Itamaraty admite incluir créditos de carbono no REDD

Data: 03/09/2009

Itamaraty admite incluir créditos de carbono no REDD


O mais influente braço do governo brasileiro em suas negociações comerciais e ambientais na arena internacional, o Ministério das Relações Exteriores (MRE), mudou sua postura em relação ao futuro regime climático pós-2012. Em resposta a pressões de negociadores de países desenvolvidos, ambientalistas, segmentos do empresariado e do próprio Ministério do Meio Ambiente, o Itamaraty passou a propagar nos últimos dias que o Brasil levará à COP-15, que será realizada em dezembro em Copenhague, uma meta ambiciosa de redução nas suas emissões de gases de efeito estufa.

A meta que o governo brasileiro estuda será mensurável, reportável e verificável. Poderá, portanto, ser comprovada por auditorias internacionais independentes. Como a meta será registrada na ONU, o país poderá estar sujeito a sanções previstas no futuro regime climático se não cumpri-la.

Além disso, em movimento inverso à tônica anti-mercado que postulou em Bali, no final de 2007, os negociadores brasileiros agora se mostram abertos a incluir instrumentos de mercado e até mesmo créditos de carbono compensatórios no mecanismo de Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação (Redd), que fará parte do novo regime internacional do clima. Os créditos poderiam ser comprados por empresas e governos de países do Anexo 1 da Convenção do Clima para cumprir parte de suas metas compulsórias de redução nas emissões de carbono, como ocorre hoje no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto.

Em entrevista ao OC, o embaixador extraordinário para mudança do clima, Sérgio Serra, diz que o governo será flexível quanto às fontes de financiamento do Redd, mas não aceitará que “os países desenvolvidos comprem créditos florestais que os isentem de cumprir suas metas”.

O sr. Pode nos dar uma pista de qual será a proposta do Brasil para a diminuição de suas emissões de gases de efeito estufa?

O Brasil levará uma contribuição robusta e ambiciosa para Copenhague, tomando como princípio a desaceleração na curva de crescimento das emissões até 2020. Esperamos que os Estados Unidos e demais países desenvolvidos também apresentem metas mais ambiciosas. A Nama (Ação Nacional Apropriada de Mitigação, na sigla em inglês) do Brasil deverá ser fortemente baseada na diminuição de emissões provenientes do desmatamento.

O Brasil condicionará sua proposta à aprovação na Convenção do Clima de um mecanismo financeiro de ajuda aos países em desenvolvimento?

Não condicionaremos. Mas logicamente nossas ações não poderão ser tão ambiciosas se não houver a contrapartida financeira prevista no Plano de Ação de Bali. De qualquer maneira, o Brasil tem condição de fazer muita coisa com recursos domésticos. Se houver apoio externo significativo, o país poderá maximizar e tornar ainda mais eficiente o combate ao desmatamento e à conservação florestal.

Na conferência de Bali, o governo brasileiro rechaçou o uso de instrumentos de mercado no Redd, como os créditos de carbono compensatórios (que compensariam emissões nos países ricos com reduções nas emissões florestais). Em Copenhague, qual será a posição do Brasil nesse assunto?

O Itamaraty é flexível quanto ao tipo de fonte financeira para os projetos de redução nas emissões do desmatamento, que podem incluir até instrumentos de mercado. E não fechamos a porta ao uso de mecanismos compensatórios. Mas, nesse caso, precisamos ter cautela com a integridade ambiental do regime internacional do clima. Em florestas, o uso de mecanismos compensatórios tem de ser limitado. Não aceitaremos que os países desenvolvidos comprem créditos florestais que os isentem de cumprir suas metas.

Trata-se, então, de uma mudança radical na posição brasileira?

Estamos evoluindo. Antes de Bali, não aceitávamos nem mesmo a inclusão da degradação florestal no mecanismo de Redd.

O professor Eduardo Viola, da Universidade de Brasília, prevê que o Brasil se afastará do G77 em Copenhague, realinhando-se nas negociações com China, México, Estados Unidos e União Europeia. Para ele, não faz sentido o país negociar a partir de um bloco que reúne ditaduras e países refratários à descarbonização como os do Oriente Médio. Qual sua opinião sobre a previsão do professor Viola?

Se o Brasil se afastar do G77 vai perder poder de barganha, porque assim como em outros fóruns (Organização Mundial do Comércio, por exemplo), as discussões da Convenção do Clima são mais centradas em grupos negociadores do que em países individuais. O que o Brasil vai tentar é puxar os países do G77 para uma posição mais construtiva, com ações mais ambiciosas no tema das reduções das emissões de carbono.

Como o sr. Avalia o papel do Fórum das Maiores Economias (MEF na sigla em inglês) na costura do acordo em torno do novo regime climático?

Alguns formadores de opinião no tema climático têm destacado o G-20 e o MEF como espaços mais adequados para um acordo, por reunirem países que respondem por cerca de 80% das emissões globais de gases de efeito estufa.

Como elemento facilitador, creio que o MEF será útil e poderá ajudar a dar um maior impulso às negociações que desembocarão na COP-15. Porém, não acontecerá um acordão à margem da Convenção do Clima. Trata-se de um fórum de diálogo e não de negociação. Seus próprios membros, incluindo o Brasil, têm sempre ressaltado esse aspecto, reafirmando que o canal apropriado para negociar o futuro do regime internacional do clima é o das Nações Unidas. A negociação de qualquer grande acordo num fórum não inclusivo como o MEF seria ilegítima, visto que estaria afastando das deliberações atores que têm muitos interesses em jogo nas negociações, se não sua própria sobrevivência como países, como os pequenos Estados-ilhas, a maior parte da África e da Ásia e nossos vizinhos sul-americanos.

O Brasil vem sendo acusado por ONGs e negociadores de países ricos como excessivamente defensivo nas negociações climáticas.

Quem está sendo defensivo em relação a futuros compromissos não são Brasil ou China, mas sim diversos países desenvolvidos, que, além de estarem longe de atingir suas metas no Protocolo de Kyoto, andam anunciando números modestíssimos, para não dizer pífios, como suas possíveis metas para o período pós-2012. Diga-se de passagem que todos eles também são membros do MEF.

(Amazonia.org.br/Observatório do Clima)



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