Partículas emitidas por veículos interferem na formação de chuva
Fonte: Agencia USP
Vários dias de seca intercalados por verdadeiros pés-dágua: este tem sido um cenário comum para moradores da cidade de São Paulo, mesmo fora do verão. A substituição de chuvas leves e regulares por chuvas intensas e concentradas em alguns pontos tem sido acompanhada tanto pela população quanto por estudos sobre a formação de nuvens, que apontam as possíveis causas para o fenômeno. E os poluentes que saem pelos escapamentos dos nossos carros, conhecidos tecnicamente como emissões veiculares, estão entre os culpados.
Uma pesquisa sobre a condensação de gotículas de chuva abordagem relativamente recente revela como a composição e o tamanho das partículas atmosféricas influenciam a ativação do processo de formação de chuvas e, consequentemente, da manutenção do ciclo hídrico. O estudo é o primeiro a avaliar os efeitos do tráfego urbano e de outras fontes poluentes na formação de nuvens da região metropolitana de São Paulo e o segundo a avaliar a variação nela.
Dentre os resultados, foi diagnosticado que, na região metropolitana, a emissão de partículas por veículos é na verdade o principal obstáculo para a eficiência da formação de chuva. Isso porque essas partículas, encontradas em altas concentrações, apresentam tamanhos reduzidos e composição química desfavorável à formação de gotículas.
O estudo foi desenvolvido por pesquisadores do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP; do Instituto de Geociências (IGc) da USP; do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen); e da Universidade de Surrey, na Inglaterra, através da Rede de Parceria Global (University Global Partnership Network UGPN). As conclusões foram publicadas na revista Atmospheric Chemistry and Physics.
Formação de gotículas
Na emissão veicular, o grande problema é emitir partículas pequenas, em alta concentração na atmosfera e com uma composição química não favorável, diz doutorando Carlos Eduardo de Oliveira. Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Carlos Eduardo de Oliveira: o grande problema são partículas pequenas, em alta concentração na atmosfera e com uma composição química não favorável Foto: Marcos Santos/USP Imagens
A chuva depende de material em forma de partícula para acontecer. O problema é o tipo de substância particulada em maior número na atmosfera. Para que ocorra a ativação do processo de formação de gotículas de chuva, as partículas devem ser capazes de absorver o vapor de água presente no ambiente e pequenas o bastante para que consigam ser elevadas até a altitude onde ocorre a formação de nuvens. São partículas invisíveis ao olho nu.
Na emissão veicular, o grande problema são as partículas pequenas, em alta concentração na atmosfera e com uma composição química não favorável, principalmente provenientes do diesel e da gasolina, uma vez que o etanol tem uma composição um pouco diferenciada, explica o doutorando do IGc Carlos Eduardo de Oliveira, um dos autores do artigo, pontuando que o etanol dificulta um pouco menos essa formação.
Em experimento no IAG, as partículas presentes no ar foram captadas por simuladores e colocadas em uma câmara de supersaturação para observar quais serviriam como superfície ao vapor e formariam gotículas. Com isso, os pesquisadores avaliaram a razão e o diâmetro de ativação da condensação de gotículas.
A proporção entre as partículas que tiveram sucesso em se agregar à água nessa fase e as que não tiveram compõe a razão de ativação de um tipo de partícula. Já o tamanho da partícula que começa a absorver a água e formar uma gotícula é o que ditará o diâmetro de ativação.
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Além das partículas veiculares, foram detectadas na atmosfera plumas de queimada e aerossóis marinhos que, apesar de estarem presentes em menores quantidades, também participam da formação de nuvens da região em diferentes graus.
Transportadas pelo vento do interior do estado até a região metropolitana, as plumas de queimada não produzem muito efeito sobre a formação de nuvens, pois seu tamanho e composição são alterados durante o transporte. Já os aerossóis marinhos, partículas em suspensão características de óleos e sais marinhos, influenciam o processo de forma sutil e eficiente. Ao atingirem a altitude adequada, os aerossóis são também transportados pelo vento e conseguem subir a serra para, a partir do final da tarde, chegar à cidade.
As medições foram realizadas no instituto entre agosto e setembro de 2014 e, por meio delas, foram feitas estimativas da situação em outros pontos da região metropolitana, comparando com o banco de dados da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb).
Agenda da chuva
Como a estação de simulação do IAG está localizada próxima das marginais, a principal fonte de partículas encontrada foi a veicular. Por serem muito finas e geralmente possuírem composição química inadequada, essas partículas têm dificuldade em absorver água e crescerem até formarem gotículas. Além disso, elas são encontradas em maiores concentrações durante os períodos de maior trânsito, o que atrapalha a continuidade do processo de formação dessas gotas.
Ao longo do dia, o processo de ativação da formação de gotículas de nuvem é bem sazonal. Quando começa o horário do rush, por volta das sete horas, ele vai diminuindo até o meio do dia por causa da predominância da emissão veicular, exemplifica Oliveira.
A falta de chuvas também é resultado da ausência de umidade na região. Sem vapor suficientemente disponível na atmosfera, as partículas não conseguem formar gotículas. Segundo Maria de Fátima Andrade, professora do IAG e orientadora da pesquisa, com menos umidade, a chuva leve foi reduzida e, por outro lado, há chuvas mais intensas em alguns pontos.
Para a professora, esse comportamento climático também é fruto de uma segunda questão. É uma combinação tanto do efeito da poluição quanto do efeito da urbanização, da substituição da superfície por concreto, afirma.
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Nuvem de poluição sobre Kuala Lumpur - Foto: Wikimedia Commons
Poluição das grandes cidades mundiais é problema de saúde pública. Na imagem, Kuala Lumpur, na Malásia Foto: Wikimedia Commons
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Além dos prejuízos climáticos, a poluição atmosférica também afeta a saúde da população global. De acordo com relatório publicado em maio de 2016 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a poluição atmosférica é a causa de três milhões de mortes prematuras por ano. Já a Agência Internacional de Energia (AIE) estima que as mortes prematuras chegam a 6,5 milhões e continuarão aumentar até 2040.
Atualmente, a poluição atmosférica é o principal problema ambiental relacionado à saúde pública no mundo, afirma Oliveira. Somente a pressão alta, os riscos decorrentes de hábitos alimentares e o fumo ultrapassam a poluição como maiores riscos à saúde humana.
O artigo completo pode ser conferido neste link: http://www.atmos-chem-phys.net/16/14635/2016
Mais informações: e-mail carlos.edu.oliveira@usp.br e mftandra@model.iag.usp.br
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