Medir a desertificação para poder combatê-la

Data: 05/10/2009

Medir a desertificação para poder combatê-la


Para avançar na defesa dos solos, os países que integram a Convenção das Nações Unidas de Luta contra a Desertificação adotaram na capital argentina ferramentas semelhantes às utilizadas no caso da mudança climática. A Nona Conferência das Partes desta convenção (COP 9) aconteceu em Buenos Aires entre 21 de setembro e sábado passado, um dia depois do previsto. Representantes de 193 países acordaram indicadores para medir a deterioração do solo e a criação de um painel de cientistas.

Como a Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, a referente à desertificação contará com seu próprio mecanismo intergovernamental de especialistas para estudar o fenômeno, informou a presidência da conferência em Buenos Aires. O IPCC (Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática) foi criado em 1989 e premiado em 2007 com o Nobel da Paz, juntamente com o ex-vice-presidente dos Estados Unidos Al Gore.

Os delegados da conferência sobre desertificação decidiram criar um órgão que opere como autoridade mundial interdisciplinar na matéria, que integra cientistas das áreas acadêmicas e governamental, semelhante ao IPCC. As partes também aprovaram uma série de indicadores para acompanhar e avaliar periodicamente a degradação do solo em terras que foram desertificadas, mas, não todos os propostos pelos especialistas. Atualmente não existe um sistema de medição comum deste fenômeno ambiental que causa pobreza, fome e migração nos países mais afetados e que contribui com o aumento da temperatura na atmosfera.

A degradação do solo em zonas áridas, semiáridas e sub-úmidas secas tem impacto principalmente na África, Ásia e América Latina, mas também em países industrializados como Estados Unidos ou Espanha. O uso não sustentável dessas áreas frágeis causa perda de produtividade dos solos, cuja recuperação é muito difícil. A COP 9 abrigou pela primeira vez uma conferência científica, da qual participaram 200 acadêmicos e 50 especialistas de governos de todo o mundo.

Nessa oportunidade também foi realizada uma reunião de parlamentares e o tradicional encontro de ministros, da qual, também pela primeira vez, participaram organizações da sociedade civil. O objetivo da reunião de cientistas era aprovar os indicadores cuja medição facilite o combate à desertificação, a canalização de recursos financeiros e a sensibilização da sociedade diante deste fenômeno que não consegue a repercussão pública que tem a mudança climática.

Até agora, a convenção sobre desertificação carecia de ferramentas de medição da deterioração do solo. Por outro lado, no contexto da convenção sobre mudança climática mede-se regularmente as emissões de gases causadores do efeito estufa na atmosfera. Apesar disso, organizações não-governamentais consideraram pobre o resultado desta primeira reunião de especialistas.

“Foram propostos 11 indicadores; aprovados apenas dois e outros dois ficaram nas recomendações. Isso dilata muito o processo e o torna muito burocrático”, disse à IPS Arantxa García, da Ipade, instituição espanhola dedicada à cooperação com o desenvolvimento que trabalha com populações rurais empobrecidas de países da América Latina, Ásia e África. “Temos muita experiência no terreno, mas o espaço que nos dão para influir nestas negociações é muito reduzido”, lamentou García.

Para a sociedade civil foram programadas duas intervenções de cinco minutos no segmento de alto nível da conferência, que reuniu ministros e outros representantes governamentais. Mas essa participação transcorreu no final das deliberações, quando já não havia possibilidade de incidir na negociação. Os delegados nacionais concordaram quanto à necessidade de a próxima conferência das partes da convenção sobre mudança climática, que acontecerá em dezembro, em Copenhague, integre à sua agenda “o potencial uso do solo”, disse aos jornalistas o secretário-executivo da convenção sobre desertificação, Luc Gnacadja, de Benin.

Gnacadja destacou que boa parte das emissões de gás de efeito estufa procede de solos degradados, e que a terra submetida a uma gestão sustentável tem grande capacidade de “capturar” carbono, o qual, de outro modo, iria para a atmosfera. “O potencial da terra para seqüestrar carbono é muito importante e deve ser levado em conta em um novo regime de mudança climática”, afirmou à IPS. “Esta é a avenida por onde devemos transitar para salvar o planeta”, ressaltou.

A reunião dos legisladores de 70 países acordou que “não há segurança no mundo sem segurança alimentar” e que esta última está ameaçada pela desertificação, disse Gnacadja. “A face humana da mudança climática se vê nas zonas secas”, afirmaram os parlamentares. No encontro de ministros foi confrontado “o custo da ação versus o custo da falta de ação” no combate contra a degradação da terra. Por fim, os representantes governamentais debateram sobre a necessidade de contar com maiores recursos para combater a desertificação, começando pelo orçamento para enfrentar o programa dos próximos dois anos, disse Gnacadja. Para os países industrializados, a conjuntura é complexa devido à crise financeira global, argumentaram.

Enquanto isso, os governos do mundo em desenvolvimento consideram que os recursos atuais são insuficientes, mais além de experiências-piloto realizadas em determinados países com apoio financeiro de distintas convenções com as relativas à desertificação, à mudança climática e à biodiversidade. Da COP 9 participaram cerca de dois mil delegados dos países-parte da convenção, que marcaram a próxima reunião na Coréia do Sul. IPS/Envolverde



(Envolverde/IPS)




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