Mudança climática: Crise beneficia combustíveis fósseis

Data: 02/06/2009

Mudança climática: Crise beneficia combustíveis fósseis


Cada vez mais governantes reclamam ações urgentes contra a mudança climática apesar da recessão econômica, mas muitos aproveitam os pacotes de resgate financeiro para aumentar os subsídios à indústria dos combustíveis fosseis. A Europa se comprometeu seriamente a reduzir as emissões de dióxido de carbono, um dos gases causadores do efeito estufa, considerados pela maioria da comunidade científica responsáveis pelo aquecimento global. Mas, nos últimos cinco anos a Europa destinou US$ 8 milhões de fundos públicos a empresas petroleiras, especialmente as que trabalham com gás natural.

O Parlamentou Europeu aprovou no mês passado um adicional de US$ 3,35 bilhões para seu plano de recuperação econômica, originalmente de US$ 225 bilhões, segundo a última investigação da Amigos da Terra Europa intitulado Fundos públicos para os combustíveis fósseis na União Européia. “Supõe-se que os europeus lideram a luta mundial por uma nova economia verde, mas destinamos milhares de milhões de euros ao setor de combustíveis fósseis, o que nos leva em sentido contrário”, disse à IPS desde Bruxelas Darek Urbaniak, da Amigos da Terra Europa. “É totalmente hipócrita”, ressaltou.

Talvez por isso os participantes da Cúpula Empresarial Mundial sobre Mudança Climática, realizada em Copenhague na semana passada, tenham exortado os governos a “se esforçaram para acabar com o atual sistema perverso de subsídios para as grandes empresas emissoras, como as do setor energético e de transporte”, acrescentou Urbaniak. A cúpula foi organizada pelo Conselho Climático de Copenhague em colaboração com a Organização das Nações Unidas e outros organismos internacionais. “Continuar destinando bilhões de dólares à indústria de hidrocarbonos é como investir em empréstimos de alto risco”, disse o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, na cerimônia de abertura.

O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) recomendou empregar um terço dos US$ 2,5 bilhões dos pacotes de estímulo globais para incentivar a economia verde, que ajudará a “tirar o mundo da recessão”. Mas, o Parlamento Europeu decidiu que os US$ 5,36 bilhões destinados a novos projetos energéticos fosse divididos, por isso a fonte do problema, como a indústria fóssil, recebeu US$ 3,5 bilhões, enquanto as alternativas, como a eólica, solar, biomassa, apenas US$ 2 bilhões, segundo a Amigos da Terra Europa.

“A energia eólica recebeu apenas US$ 670 milhões, enquanto foram destinados US$ 1,67 bilhão à pesquisa sobre captura e armazenamento de carbono”, disse Urbaniak. O Canadá destinou mais dinheiro para a indústria de hidrocarbonos do que aos seus programas para conter a mudança climática nos últimos três anos, disse Albert Koehal, da organização não-governamental local Ecojustice. Desde que este país assinou o Protocolo de Kyoto em 1997 gastou mais de dois dólares em subsídio à indústria petroleira para cada dólar destinado a respeitar o acordo.

O Protocolo de Kyoto da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança Climática, acordado nessa cidade japonesa e que entrou em vigor em 2005, obriga os 37 países industrializados que o ratificaram a reduzir suas emissões de gás estufa em pelo menos 5,2% até 2012, com relação aos níveis de 1990. “É uma vantagem imprevista para a indústria de gás e petróleo. Os contribuintes pagam pela contaminação industrial”, disse Koehl à IPS desde Toronto. “Tentamos criar uma nova economia verde, mas a maior parte de nosso dinheiro acaba na indústria dos dinossauros”, afirmou. Além disso, a província canadense de Alberta prometeu destinar US$ 1,75 milhões a mais para pesquisa sobre captura e armazenamento de carbono, segundo John Dillion, da organização canadense Karios. É evidente que não interessa ao Canadá, pois gasta 13,7 vezes mais por habitante em energia renováveis do que os Estados Unidos, acrescentou Dillion.

Sem chegar à recomendação do Pnuma, o governo dos Estados Unidos de Barack Obama destinou US$ 70 bilhões de seu pacote de estímulo econômico, que chega a US$ 787 bilhões, para apoiar esforços ambientalistas. Dessa quantia, US$ 32 bilhões foram destinados à produção de energia limpa, incluindo pelo menos US$ 4,4 bilhões para investigar e desenvolver a captura e o armazenamento de carbono, segundo a organização não-governamental Taxpayers for common sense (Contribuintes pelo senso comum), com sede em Washington. Foi uma surpreendente mudança de política. Até George W. Bush, partidário dos combustíveis fósseis, se gastou US$ 3 bilhões em projetos como FutureGen, associação público-privada para construir a primeira unidade de energia do mundo livre de emissões de gás estufa.

Ainda não se investigou se há mais subsídios para a indústria dos combustíveis fósseis nos pacotes de resgate, orçamentos e novas leis, disse Janet Larson, diretora de pesquisa do Earth Policy Institute, organização não-governamental com sede em Washington. A Taxpayers tampouco analisou o projeto legislativo de estímulo de 1.500 páginas. Mas, disse que o pacote de resgate para o setor financeiro de US$ 700 bilhões, aprovado no outono passado, exonera a indústria do gás e do petróleo de pagar US$ 2,2 bilhões em impostos até 2013.

Naturalmente, tampouco houve uma redução significativa dos subsídios, apesar de estar prevista no orçamento do presidente Obama para 2010. “O projeto de lei do pacote de resgate tem uma enorme quantidade de dinheiro”, disse Larson à IPS. As energias alternativas receberão alguma coisa. Mas, há um fato claro: “Esse setor nunca vai equiparar à quantda recebida pela indústria dos combustíveis fósseis”, acrescentou.


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