Economia precisa respeitar a capacidade de suporte dos ecossistemas

Data: 11/08/2009

Economia precisa respeitar a capacidade de suporte dos ecossistemas


Qual a capacidade dos ecossistemas de suportarem as necessidades da economia? Parece cada vez mais óbvio que essa é a pergunta que decidirá com que futuro a humanidade vai se deparar, mas poucos cientistas arriscam responder essa pergunta com números precisos. E não é por falta de conhecimento científico, estudos e indicadores. Segundo o economista ecológico Joshua Farley, o problema está no método: “a única maneira de definir precisamente os valores de um ecossistema é acabar com ele, só sabemos o valor ecossitêmico quando perdemos os serviços que esse ecossistema prestava. Mas então é tarde demais”.

Farley, pesquisador da Universidade de Vermont, dos Estados Unidos, participou da primeira mesa do Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica, na manhã da última quarta-feira, dia 5, em Cuiabá, junto com o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) Philip Fearnside. Em sua palestra, ele falou da dificuldade em se determinar qual o limite de resiliência dos ecossistemas para se pensar na economia em uma escala sustentável. Existem estudos consistentes sobre esses limites, mas por serem aproximativos, gerarem indicadores, essas informações são frequentemente questionadas por tomadores de decisões políticas e econômicas.

“Quando se chega ao limite é melhor pensar em políticas ecológicas em vez de políticas econômicas. É preciso fazer o ecossistema decidir quanto de desmatamento é permitido”. Segundo ele, a escala sustentável é dada pela manutenção da capacidade de um ecossistema de se renovar. Para isso, o tamanho do sistema econômico não pode ter exigências acima da capacidade do ecossistema em que está inserido. “Um sistema econômico não existe no ar, mas em um lugar, ou seja, dentro de um ecossistema”, lembra.

Um lugar frágil como a Amazônia, por exemplo, que é responsável por parte da umidade e das chuvas que caem sobre o sul da América do Sul. Além do impacto sobre a biodiversidade, o desmatamento na Amazônia também tem impactos econômicos importantes, e não só na região norte do país. Philip Fearnside, que há mais de 30 anos pesquisa os problemas ambientais da Amazônia, mostrou durante sua palestra o papel que a Amazônia representa na regulação do clima da América do Sul, e deu um bom exemplo do limite de resiliência de que fala Joshua Farley. Pesquisas de campo desenvolvidas pelo Inpa em Rondônia, Amazonas e outros estados mostram que para manter uma pastagem é preciso dez vezes mais água do que para manter a mesma área de floresta.

Estamos falando da região que tem sido conhecida cada vez mais pelos seus “rios voadores”, ou seja, pela imensa quantida de de água que faz circular na atmosfera, calculada em números conservadores como um terço do volume de águas que o rio Amazonas devolve ao oceano Atlântico. Assim como os rios tradicionais precisam de um canal para escoarem, os rios voadores precisam de maciços florestais para fazer circular a sua umidade. E a conta começa a ficar simples: se as áreas de pastagem drenam dez vezes mais água do que as áreas de floresta, significa que estão consumindo um volume grande da água que contribui com as chuvas e a umidade da região mais populosa e industrializada do Brasil.

A água, aliás, é considerada um capital crítico, pois é essencial para a manutenção tanto dos ecossistemas como da economia, e não substituível. Segundo Joshua Farley, os capitais críticos têm um peso alto na economia, pois uma mudança pequena na quantidade disponível leva a uma mudança radical nos preços no mercado. Qual esse limiar? É impossível dizer “a partir dessa árvore derrubada ult rapassamos o limite”, mas sabe-se já claramente que chega um dado momento em que cada hectare a menos de floresta coloca todo o ecossistema em risco, o que deveria ser argumento suficiente para que a política de desenvolvimento de todos os países fosse pensada de forma a respeitar a capacidade de suporte da natureza. Estudos elaborados no Inpa pelas equipes de Philip Fearnside e Carlos Nobre indicam que o limite irreversibilidade de danos à floresta amazônica seria de 30% de degradação. Extrapolando-se esse percentual, é provável que a floresta perca a capacidade de se renovar. E não estamos longe dessa linha.

O economista ecológico Joshua Farley tem algumas pistas para entender porque essa mudança de modus operandi ainda não aconteceu. No nível do local, por exemplo, um agricultor que desmata recebe todos os benefícios desse desmate no presente ou no futuro imediato, e os custos ambientais são divididos com o país e o mundo no futuro. Assim, é difíc il perceber na escala local o valor dos serviços ambientais. Soma-se a isso o fato de que o desmatamento no Brasil é subsidiado direta e indiretamente. Para Farley, o Brasil precisa acabar com os subsídios para o desmatamento e cumprir o Código Florestal, como medidas para conseguir medir com mais eficácia os custos ambientais do seu sistema econômico. E acrescenta “não cobrar os danos ambientais também é uma forma de subsídio”.

Junto disso, na escala global, o pesquisador diz que um sistema de pagamento por serviços ambientais é necessário e urgente, e beneficia a Amazônia, na medida em que ela presta serviços ambientais globais. Pelos seus cálculos, 1% do PIB dos países ricos seria suficiente para evitar a catástrofe global prevista com as mudanças climáticas. Implementar essa medida certamente teria impactos no padrão de vida desses países, e Farley incluiu esse dado na conta: equivaleria a um retrocesso ao padrão de vida de seis meses atrás. “Eu não considero meu padrão de vida de seis meses atrás ruim”, finaliza.

O VIII Encontro da Sociedade Brasileira de Economia Ecológica terminou na última sexta-feira (7/8), em Cuiabá. As mesas de debate são abertas para ao público. Mais informações podem ser obtidas no site http://www.ecoeco.org.br/.

(Envolverde/Ecoagência)



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