapacidade de mudar sua forma de vida. A COP 15, em Copenhague, não pode repetir o fracasso da Liga das Nações antes da II Guerra. É preciso que um pacto global seja buscado para uma redução drástica das emissões da gases estufa. Existem modelos que apontam para possibilidades reais de redução a curto prazo, como a preservação florestal e a transformação nos padrões de eficiência no uso de energia. Pensadores, economistas, filósofos e políticos ao redor do mundo estão fazendo proposições bastante razoáveis sobre as mudanças de paradigmas necessárias para uma eficaz transformação da economia. Ao ponto de mostrar que os desafios a serem empreendidos para a geração de um novo modelo de desenvolvimento podem lançar a humanidade em uma nova era de prosperidade.

No entanto, os fluxos de dinheiro vão, qual um rio barrado, correr por outros caminhos. E o status quo da economia e da política não consegue deixar de contabilizar suas perdas individuais ou setoriais. Talvez este seja o mais forte obstáculo às mudanças.

Enquanto isso, nas fileiras da sustentabilidade se busca a prova de que a nova economia, baseada em valores que pressupõem a solidariedade intergeracional, se busca mostrar pela lógica e pelo sentimento que não é mais possível dilapidar o patrimônio natural que deveria ser preservado para garantir o sustento dos seres humanos do amanhã.

A grande questão parece ser em relação ao gatilho que motivaria a humanidade a empreender os esforços necessários para salvar-se enquanto espécie. Qual seria? Já foi dito que as mudanças fatalmente vão ocorrer, seja pela razão ou pela dor. A Europa da década de 1930 caminhou em direção à guerra e atirou-se em uma insanidade genocida. Anos depois se reconstruiu em moldes diferentes, buscando se integrar e abandonando seus rancores tribais, a ponto de hoje ser um dos mais democráticos e bem sucedidos espaços jamais construídos pela humanidade.

Muitas grandes empresas já perceberam os riscos que as mudanças climáticas oferecem aos seus negócios e a grande possibilidade de falências e caos econômico. Estão, por isso, desenvolvendo políticas próprias de mitigação, independentes do que pode ser acertado em uma conferência como a de Copenhague. Um dos mais pragmáticos pensadores das questões climáticas, Lester Brown, que teve seu livro “Plano B – 4.0” lançado no Brasil, diz que um dos sinais mais preocupantes de ruptura é a falência e desintegração de Estados. E isto já está acontecendo na África e em alguns lugares da Ásia. Por enquanto são países da periferia, mas a tendência é chegar a centros mais importantes. O próprio Brasil enfrenta esta situação ao liderar tropas de paz no Haiti, um país sem capacidade de gestão sobre sua população e território.

Talvez seja o caso de deixarmos os cientistas um pouco de lado e chamarmos os historiadores. Eles estão mais acostumados a tratar de holocaustos através dos tempos. (Envolverde)

* Dal Marcondes é Diretor da Envolverde.

Nota do editor

A edição brasileira do livro "Plano B - 4.0", de Lester Brown, foi lançada ontem (22/10), em São Paulo. A obra foi editada no Brasil pelas editoras New Content e Ideia Socioambiental. Haverá um tiragem impressa distribuída para bibliotecas, escolas, universidades, ONGs e centros de estudo, mas os conteúdos também serão disponibilizados para download gratuito no site http://www.bradesco.com.br/rsa



(Agência Envolverde)


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