Mudança Climática diante dos olhos

Data: 22/10/2009

Mudança Climática diante dos olhos


Desde a rua costeira Pantai Kelapa, na capital de Timor Leste, se vê a praia rochosa, as crianças brincando na água e os barcos pesqueiros amarrados. Nessa paisagem, os moradores do lugar percebem a influência da mudança climática, despercebida para um recém-chegado. “A costa mudou. Vivo em Dilli e sei muito bem onde ficava a margem antes. Seu avanço é um dos efeitos físicos atribuíveis à mudança climática”, afirmou o ativista Demetrio de Carvalho, da organização ambientalista Haburas.

Os dados são limitados, porque as estatísticas do período de ocupação indonésia (1975-1999) são escassas. Mas a observação empírica leva alguns timorenses a prever um futuro aumento da erosão costeira. Porém, há outros indicadores sobre o fenômeno. “Algumas colheitas fracassaram devido às mudanças nos padrões climáticos. Há mais inundações repentinas. Algumas cascatas secaram e há escassez de água”, disse Joana de Mesquita Lima, oficial de projetos da Unidade Ambiental e de Redução da Pobreza do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).

Espera-se que um estudo feito pelo governo lance nova luz sobre o assunto no próximo ano. “Veremos como a mudança climática afeta as comunidades”, disse Joana. “Em seguida, desenvolveremos um plano de ação com vistas à adaptação para que Timor Leste priorize este assunto e solicite financiamento internacional. Nesta fase tudo consiste em coletar dados”, acrescentou. O governo também se prepara para a Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, que acontecerá em dezembro em Copenhague.

O principal problema previsto em Timor Leste como consequência do aquecimento global é a incidência do fenômeno sobre a segurança alimentar. Quarenta por cento da população vivem na pobreza e três quartos em áreas rurais, a maioria dependente da agricultura de subsistência. As estações do ano hoje são imprevisíveis, o que é uma notícia muito ruim para os camponeses, disse o chefe do Diretório Nacional para Assuntos Ambientais Internacionais, Mario Ximenes. A temperatura aumenta e, ao que parece, haverá menos chuvas na estação unida e mais na seca, o que distorcerá os ciclos de semeadura e colheita, explicou.

“A temperatura em Timor Leste aumentará entre 0,88 e 3,68 graus centígrados até 2070”, disse Ximenes, apoiado em um estudo da Universidade de Melbourne, na Austrália. As temperaturas médias neste país insular oscilam entre 15 graus nas áreas montanhosas e 28 graus próximo ao nível do mar. Um aumento importante acabará com os atuais padrões de chuva. “Os agricultores afirmam que já estão sofrendo danos em razão da mudança climática, primeiramente pelas chuvas”, acrescentou.

A seca registrada em 2001e 2002 e a tardia estação seca de 2002 e 2003 causaram uma queda de 34% na produção de milho, principal cultivo alimentar timorense. Estes problemas são conhecidos pelo governo. O chanceler Zacarias Albano da Costa disse no mês passado que Timor Leste foi “afetado variáveis padrões climáticos. Estamos, naturalmente, preocupados com a preservação de nosso meio ambiente e damos muita importância ao reflorestamento”, acrescentou.

O presidente do país, José Ramos-Horta, disse em setembro, na reunião de alto nível das Nações Unidas sobre mudança climática, que Timor Leste enfrenta uma “grave ameaça. O tempo se torna cada vez mais estranho e imprevisível. Parece haver mais chuvas fortíssimas e de curta duração, deslizamentos de terra e grandes inundações”, acrescentou. “A experiência de nossos agricultores sugere que as práticas tradicionais e ciclos de cultivo deixaram de ser adequados com a mudança climática”, alertou Ramos-Horta.
As emissões de dióxido de carbono de Timor Leste são, em média, 0,2 toneladas por habitante, muito abaixo da média mundial, de 4,22 toneladas, porém, ainda assim o país faz sua parte em resposta à mudança climática. Ao mesmo tempo, a localização de Timor Leste torna o país muito suscetível aos efeitos da corrente El Nino, que neste caso provoca secas muito intensas. Em 2007, este evento reduziu em 30% as colheitas de cereais.

“Nos últimos 10 anos já experimentamos dois ciclos de El Nino. Chove muito na estação seca. As trombas d’água às vezes são muito curtas mas também muito pesadas, o que causa danos em casas, pontes e outras obras de infraestrutura”, explicou o ativista Demetrio. Ao mesmo tempo, boa parte da pobreza se vincula com o desmatamento. A agricultura de roças e queimada é uma prática comum, e o corte de árvores com fins de calefação e combustível é maciço. Entre 1990 e 2005, desapareceram 17,4% das florestas do país, o que agrava sua vulnerabilidade à mudança climática. IPS/Envolverde



(Envolverde/IPS)


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